Fugas - restaurantes e bares

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A nova cervejaria do chefe Vítor Sobral

Por José Augusto Moreira ,

Para além do gozo dos petiscos marinheiros que nos impelem a saborear com pão e à mão, a Cervejaria da Esquina é um lugar de evocação e de celebração gastronómica. Há o talento, a competência e a criatividade de Vítor Sobral, mas também a genuína memória das históricas cervejarias de Lisboa.

Tem tudo a ver. Depois do percurso culinário que lhe é reconhecido e de ter incorporado a lógica petisqueira em ambientes de maior cultura gastronómica, a cervejaria estava, obviamente, no caminho de Vítor Sobral. Quem melhor que ele tem agarrado o lado mais popular das nossas comidas, puxando-as para patamares de maior apuro e dignidade? Sofisticação, diz-se com regularidade, mas que parece não ser o termo mais adequado. Sofisticada era também a forma como em ambientes rudimentares e sem o apoio das tecnologias os nossos ancestrais apuraram técnicas e receitas, às quais cozinheiros como Vítor Sobral a associam hoje criatividade e contemporaneidade. Bem-haja por isso.

Depois da Tasca da Esquina, a cervejaria, naquilo que representa para o nosso imaginário urbano, era, portanto, uma realidade à qual Sobral dificilmente poderia escapar. E, mais uma vez, na singular zona de Campo de Ourique, um bairro residencial de tradição que casa com uma forte vocação para o comércio mais moderno e sofisticado. Onde passado e presente se potenciam de forma mútua, tal como acontece com o conceito gastronómico de Vítor Sobral. Tem tudo a ver, portanto.

Instalada num dos quarteirões mais setentrionais da urbanização, ocupa as instalações da antiga Pastelaria e Leitaria Bonina, cuja inscrição ainda sobrevive na bandeira da porta principal. Um apontamento clássico que contrasta com o ar moderno e prático que se respira no interior. Mobiliário de linhas simples e claras, balcão ao centro onde se destacam as torneiras da cerveja e o aquário com crustáceos e água a borbulhar.

O imaginário da típica cervejaria alarga-se ainda à oferta de pregos e bifes (incluindo de atum), mas é melhor esclarecer que as semelhanças se ficam por aqui. Além de camarões, lagostins, lavagantes e lagostas, a carta propõe ostras (do Sado, a 2,80 euros a unidade), conquilha, berbigão, búzios, canilhas, burriés, amêijoas, lingueirões e demais aparentados, consoante a oferta diária da lota. Tudo é rigorosamente fresco e quase sempre das nossas águas e os preços, como é bom de ver, variam também ao sabor dos apetites do mercado.

A par das frescuras marinhas, cozidas, grelhadas ou ao natural, a oferta estende-se aos cozinhados de tacho. Cataplanas, arrozes e massas, com preços a depender igualmente das combinações marinheiras. Numa visita, há cerca de mês e meio, começou-se por petiscar umas finíssimas fatias de chouriça, cuja excelência logo denunciava as origens alentejanas. Da lista do dia, provaram-se deliciosos percebes (350g/20,30 euros), iodados, a saber a mar, em cama de gelo e ainda fumegantes. A mesma frescura exibiu o camarão médio (300g/13,50 euros). Perfeitos para saborear a "esquininha", copo de cerveja, baixote e bojudo, que é o cartão-de-visita da casa.

Com maior elaboração culinária, as amêijoas à Bulhão Pato (17,50 euros), molho espevitado, alho e coentros, e a pedir um bom pão de mistura, tipo alentejano (havia apenas pão de água) para aproveitar o suco. Igualmente apetitosos os lingueirões (13,50 euros), para comer à mão, chupar os dedos e usar o pão para limpar o prato. Há que dizer que, quanto a nós, este será o principal traço distintivo deste projecto do chefe Vítor Sobral. Comidas ligeiras e simples, mas que se tornam irresistíveis pelo apuro culinário. Para comer com pão e à mão, como sempre pedem os mais gulosos pedaços da tradição petisqueira.

Noutro patamar culinário as pequenas doses de arroz de lavagante, com amêijoas, e de açorda de camarão (puxadinha de sal), igualmente irresistíveis. Acompanharam com Muros Antigos, um Alvarinho de 2009 pleno de força e juventude.

Um flan de chã verde Gorreana, crocante de amêndoa, sopa de frutos e gelado de cerveja (2,60/4,50 euros) completaram a refeição, que incluiu ainda os cafés e rondou os 50 euros por cabeça. Há mais barato, só que não tão bom. Tal como costumava dizer o saudoso David Lopes Ramos. Além da cerveja, apenas Sagres e Bohemia, há uma boa oferta de vinhos - 32 brancos, 22 tintos, dois rosés e nove espumantes/champanhes - com a originalidade de a carta estar impressa nos toalhetes de papel.

Para além do gozo dos petiscos que nos impelem a saborear com pão e à mão, a Cervejaria da Esquina é um lugar de evocação e de celebração gastronómica. Há o talento, a competência e a criatividade de Vítor Sobral, mas também a genuína memória das históricas cervejarias de Lisboa.

Mais importante de tudo é ainda a preservação da tradição petisqueira, neste caso marinheira, tanto no que toca à oferta de produtos como à sua confecção. Mais a mais quando tudo isto contrasta flagrantemente com a onda destruidora dos fritos e comidas rápidas que invadiu os snacks e as velhas cervejarias. Sendo um espaço onde não entra tal tipo de destruição, é mesmo caso para dizer "résvés Campo de Ourique", frase que ficou célebre quando o terramoto de 1755 devastou a cidade até aos limites do bairro, que ficou intacto.

Nome
Cervejaria da Esquina
Local
Lisboa, Santo Condestável, Rua Correia Teles, 56 (Campo de Ourique)
Telefone
213874644
Horarios
Terça a Sexta das 12:30 às 15:30 e das 18:00 às 01:00
Sábado e Domingo das 13:00 às 17:00
Website
http://www.cervejariadaesquina.com/
Preço
40€
Cozinha
Portuguesa
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