Fugas - restaurantes e bares

  • Nelson Garrido
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A lampreia, das pesqueiras do rio Minho ao tacho de Ana Luísa

Em anos bons, conta António, chega-se a apanhar cinco, seis, oito ou até dez lampreias de cada vez que se puxa as redes – quando há muitas, é preciso dividi-las por sacos e carregá-las às costas encosta acima, do rio até à beira da estrada onde os pescadores deixam os carros.

Esta pesqueira em que estamos, a número 127, pertence a vários pescadores que se organizam por dias para vir pôr as suas redes (mais tarde começa a época do sável e do salmão, que esteve quase desaparecido e agora começa, ainda timidamente, a regressar).

É assim por todo o rio acima, pelo menos desde esta zona, porque lá para baixo, perto da foz do Minho e de Caminha, não existe o sistema de pesqueiras e a pesca é feita de outras formas — diz-se aqui que mais violentas para o animal, que pode acabar ferido e a perder o sangue que tão importante é para depois o cozinhar.

As pessoas da zona de Melgaço gostam de explicar por que é que a lampreia é melhor por aqui. “Lá em baixo é mais gorda, torna-se enjoativa”, afirma Diogo. Como vêm a nadar rio acima, vão perdendo peso e tornam-se mais magras e com uma carne mais firme, mais musculada. “São capazes de ter dois quilos lá em baixo e chegar aqui com 1,5 quilos ou menos.”

Outra particularidade desta zona é que só aqui se faz a lampreia fumada. “Se falar disso lá para baixo nem sabem o que é”, diz António. Era uma forma de, antigamente, quando havia milhares de lampreias, se aproveitar as que não se conseguiam comer logo com um método de preservação muito tradicional na região para os enchidos de porco. E como se prepara o peixe para o fumeiro? António conhece bem o processo e lá acabamos por levar uma lampreia para outro local para ver como se faz.

Um sabor “medieval”

Tábua de madeira, o animal preso por uma corda pelo rabo, uma faca e, zzzttt, por ali abaixo. Aberta a barriga, é preciso cortar o nervo de cima a baixo, e depois cada metade do nervo ao meio também em altura. Só assim fica bem aberto para poder levar os pedaços de cana que o vão segurar para ser pendurado no fumeiro. Essencial também é tirar-lhe a tripa e o fígado, que dão mau gosto, e a “espicha”, um pequeno nervo ósseo junto à cabeça. Depois é esfregá-la com sal e com o próprio sangue e daí a pouco está pronta para o fumeiro.

Só nos falta mesmo sentar à mesa. É na Tasquinha da Portela que vamos experimentar lampreia de três formas diferentes, que são, aliás, as mais tradicionais: fumada e recheada, em arroz e à bordalesa. Somos recebidos por Ana Luísa, que já está nos fogões, e Filipe, o marido, que vai contando como este restaurante, situado num edifício do século XVIII ligado ao Mosteiro de Paderne, começou há onze anos, “por uma brincadeira”. Era um café, Ana Luísa fazia “uns petiscos” e ambos tinham outros empregos. Mas as coisas correram tão bem que decidiram dedicar-se a tempo inteiro à Tasquinha.

Ana Luísa já foi avançando com a preparação da lampreia, que tem que ser posta a marinar com antecedência. “Antes só se fazia arroz de lampreia”, explica Filipe, que diz que a versão fumada e recheada com ovo, pimento e presunto é uma invenção relativamente recente.

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