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Um mapa do Porto para turistas chorões

Por Mara Gonçalves

A ilustradora Joana Estrela seleccionou os dez melhores sítios para chorar em público na cidade do Porto e compilou-os num mapa original e cheio de humor. Para turistas (e locais) de lágrima fácil.

“Temos a ideia que os turistas são criaturas alegres, entusiastas e despreocupadas mas não é sempre assim. Às vezes, quando viajamos, principalmente quando viajamos sozinhos, há muita coisa a mexer por dentro." De vez em quando, a única coisa que um turista quer saber é onde pode chorar sem ninguém o incomodar. E agora há um mapa do Porto que lhe dá isso mesmo: os dez melhores sítios para ficar sozinho e deixar as lágrimas correrem.

Meio a sério, muito a brincar, Joana Estrela lançou um Map for Crying Travellers, desdobrável e impresso em risografia (7€), onde assinala no mapa diferentes locais eleitos para ficar num pranto. No verso, descreve cada um deles com uma boa dose de humor e ilustrações a azul e branco. “Escolhi sítios onde posso ir para me sentir sozinha”, conta à Fugas. Escondidos ou onde ninguém vai dar pelas lágrimas.

As casas de banho estão no topo da lista. “São os melhores locais públicos para chorar”, lê-se na descrição do Map for Crying Travellers. “São privadas, fornecem meios para assoar o nariz e lavar a cara e ainda dão uma boa desculpa para ficar longe por muito tempo.” A melhor de todas, garante Joana, é a da cave do bar Plano B, junto à Torre dos Clérigos. “Fica entre dois pisos com pistas de dança, o que torna impossível alguém ouvir.” E Joana sabe-o bem. Foi ali que teve a maior crise de choro dos seus 26 anos. “Uma mistura de desamor, de álcool e o roubo do meu casaco preferido”, recorda.

No entanto, é o “paraíso dos gatos”, sexto na lista, que elege como favorito. Por sinal, o único que foge ao Porto para ficar a mirá-lo da outra margem do Douro, em Vila Nova de Gaia. Fica junto à ponte D. Luís I e “tem uma vista lindíssima”, apesar de parecer um jardim abandonado. “Alguém construiu casinhas para os gatos vadios e no Inverno cobrem-nas de plástico para a chuva não entrar. É o meu sítio preferido. Tive de pensar muito bem se o punha ou não, porque uma parte de mim queria que ninguém descobrisse que aquilo existe e fosse só meu”, conta.

Tudo começou como uma paródia aos artigos sobre “os 10 melhores tudo-e-mais-alguma-coisa da cidade”. Mas Joana, natural de Penafiel, estava a viver numa casa no Porto com “muita gente e paredes finas”. Às vezes, tinha de sair de casa só para chorar. E foi aí que começou a sentir que a lista afinal até tinha alguma utilidade. E depois lembrou-se que talvez “um turista num dormitório de um hostel se sentisse igual” de vez em quando. Daí ao mapa, impresso apenas em inglês, foi um passo.

Entre os locais escolhidos pela jovem ilustradora estão ainda a Foz (“o que podia ser mais perfeito que olhar o mar e chorar?”, questiona Joana no mapa, sugerindo “ficar junto ao velho farol para dramatismo extra”), a Casa da Mariquinhas (um restaurante com “baixa luminosidade e música triste” - fado, como não poderia deixar de ser); o Museu de Serralves (as salas com instalações artísticas em vídeo são, normalmente, “escuras, confortáveis e onde poucas pessoas entram”); a Rua da Madeira (“repugnante” mas com uma bela vista para a estação de São Bento); o Traveller's Bar (tem sempre a tocar a “lista de músicas mais dramática e romântica do mundo”); o Teatro Nacional de São João (na ausência do escurinho de um cinema no centro histórico do Porto, Joana sugere uma qualquer sala de teatro, sendo o São João “grande o suficiente para sentir que ninguém repara e a decoração dourada vai dar alguma dignidade aos seus problemas”); o Prado do Repouso (“é um cemitério, o que há mais a dizer?”); e o Palácio de Cristal (fica lotado no Verão, mas estão todos “demasiado ocupados a tirar fotos aos pavões ou a proteger a comida das gaivotas para reparar”).

Joana estudou Design de Comunicação na Facultade de Belas Artes da Universidade do Porto. Em 2014, publicou a banda desenhada Propaganda, um diário gráfico sobre a experiência que viveu como voluntária da Liga Gay Lituana e em Junho deste ano lançou o livro de infância Mana, editado pela Planeta Tangeria, que lhe valeu o Prémio Internacional de Serpa para Álbum Ilustrado.

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