Na verdade, são poucos aqueles que tiverem a oportunidade e ventura de assumir responsabilidades de monta desde os primeiros instantes da vida profissional, são poucos aqueles que se podem gabar de ter iniciado a carreira ao comando de um dos maiores e mais bem-sucedidos projectos vitícolas portugueses de todo o sempre, a Herdade do Esporão. Terminar a universidade integrado na primeira fornada que saiu do curso de enologia da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro e assumir tamanha responsabilidade não está ao alcance de todos.
Mas Luís Duarte é assim mesmo, um enólogo que não fugiu nem foge aos desafios que a vida lhe tem proporcionado. Apesar de um início auspicioso e do sucesso de muitos dos projectos que capitaneia e capitaneou, sempre manteve os pés bem assentes no chão, sem ceder ao encantamento do protagonismo fácil, sem cair na tentação de dar passos maiores que a perna. Luís Duarte é, na verdade, um enólogo eminentemente desassombrado e pragmático, directo, prático e sincero como poucos em Portugal. Uma das suas divisas mais queridas, uma convicção que repete com insistência, é a necessidade de tornar o vinho numa actividade lucrativa e racional insistindo que o vinho tem de ser capaz de proporcionar alegria a quem o compra… e retorno financeiro a quem o faz. Mais houvesse como ele num universo que por vezes sente mais afinidade com a poesia que com a racionalidade.
Luís Duarte não sofre de um dos males mais maçadores e comuns no mundo do vinho, um ego inflamado que o obrigue a procurar fazer vinhos-troféu, vinhos com aspirações a serem os melhores de qualquer curso ou eleição, vinhos de aparato e soberba que pretendam ser os melhores do mundo. Garante a pés juntos que lhe dá muito mais prazer profissional e pessoal fazer vinhos sérios e seguros que não sejam de produção virtual. Prefere dedicar-se a elaborar vinhos sinceros e sensatos no preço, vinhos que não cedam a especulações, preferindo fazer vinhos de volume suficiente para que uma maioria possa desfrutar deles em lugar de uma produção exclusiva de um vinho extraordinário que faça acelerar o ritmo cardíaco de quem o prove... mas ao qual poucos consigam aceder.
Apesar de o seu nome estar indelevelmente associado ao Alentejo, Luís Duarte é natural do Douro, de Vila Real, cidade onde se formou. Dois dias após concluir o curso já tinha recebido um convite, uma proposta para começar a trabalhar na Herdade do Esporão, na génese do projecto que à época ainda assumia o nome Finagra. Desistiu de uma bolsa e estágio em França para concretizar a sua primeira vindima no Alentejo, ainda no ano 1987. A adaptação aos ares alentejanos não foi fácil nos primeiros momentos. A transição de Trás-os-Montes para o distante Alentejo não era, à época, tarefa fácil ou confortável, sobretudo para um recém-formado ainda sem experiência profissional que se pudesse considerar relevante. Apesar das dificuldades iniciais próprias de quem começa a dar os primeiros passos, assumiu o seu papel na Herdade do Esporão e ajudou a desenvolver um dos projectos mais aplaudidos e valorizados de Portugal. Manteve-se na Herdade do Esporão durante muitos anos num percurso profissional reconhecido e aplaudido.
Em 1994 Luís Duarte tomou o primeiro ensaio para a independência, assumindo o papel de enólogo consultor na igualmente alentejana Roquevale, sem no entanto comprometer com esse passo o seu vínculo com a Herdade do Esporão. O sucesso dessa primeira ligação, articulado ao tempo que se vivia, o despontar da região do Alentejo e o surgir de uma nova fornada de produtores, teve como consequência novas solicitações, que Luís Duarte foi aceitando. As consultorias e os desafios foram-se acumulando, dando início a uma colaboração proveitosa com produtores alentejanos tão famosos como a Quinta do Mouro, Herdade Grande, Júlio Bastos, Herdade da Malhadinha, Herdade de São Miguel e um rol de outros pequenos e grandes produtores alentejanos.
Como qualquer enólogo que se preze, Luís Duarte teve o cuidado natural de separar águas entre os diferentes projectos a que se ligou, mantendo uma postura clara e directa com os seus produtores, numa atitude de transparência e profissionalismo. Há uma década, em 2004, saiu do projecto Esporão para abraçar o nascimento de um novo projecto no Alentejo, a Herdade dos Grous, onde assumiu a direcção da produção agrícola liderando as rédeas não só do flamante projecto enológico dos Grous como da produção agrícola restante.
O passar do tempo fez com que Luís Duarte pudesse concretizar aquela que é a aspiração mais íntima de qualquer enólogo, o sonho de ter um vinho próprio. A fronteira entre os projectos pessoais e a consultoria pode ser ambígua, pode ser causadora de equívocos e provocar desconfiança. Luís Duarte sempre teve o cuidado de não se transformar em concorrente directo dos produtores a quem presta consultoria, mantendo uma ligação aberta e livre de mal-entendidos. O tempo fez mesmo com que chegasse ao ponto de se ter convertido no maior cliente de alguns dos produtores com que trabalha.
Bastou uma mera meia dúzia de anos para que Luís Duarte se transformasse num dos grandes produtores do Alentejo, com uma plêiade de marcas que, curiosamente, a generalidade dos consumidores portugueses desconhece. A maioria dos seus vinhos é vendida fora de portas, maioritariamente no Brasil e Angola, sem desprimor de outros mercados mais tradicionais. Desta forma, Luís Duarte não entra em conflito directo com os seus produtores no mercado nacional. O sucesso de rótulos como Rapariga da Quinta, Rubrica, Agricultura, Matéria e muitos outros é tal que Luís Duarte se transformou num dos maiores exportadores de vinho alentejano para o Brasil, situando-se hoje como um dos nomes mais conhecidos de Portugal naquele país. Assim houvesse mais produtores com visão e ambição.