Fugas - viagens

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Veneza: Entre as osterias do Rialto e o luxo do Danieli

Do Danieli, há apenas duas ou três cenas no filme, porque mesmo as partes da Suite Real - o quarto onde dormiram os clientes do Golden Book - foram quase todas filmadas num palácio aqui perto no qual o quarto foi reconstituído ao milímetro.

A suite custa cinco mil euros por noite e é com naturalidade que Moira Segato, assistente do manager do hotel, nos informa que afinal só a pode mostrar no dia seguinte, pois acabou de receber uma reserva para essa noite "mas eles só dormem um dia, amanhã depois do almoço pode ver". E assim foi.

"Temos que viver com a água"

Para quem gosta de descobrir as diferenças entre a realidade e a ilusão do cinema, o Danieli que se vê no filme e o Danieli real são um caso divertido. "No filme, eles estão neste quarto e nós vemos o Grande Canal e a Ponte do Rialto pela janela. Mas a ponte, como já terá percebido, é a 10 minutos a pé daqui", diz Segato com um sorrido tímido. A cena na qual Johnny Depp salta da janela da suite para o Grande Canal é outra evidente manipulação. A água não toca sequer no palácio - se saltasse, Depp morreria estatelado no passeio, aliás um dos mais amplos da cidade.

É um passatempo clássico de Veneza - percorrer a cidade à procura dos lugares das filmagens de Morte em Veneza, por exemplo, da mesma maneira que vamos a Nova Iorque e procuramos os lugares de Woody Allen ou Martin Scorsese. Na noite de estreia de O Turista, conta um veneziano que preferiu não ser identificado, muitas pessoas riram do princípio ao fim, à medida que descobriam como, na montagem, coisas que são distantes estão estranhamente próximas, e ruas que têm água à esquerda passam a ter gôndolas e vaporettos à direita.

É compreensível, diz Moira Segato. "Não é muito fácil fazer filmes em Veneza, basta pensar no trabalho que dá transportar o material de um lugar para outro. Temos que viver com a água. Não se pode chamar uma carrinha e já está", diz a manager assistente do Danieli. Segato lembra-se de ver há uns anos um filme cuja acção se passa em Veneza, mas que foi todo filmado em Londres e, na sala, todos perceberam isso imediatamente.

Mais tarde, por email, tentamos falar com Claudio Staderini, o manager do Danieli. Gostou do filme? Como decorreram as filmagens? Como mudou a vida do hotel naqueles meses? A resposta, porém, foi lacónica. "Foi um grande prazer ter a sra. Jolie e o sr. Depp no hotel durante as filmagens. Veneza e o Hotel Danieli são óptimos lugares para fazer este tipo de filmes de acção." Serão "óptimos" lugares, sem dúvida, mas O Turista foi o primeiro filme feito no Danieli (há uma excepção, episódica, de uma cena de um 007 com Roger Moore filmada na Suite Real). "No dia em que filmaram a chegada ao lobby, às quatro da manhã já havia mais de 100 pessoas cá em baixo a preparar tudo", conta Segato. "A Angelina Jolie e o Johnny Depp desceram por volta das 10h da manhã e acabaram às 19h. Passaram o dia a repetir as cenas." Só dormiram no Danieli duas noites, mas não na Suite Real, entretanto já transformada em set.

Uma coisa é certa. É em amor - e não em capitalismo - que se pensa quando se está, imóvel e de pé, no hall do Danieli. A história internacional das paixões parece estar toda aqui, entre o salão de chá, as escadarias e os quartos no primeiro andar.

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