A Aveleda prepara-se para entrar em força no Douro. O gigante dos Vinhos Verdes apresentou a única proposta para a aquisição da massa insolvente do projecto Seis Quintas Martue, em Torre de Moncorvo, iniciado em 2007 por três investidores espanhóis. A base de licitação era de 3,5 milhões de euros e a Aveleda fez uma proposta de valor ligeiramente superior.
O rosto e principal accionista do projecto Seis Quintas era o empresário Fausto González, um ex-gestor de empresas que se dedicou à viticultura na década de 1990. Os outros dois sócios eram Carlos Cutilhas, presidente da imobiliária Chamartin, que foi proprietária em Portugal dos centros comerciais Dolce Vita, e o cantor, actor e realizador Emilio Aragón. Quando chegaram ao Douro, os três investidores espanhóis já possuíam as Bodegas Martüe (81 hectares de vinha divididos por duas quintas), em Castilla-La Mancha, perto de Toledo, e a Viñedos Nieva (55 hectares), na região de Rueda, perto de Segóvia.
Os investidores espanhóis começaram por adquirir seis propriedades contíguas mesmo às portas de Moncorvo, num total de 60 hectares, dos quais 12 eram de vinha, juntando-as numa só. Daí o nome do projecto: seis quintas. Com as plantações que foram feitas depois, a área de vinha subiu para cerca de 50 hectares, todos com sistema de rega gota a gota. Além das vinhas e de alguns hectares de olival, o projecto inclui uma adega construída de raiz, uma casa de habitação, alguns edifícios de apoio agrícola e duas charcas para armazenamento de água. Até terem aberto falência, os antigos proprietários investiram mais de 6 milhões de euros e a sua intenção era construir também um hotel de charme com 10 quartos, tendo chegado, de resto, a preparar um plateau com uma bela vista sobre o vale do rio Sabor.
O maior investimento foi feito na adega, um edifício de linhas direitas desenhado para acolher no mesmo plano, e em espaço aberto, a vinificação, o engarrafamento e o estágio dos vinhos. A adega dispõe de uma passerelle central no piso superior que conduz aos espaços de degustação e de lazer, com vista para o Sabor.
O projeto Seis Quintas não resistiu aos efeitos da crise financeira mundial que eclodiu logo a seguir à chegada dos investidores espanhóis ao Douro. Nos primeiros anos, tudo parecia correr bem e o dinheiro não faltava, mas, a dada altura, as dívidas a fornecedores começaram a acumular-se. E, mais tarde, os três accionistas acabaram por se desentender, com Fausto González a “nomear-se” único administrador, desencadeando uma querela judicial com os outros sócios, que terão sido ludibriados, o que conduziu à falência do projecto. E assim acabou o sonho de Fausto González, que queria ser o primeiro espanhol a produzir vinho do Porto, como afirmou numa entrevista a um jornal de Toledo, ignorando que muitos outros espanhóis já o tinham conseguido.
Embora não herde marcas com prestígio, a Aveleda vai fazer um bom negócio. A área de vinha não é muito grande e apenas 10 hectares estão autorizados a produzir vinho do Porto, mas é uma vinha nova e bem instalada e a adega é do melhor que há na região. Acresce que a empresa minhota compra mais do que uma quinta: com vinha, adega, casa de habitação (não muito grande, é certo) e uma entrada monumental, a Aveleda passa a dispor de uma espécie de chateau no Douro, e isso tem muito valor.
Com esta aquisição, a família Guedes segue o movimento de outras empresas de fora que têm vindo a estender-se ao Douro, como são os casos das alentejanas Herdade do Esporão, Herdade dos Grous e João Portugal Ramos. Para a Aveleda — que além dos Verdes, onde possui cerca de 230 hectares, também já está na Bairrada , com a Quinta da Aguieira (25 hectares) — não é bem uma estreia ablsouta no universo vinícola duriense. Há muitos anos que a empresa comercializa vinhos do Douro (com a marca Charamba), mas tem-no feito comprando lotes na região a diferentes produtores. Como produtora das suas próprias uvas e vinhos, será a primeira vez, e este passo culmina um velho sonho da família proprietária da Aveleda, que, apesar de ter estado sempre ligado ao Minho e aos vinhos verdes, também esteve na origem da Sogrape.
O Douro foi sempre um objectivo da empresa e, quem conhece a forma de actuar da família Guedes (ramo minhoto), sabe que não há nada de especulação por trás deste negócio. A Aveleda vai para o Douro para crescer e ficar por lá durante as próximas gerações.
A família Guedes está ligada ao negócio do vinho e à agricultura há 14 gerações, mas como produtora vai na quinta geração, liderada por Martim Guedes, que se escusou a comentar a compra das Seis Quintas Martue enquanto o negócio não for oficializado. A proposta da Aveleda já foi aceite, mas falta ser homologada pelo tribunal, o que deverá acontecer dentro de poucos dias. A aquisição vai custar à empresa cerca de metade dos lucros que obteve em 2015, ano em que facturou mais de 30 milhões de euros.