Fugas - Viagens

O trilho que abraça Gales

Por Sousa Ribeiro (texto e fotos)

De Flint, no Norte, a Chepstow, no Sul, são 1400 quilómetros que revelam a infinita beleza de Gales, o verde da paisagem em contraste com o azul do mar, serpenteando por lugares repletos de história e de paisagens magnificentes como St. Davids, Fishguard, Temby, Rhossili Beach e Cardiff Bay.

Imagine um percurso a pé, seguindo ao longo da estrada e não em linha recta, entre Valença, no Minho, e Sagres, no Algarve, e logo depois pense que tem de percorrer o trajecto de volta, uma vez mais sem recorrer a qualquer tipo de transporte.

São pouco mais de 1400 quilómetros, precisamente a distância que pode caminhar entre o Norte remoto e o Sul de Gales, quase sempre escutando o murmúrio do mar e por trilhos de uma infinita beleza, todos eles ligados entre si — um caso inédito no mundo.

A história teve o seu início, oficialmente, a 5 de Maio de 2012 mas há já oito anos que os planos foram revelados e postos em prática, tendo como base o sucesso económico de dois outros trilhos: Pembrokshire Coast Path National Trail (representa uma receita de 14 milhões de libras por ano para a economia local) e o Isle of Anglesey Coastal Path.

Desde então, o governo galês, em conjunto com o Countryside Council for Wales, 16 entidades regionais e dois parques naturais, empenhou-se seriamente em estender ao longo de toda a costa um trilho (algumas secções podem também ser utilizadas por ciclistas e pessoas com mobilidade reduzida) que passa por dois parques nacionais, onze reservas naturais e dúzias de lugares de Especial Interesse Científico.

Os custos foram suportados pelo governo e entidades locais (cerca de dois milhões de libras esterlinas por ano entre 2009 e 2012) e, durante quatro anos, por fundos comunitários (aproximadamente quatro milhões), um forte investimento que não descura acções de marketing e prevê atrair mais 100 mil visitantes por ano a este antigo país celta com uma das mais belas costas do mundo.

É no estuário (o maior de Gales) do rio Dee, em Flint, no condado de Flintshire, que o percurso começa para quem opta pelo Norte ou, para quem preferir o Sul do país, em Chepstow, pequena cidade na fronteira com Gloucestershire que se destaca pelo seu imponente castelo (há quem defenda tratar-se do mais antigo, em pedra, em todo o Reino Unido) debruçado sobre as águas do rio Wye.

Num país com mais de 600 castelos, não admira que Flint, no outro extremo, também tenha um, mandado construir, em 1277, por Eduardo I de Inglaterra, se bem que, no Inverno, a maior atracção passa pela observação de aves migratórias no estuário do Dee, mais de cem mil, entre elas raros gansos híbridos, com as suas patas rosadas.

Quando Flint começa a ficar para trás, o trilho abraça as dunas de Gronant, uma pequena aldeia ainda no condado de Flintshire que acolhe a única colónia de andorinhas do país e, logo depois, em Talacre, com a sua bonita praia de areia fina e o farol que se diz assombrado, uma outra colónia, ainda mais rara, de sapos-corredores, uma espécie extinta em 1960 mas reintroduzida em 2003.

Sempre com o mar como companhia, em cenários muitas vezes órfãos da presença humana, o caminho vai serpenteando e chega, uns quilómetros mais à frente, a Rhyl, uma vila costeira que atrai, todos os anos e durante os meses de Inverno, os raríssimos escrevedeiras-das-neves, provenientes do Árctico.

--%>