Fugas - hotéis

E da pedra se fez luxo

Por Luís J. Santos ,

Numa encosta da Serra de Sicó, uma exemplar reconstrução rústica alia-se ao alto design. Villa Pedra, um turismo de aldeia a poucos quilómetros de Soure, Pombal ou Coimbra, nasceu há precisamente um ano das ruínas de uma povoação abandonada e conjuga luxo e história, sossego e beleza, tradição e marcas de topo. Eis a excelência calcária desta exclusivíssima aldeia.

Subitamente, toca o despertador. Mas sem medos, que este é capaz de ser um dos mais belos despertadores do mundo. É um chilrear harmonioso que ora se eleva ora se acalma. Serão talvez milhares de pássaros, uma orquestra despertadora que trabalha por amor à opulência frutífera que circunda a casa. A banda sonora poderia até incluir algum rebanho a desfilar pelas ruelas empedradas desta Villa Pedra, paraíso em terras de Sicó, mas, por acaso, não é dia do pastor aparecer. Ficamo-nos pelos pássaros que com a sua iluminação musical, sublinhada por uns ariscos raios de sol, fazem com que uma pessoa nem se importe de esquecer o sono e despertar para a vida.

Os olhos vão-se abrindo, descobrindo-se cercados de pedra por todos os lados, uma aconchegante protecção pontuada por peças de design contemporâneo e histórico, de itens desta e de outras eras, daqui e de todas as partes do mundo, quadros, colagens, transparências e solidezes, mil e um detalhes criativos. Logo para começar, soergue-se à cabeceira da cama um quadro natural, com uma moldura a enquadrar a pedra da estrutura da parede. Uma espécie de janela para a pedra, até porque a verdadeira janela entreabre-se é para um luxuriante jardim. Diga-se que quase não há vontade de abandonar o vale destes imaculados lençóis. Só que há uma força maior, um íman, aqui a poucos metros: a certeza de que a cozinha já está enriquecida por um pequeno-almoço digno de um rei, de que por ali já estão à nossa espera sumos, cafés, queijinhos do Rabaçal, compotas, frutas, broa e ainda, num taleigo deixado preso à porta, um pão caseiro fresquinho acabado de chegar.

Ninguém diria que estamos numa povoação votada ao abandono há umas boas sete décadas, numa casa magnificente que há pouco mais de seis anos era uma nua ruína. Pois esta outrora chamada Aldeia de Cima, agora no lugar de Cotas, no concelho de Soure, Beira Litoral, foi promovida a Villa Pedra e começou a receber hóspedes há precisamente um ano.

Além do nosso palácio de pedra e design, a Villa (que vai buscar o seu nome às antigas "villas" romanas da região) oferece actualmente mais três casas, baptizadas com nomes sugestivos: Loureiro é a nossa, nas vizinhanças ficam a Jasmim, a Alecrim e a Amendoeira. Tanto os interiores como as zonas exteriores estão recheados com o que de melhor se possa desejar. Sejam as cozinhas, os quartos, as salas ou as casas de banho. Ou mesmo os acolhedores recantos exteriores. As belíssimas peças do quotidiano tradicional conjugam-se com móveis de Conceição Silva, o design de Philippe Starck dialoga com peças nobres de paragens mais exóticas e os excelentes exemplos do mobiliário português do anos 50 sintonizam-se com o melhor desenho alemão e dinamarquês, de Christian Dell a Erik Buch.

Modernidade e tradição

A Villa Pedra deve a sua existência a Manuel Casal, um dos proprietários, que descobriu as casas e iniciou o projecto de recuperação e criação deste Turismo de Aldeia. Um projecto de um cuidado visivelmente extremoso, apurado até ao detalhe, por Vitor Mineiro, arquitecto e artista plástico que nos passeia e explica cada ponto desta sua obra-prima. E, ao ouvi-lo falar, é fácil acreditar que não há centímetro quadrado que não tenha sido pensado e trabalhado na exacta medida em que um artesão aprimora a sua obra. Aliás, a decoração das casas inclui peças criadas por Mineiro, incluindo várias colagens que dão um cunho contemporâneo ao espaço, num criativo contraponto entre modernidade e tradição.

Neste espaço de mais de três hectares, fechado a muros e abundante vegetação, encontra-se o exacto equilíbrio entre sossego e privacidade, luxo e simplicidade. As casas, "orgânicas" e "naturalmente irregulares", foram reconstruídas obedecendo às melhores regras da tradição local, passando pela recuperação de técnicas e materiais de construção antigos, sendo a pedra calcária o seu pilar - incluindo a sua utilização descarnada nas paredes. As paredes são em blocos de pedra cobertas de cal ocre e no exterior, em tons salmão, estão preparadas para irem tomando com o tempo "a cor da região". A utilização de materiais nobres é omnipresente, dos soalhos e tectos em cuidada madeira ao mármore de Limoges usado nas casas de banho.

Todas as casas - um T1, um T1+1 e dois T2 - incluem suites, salas de estar e jantar, aquecimento central e lareira (interior e/ou exterior), cozinha equipada de alto a baixo, TV (com leitor DVD), aparelhagem de som e internet. E cada uma oferece casas de banho várias, espaçosas e de decoração primorosa, ou um prazenteiro terraço e jardim privativo, com as suas mesas, recantos com cadeirões e cama de rede ou espreguiçadeira - os jardins e terraços são comunicantes, mas é só fechar um portão e fica-se em absoluta privacidade (não faltam belos caminhos para ir em volta). Cada casa, porém, tem a sua personalidade, a sua história e a sua mais-valia arquitectónica.

A nós, é-nos dada a oportunidade de alinhavar estas linhas numa sala que é um achado, na Casa do Loureiro: com a pedra das paredes visível, feitas de blocos seguros por milhares de lascas e com pequenos quadrados por janelas, oferece a principesca transparência de um tecto de vidro que quase nos faz desejar uma bela chuvada a compassar este nosso céu.

Às casas existentes, irão progressivamente juntar-se outras. E aí está outro prazer: este é um projecto em desenvolvimento e permite-nos apreciar as ruínas pedregosas a transformarem-se em futuras casas - à noite, uma delas é iluminada por dois projectores, ganhando uma magia singular que quase faz desejar que fique para sempre assim.

A Villa é um jardim

E a Villa, onde não há trânsito automóvel (os carros ficam num parque à entrada da propriedade, longe o suficiente para nem se ouvirem), é toda ela um jardim, de passeios verdejantemente atapetados pelos socalcos, feito de oliveiras, nogueiras, amendoeiras, laranjeiras, cerejeiras, figueiras, macieiras e mais umas dezenas de espécies de árvores, milhares de plantas e flores de todas as cores e feitios ou até uma horta, que pode ser usada pelos hóspedes para cozinharem.

A propósito, quem não estiver virado para a cozinha e não lhe apeteça ir à descoberta dos restaurantes locais, poderá reservar com antecedência refeições caseiras, preparadas por uma sapiente cozinheira local (na ementa: cabrito no forno a lenha, chanfana e arroz de galo...). Por este imenso jardim, com vista para o vale e os montes, vão-se descobrindo recantos preparados para deliciar qualquer um e cujo pendor romântico agradará particularmente a casais mais apaixonados. Faça calor, e a piscina, protegida por sólidos muros de pedra, está aí para o serviço. Se o frio se fizer sentir, é correr a acender a lareira em casa - a lenha paga-se, mas está à disposição. E, na verdade, apesar de não faltarem motivos de interesse pelas redondezas, quase apetece passar o tempo apenas a desfrutar da casa, mesmo que se façam uns intervalos, por exemplo, para um piquenique (basta encomendar uma cesta guarnecida com tudo o que é preciso).

Para mais, este é um verdadeiro retiro ecológico que se pauta pela utilização racional de recursos, alimenta-se em parte de painéis solares e rejeita produtos e matérias que não respeitem o ambiente. Acrescente-se que, pela propriedade, fios, nem vê-los: estão todos bem escondidos das vistas para não perturbarem a ecologia plácida da paisagem.

Sendo sítio para descobrir vagarosamente, deixamos para o fim a(s) cereja(s) em cima do bolo. Num dos cantos da Villa, há uma espantosa gaiola gigante, uma capoeira com um pequeno lago que inclui entre a sua cosmopolita população cisnes pretos e patos de Java, galinhas galegas ou papagaios australianos. E num dos pontos mais elevados está o recanto mais privado e sedutor, uma espécie de cama de dossel com tecto que parece um templo asiático e que, amaciada por almofadões, iluminada por lanternas ou velas e com tecidos a ondular, poderá dar todo um novo sentido ao conceito de zen. Eis o verdadeiro luxo: uma paz sólida que nem pedra.

Como ir
De Lisboa - tomar a A1, sair aos 153 km pela saída 10 em direcção a IC8/ Figueira da Foz/Pombal, passar a portagem e virar logo na primeira saída à direita, direcção Castelo Branco/Pombal, seguir pelo IC8 (aproximadamente 4km), sair para IC2/N1 direcção Pombal/Coimbra e sair à direita para Coimbra; andar 13,5km, virar à direita nas placas Pombalinho/Casa de Campo, seguir durante aproximadamente 10km, virar à esquerda na indicação Cotas, seguir 1km até à placa Villa Pedra, onde se vira à esquerda até às casas. Do Porto - tomar a A1 até Condeixa, passar por Condeixa-a-Nova, seguir para Venda Nova (1.4km), continuar pela estrada do IC2 e seguir pela N348 (0.7 km); na saída de Venda Nova, pela N348, virar à esquerda na indicação Cotas, seguir 1km até à placa Villa Pedra, onde se vira à esquerda até às casas. GPS: 040º00''30"N0 08º48''55"W 

Nome
Villa Pedra
Local
Soure, Soure, Rua do Rechio e Seladas - Aldeia de Cima (Cotas)
Telefone
910731194
Website
htpp://www.villapedra.com
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