Fugas - restaurantes e bares

  • René Redzepi, aqui fotografado no seu restaurante Noma, é o fundador do MAD, que acontece em Copenhaga
    René Redzepi, aqui fotografado no seu restaurante Noma, é o fundador do MAD, que acontece em Copenhaga JOACHIM LADEFOGED/VII/CORBIS
  • “Pretendo ensinar-vos a ter medo. Nunca somos velhos para o ter”, disse Albert Adrià
    “Pretendo ensinar-vos a ter medo. Nunca somos velhos para o ter”, disse Albert Adrià MIKKEL HERRIBA
  • Futa Feia, projecto português inspirador
    Futa Feia, projecto português inspirador MIKKEL HERRIBA

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O “Cirque du Soleil” da gastronomia regressou a Copenhaga

O nome não podia ter sido melhor escolhido: MAD significa comida em dinamarquês e louco, em inglês. Nos intervalos das palestras, bebe-se cerveja artesanal, criada especialmente para o evento pela marca dinamarquesa Mikkeller, come-se gelado de buttermilk (leite desnatado) e ao almoço moqueca preparada pela equipa da Gastromotiva ou tacos mexicanos confeccionados por Roy Choi, de Los Angeles, pioneiro do movimento actual de comida de rua.

O que é cozinhar?

Depois do tema “Apetite” na primeira edição, seguido de “Vegetação” e “Garra” nas seguintes, em 2014 foi a vez de se perguntar “O que é cozinhar?”. “Este é o momento ideal para se ser cozinheiro. Mas quanto mais atenção a nossa indústria recebe da televisão, filmes, jornais, revistas e Internet, cada vez é menos claro o significado de cozinhar. Um caminho para o estrelato, uma forma de fazer fortuna — a última década levantou muitas percepções que nós sabemos que não significam cozinhar”, afirmou René Redzepi no início do MAD.  Este ano, a co-curadoria ficou a cargo de Alex Atala, chef do restaurante D.O.M., em São Paulo, e o brasileiro convidou 29 oradores, desde escritores, artistas, produtores e activistas, para discutirem o tópico e lançarem ideias sobre o que é cozinhar, neste momento. Para o chef David Hertz, significa uma arma para tirar as pessoas da pobreza. Para a lendária escritora e actriz indiana, Madhur Jaffrey, cozinhar é a nossa identidade cultural. E para Chris Ying, editor da revista de gastronomia Lucky Peach e fundador do projecto Zero Food Print, que pretende tornar os restaurantes em espaços de zero emissões de carbono, até pode significar lutar contra as mudanças climáticas. 

Nas palestras, foram vários os chefs que mostraram a sua visão do que é cozinhar através das suas experiências pessois. Podem ser nervos, pressão e suor. Exaustão até ao osso e, apesar de se trabalhar em equipa, ter uma vida solitária.

Solidão e exaustão foi o que desvendou ter passado Chris Cosentino, chef de cozinha em São Francisco, e que mostrou que a cozinha não é a vida cor-de-rosa que se vê em programas de televisão. Em 2007, o americano começou por ser um dos participantes no Iron Chef America, mas acabou por ser convidado para entrar no programa Chefs vs City, no canal de televisão Food Network, onde viajava e comia com outros chefs. Acabou por ser um desastre. “Não era aquilo que eu esperava quando assinei o contrato”, confessou Chris, uma vez que era obrigado a participar em concursos de comida que eram menos testes de sabor cegos e mais comer pizzas de três quilos ou malaguetas inteiras, consideradas das mais picantes do mundo. “Cheguei a um ponto que me senti envergonhado e desapontado por estar a destruir a vida das pessoas e estar a ensinar maus hábitos aos meus próprios filhos. Contudo, não havia forma de parar. Tinha assinado um contrato”, revelou o americano, ao acrescentar que falou com a produção, mas esta ignorou-o.

Em 2009, o chef ficou extremamente doente e após cinco anos de testes médicos descobriu que desenvolveu um distúrbio da motilidade intestinal, na qual a comida no estômago não consegue descer para os intestinos. Teve de fechar o seu restaurante, em São Francisco. Agora, já recuperado, disse sentir-se arrependido e com vergonha. “A única coisa que queria era dar mais oportunidades à minha família, aos meus empregados e à minha carreira. Ter ficado doente foi o preço que paguei pela fama”, afirmou. Uma longa caminhada solitária que serve agora para prevenir jovens chefs de quererem ter fama fácil, naquela que foi uma das palestras mais emocionantes do simpósio.

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