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Roma, cidade contemporânea

Por Sérgio C. Andrade

Todos os caminhos levam a Roma e não só os histórico-religiosos. Enquanto muitos católicos celebram a beatificação de João Paulo II, regressamos à capital italiana, repondo uma visão contemporânea da milenar cidade, quando os focos recaíram sobre a inauguração do imponente Maxxi, primeiro museu de arte contemporânea romano.

Vai-se, normalmente, a Roma, para viajar no tempo e na História. Mas, desta vez, esqueçam o Coliseu e a Capela Sistina, o Panteão e o Castelo de Sant’Ângelo, o Palatino e a Praça de S. Pedro... Roma é também uma cidade contemporânea. Que quer concorrer, neste campo, com Paris, Londres ou Berlim... Ou com outras cidades italianas, como Turim, Nápoles ou Milão, mais bem posicionadas na cena das artes contemporâneas.

A inauguração, no último fim-de-semana de Maio de 2010, do Museo Nazionale delle Arti del XXI Secolo (Maxxi), e a apresentação pública da nova ala do Museu de Arte Contemporânea de Roma (Macro) foram transformadas pelos responsáveis públicos italianos numa acção mediática de alcance internacional para mostrar que a cidade não é só património antigo.

As circunstâncias propiciavam essa aposta, principalmente porque o novo Maxxi, primeiro museu nacional de arte contemporânea na capital, tem a assinatura inconfundível de uma das “archistars” da actualidade, a britânicairaquiana Zaha Hadid.

As festas nos dois museus foram distribuídas por quatro dias (num deles, cinco mil convidados foram reunidos para visitar o Maxxi), numa bem calculada operação de marketing que chamou a atenção para a face menos visível da cidade.

A nova ala do Macro, um museu municipal criado há uma década, foi projectada pela arquitecta francesa Odile Decq, não tão “archistar” como Zaha Hadid, mas a rivalizar com ela na encenação das suas aparições públicas, mostrando ambas uma especial predilecção pelo negro.

“A abertura do Maxxi parece-me um belo acto propiciatório de um futuro melhor. A arte supera o presente e cavalga o futuro”, disse na altura da inauguração, ao jornal Corriere della Sera, Achille Bonito Oliva, o comissário responsável pela exposição de abertura do museu, intitulada Spazio.

Esta aposta de Roma - presentemente a cidade mais procurada pelos turistas de todo o mundo, mas não a mais visitada -, em novos museus de arte contemporânea, na criação de uma nova imagem e na conquista de novos públicos, tem vindo a ser testemunhada “in loco” por Paulo Cunha e Silva, conselheiro cultural da Embaixada Portuguesa junto do Palácio do Quirinal. “Roma é uma cidade muito intensa; tanto que chega a ser, por vezes, tóxica do ponto de vista estético”, diz o médico-professor, que acrescenta sentir mesmo “uma certa perturbação” perante a beleza da cidade. “Temos de aprender a descobri-la e a fruí-la como um quadro dentro do qual se encontra uma sucessão de planos e de coisas que inicialmente não tínhamos identifi cado, mesmo se elas já lá estavam”, nota.

O ex-director do Instituto das Artes vê Roma como “uma cidade muito activa, que permanentemente nos interpela, não para uma contemplação passiva mas para um diálogo que, por vezes, pode ser mesmo violento”.

A sobreposição de diferentes camadas de História, que atrai hordas de turistas, todos os dias e todo o ano, associada à confusão do trânsito, ao hiper-policiamento das ruas (uma marca da era berlusconiana) e a uma forma muito latina de viver na rua são a face mais visível, e mais intensa, dessa cidade difícil de enfrentar num primeiro contacto. Mais ainda pelo facto de o seu centro histórico, diferentemente do que acontece com Paris ou Londres, por exemplo, se concentrar numa área mais circunscrita geograficamente.

Talvez por isso ou por uma espécie de “pudor” arquitectónico e urbanístico não calculado, para além da óbvia impossibilidade de construir no centro, os novos museus e outros edifícios contemporâneos têm surgido fora do núcleo histórico. Tanto o Maxxi como o Macro estão localizados na zona norte da cidade, em edifícios e bairros que já tiveram outras funções: o museu de Hadid ocupa o espaço de um velho quartel militar; o Macro, uma antiga fábrica de cerveja; já a extensão deste, o Macro Future, na zona sul, resulta da adaptação de um antigo matadouro.

“Não tenho a nostalgia do passado. Para mim, o confronto com a antiguidade é o contemporâneo, é a continuidade. É a construção do futuro que me interessa quando se fala do contemporâneo”, disse a arquitecta francesa Odile Decq, ao magazine Exibart, vendo Roma como um lugar privilegiado para discutir a contemporaneidade e conquistar o futuro. E é isso que, apesar da forte marca histórica, vem sendo feito em volta do anel central de Roma, em novos auditórios, igrejas e centros culturais, para além dos museus já citados, como veremos a seguir.


Maxxi: um museu com assinatura

É impossível ficar indiferente à arquitectura do Maxxi. Visto de fora, surge-nos como um novelo orgânico, que nasce do chão numa intrincada malha de betão vidrado. É um edifício estratificado em três camadas e que desemboca numa janela-olho avançada sobre um quarteirão de habitação, velhas fábricas e armazéns.

Zaha Hadid falou do seu projecto com que venceu, em 1997, um concurso internacional a que concorreu também o português Eduardo Souto de Moura como “um campo quase urbano”, um novo centro “poroso, imersivo, um campo aberto”. Com ele, a autora de vários pavilhões da cadeia Chanel espalhados pelo mundo quis fazer a sua arquitectura dialogar com uma das cidades mais icónicas do planeta.

Mesmo que se trate de um “diálogo dissonante”, como foi referido aquando da inauguração. O seu museu, que custou 150 milhões de euros, mais do dobro do orçamento inicialmente previsto, é um desafio sem precedentes na paisagem romana. É uma arquitectura “sinuosa mas de grande impacto emotivo”, como se lhe referiu o Corriere della Sera, mas que tem vindo a motivar reacções desencontradas.

Vittorio Sgarbi, responsável pelas aquisições para a colecção do Maxxi e curador da representação italiana na próxima Bienal de Arte de Veneza, em 2011, chamou-lhe “mausoléu”, dando eco a quem vê nele a sobranceria do arquitecto sobre a função de um edifício que deveria ser fundamentalmente uma casa das artes...

Já o crítico de arte e de arquitectura do Corriere della Sera, Vincenzo Trione, admitindo que “o edifício de Hadid exibe-se antes de mais a si próprio”, acha que ele não é “indiferente aos objectos que acolhe”. Trione vê no Maxxi uma obra que “concilia espectacularidade e seriedade”, mesmo que não consiga evitar os seus “excessos desconstrutivos”.

A verdade é que foi a própria Hadid que quis que o museu, após ter sido terminado e apresentado ao público no final do ano passado, se mantivesse livre de conteúdo durante seis meses para que a sua arquitectura se pudesse insinuar, sem outro ruído, na paisagem de Roma.

O objectivo foi conseguido. No momento da inauguração, o edifício praticamente submergiu o programa expositivo: uma retrospectiva com mais de uma centena de peças do controverso artista italiano Gino De Dominicis (1947-1998); a exposição inaugural Spazio, comissariada por Achille Bonito Oliva, a mostrar um quarto das 300 peças da Colecção Maxxi (e que inclui uma obra do português Pedro Cabrita Reis ver caixa); e o núcleo da arquitectura (o Maxxi é ao mesmo tempo museu de arte e de arquitectura), com uma homenagem a Luigi Moretti (1907-1973), um expoente da arquitectura do tempo do fascismo e co-fundador, depois da 2ª Guerra Mundial, da revista Spazio.


Macro, presente e futuro

O Museu de Arte Contemporânea de Roma (Macro) foi instalado em 1999, no lugar de uma velha fábrica de cerveja a norte de Roma, na Via Reggio Emilia [a ampliação apresentada só passou a ser usufruída plenamente pelo público pelo Outono, mas os responsáveis pelo museu municipal não quiseram desperdiçar o “happening” da inauguração do Maxxi, e associaram-se à festa com a inauguração da nova ala]. O projecto é da arquitecta francesa Odile Decq, que apostou na abertura de um amplo invólucro para exposições, a que chamou “território sensorial e transparente”, que contrasta com as salas convencionais distribuídas por três pisos, em duas alas face a face, na parte antiga do edifício.

Para além de uma escadaria-passadiço sobre o amplo espaço da nova ala, o museu contém no centro uma caixa-auditório vermelha, que contrasta com o preto dominante. Em declarações aos jornalistas, durante a inauguração, Odile Decq recusou qualquer comparação, e muito menos “competição”, com o Maxxi de Zaha Hadid. “Estou apenas concentrada no meu trabalho e em fazer um projecto que respeite a história social do lugar”.

No programa de exposições organizado pelo director do Macro, Luca Massimo Barbero, para a festa de apresentação do museu aumentado, encontra-se uma do português João Louro.

Uma outra extensão do Macro existe também, desde 2002, na zona sul da cidade, no bairro de Testaccio o Macro Future, adaptação de um matadouro do final do século XIX em novo centro de artes. É aí que se realiza a novel Feira Internacional de Arte de Roma, outra frente da aposta da cidade na cena contemporânea, cuja terceira edição decorreu também na última semana de Maio.

Em volta do Macro Future está a nascer uma nova movida de esplanadas, bares e restaurantes, que fazem os romanos e forasteiros descer a sul do histórico bairro de Trastevere, uma espécie de Bairro Alto na margem direita do Tibre.

Nova rede de galerias

À aposta nestes grandes museus públicos não foi estranha a iniciativa privada, através de uma rede de galerias particulares, que foram surgindo no casco histórico e renovando um mapa até aí muito datado. Paulo Cunha e Silva guiou a Fugas por algumas dessas novas galerias, que são expressão da “fome de contemporâneo” que actualmente se observa na cidade, e que tem vindo a substituir “a sobranceria” com que antes eram vistas as artes do nosso tempo.

“Nos últimos dois ou três anos, este aspecto alterou-se por uma espécie de pressão social”, diz o conselheiro da Embaixada, notando que exposições “muito pouco entusiasmantes estavam cheias de um público ávido de qualquer coisa que não acontecia” mesmo se Roma era já, acrescenta Cunha e Silva, cidade adoptiva de grandes nomes da arte internacional, como o grego Jannis Kounellis ou os norte-americanos Cy Twombly e Joseph Kosuth.

Este último tem actualmente obra representada na galeria Il Ponte Contemporanea, um trabalho da série Frammenti di Vitruvio. Bem perto, entre o Campo dei Fiore e o Jardim Botânico, em ambas as margens do Tibre, ficam a galeria Lorcan O’Neill (que apresenta actualmente Anselm Kiefer), a Gagosian (expõe Richard Serra) e a Alessandra Bonomo (com trabalhos de Sol Lewitt) esta última é a galerista romana do português Julião Sarmento.

Artes novas em edifícios históricos

Mas nem só em museus e galerias novas se encontra arte contemporânea. Como qualquer grande cidade, Roma oferece um vasto catálogo de exposições de grandes nomes da arte do século XX e da actualidade em múltiplos edifícios históricos ou, dentro deles, em alas que lhes são dedicadas.

Num roteiro não exaustivo, há quatro edifícios que merecem sempre que o visitante preste atenção à sua agenda de exposições: a Galeria Nacional de Arte Moderna e Contemporânea, o Palácio de Exposições, o Complexo Vitoriano e o Museu Palácio de Veneza.

A primeira está instalada no edifício construído para a Exposição Internacional de Arte de Roma de 1911 (projecto do arquitecto Cesare Bazzani). Para além de guardar a colecção da instituição criada em 1883 (a arte italiana do chamado novo Estado Unitário, fundado em 1861), apresenta actualmente uma selecção de obras do seu acervo (Attraverso le collezioni II, quadro scultura - scultura quadro) e outra, Tagli d’artista: una storia lunga un secolo, com peças de Giacometti, Klimt, Mondrian, Calder, Schwitters, Moore e Christo, entre outros.

O Palácio de Exposições, um edifício construído na década de 80 do século XIX e recentemente restaurado, mostra por estes dias (até 11 de Julho) A Natureza segundo De Chirico, exposição comissariada por Achille Bonito Oliva, que dá a ver 140 obras do artista italiano (1888-1978) que fundou o movimento Metafísica.

Igualmente no centro de Roma, perfazendo como que um triângulo museográfico com o palácio atrás referido, ficam, quase frente a frente, o Complexo Vitoriano e o Museu do Palácio de Veneza. No primeiro, monumento neoclássico que é dos mais “vistosos” da capital rivaliza em dimensão tanto com o Coliseu como com a Basílica de S. Pedro, está a terminar (29 de Junho) a exposição de arte impressionista De Corot a Monet. A sinfonia da natureza. O Palácio de Veneza, antiga residência papal e também escritório de Mussolini, contém uma ala dedicada à arte contemporânea, em paralelo com a sua colecção de pintura renascentista, escultura, tapeçaria e artesanato.

Arquitectura: A Cidade da Música

Entre o Maxxi e o Macro fica outro edifício, inaugurado há oito anos, que marcou também um momento forte na aposta da cidade na contemporaneidade. Trata-se do Auditorium Parco della Musica, projecto do italiano Renzo Piano (o autor do Centro Pompidou e do IRCAM, em Paris, do Postdamer Platz Hall, em Berlim, e da Ópera Nacional Grega, em Atenas), e igualmente uma peça estratégica no desenvolvimento da zona norte da cidade.

Quem se aproxima desta Casa da Música, por exemplo indo da estação do comboio suburbano que liga à estação de metro de Flaminio-Piazza del Populo, vê ao longe três enormes formas parecidas com carapaças de tartaruga por entre a vegetação verde. Rodeando o caminho, deparamos com um complexo monumental: em volta de um passeio e de um amplo anfiteatro, há três edifícios de dimensões diferentes, que na sua calote fazem também lembrar o Pavilhão Atlântico, em Lisboa.

O Auditorium Parco della Musica é um dos maiores complexos de salas de espectáculos da Europa. Mais do que uma Casa da Música, é uma Cidade da Música: são três blocos autónomos, e quatro plateias, que podem acolher 10 mil pessoas. Inclui-se aqui o auditório ao ar livre (o Cavea, na Praça Luciano Berio, em homenagem ao grande compositor italiano falecido em 2003).

Os auditórios Santa Cecília (2.700 lugares), Giuseppe Sinopoli (1.127 lugares) e Goffredo Petrassi (673 lugares), nomes que celebram a padroeira da música e dois outros compositores e maestros italianos do século XX, fazem a restante planta deste parque (inclui também um museu arqueológico), que, apesar da sua dimensão, encaixa bem dentro da paisagem verde.

“Quando as cidades se expandem, há sempre buracos negros que precisam de ser preenchidos”, disse Renzo Piano, a justificar a aposta da localização do Auditorium numa zona de expansão da cidade, na Cidade Olímpica dos Jogos de 1960.

Não há Siza, mas há Richard Meier

Álvaro Siza foi um dos convidados da Festa da Arquitectura realizada em Roma entre 8 e 10 de Junho (Eduardo Souto Moura e Carlos Castanheira também estiveram presentes), onde, segundo testemunharam à Fugas, foi recebido com os aplausos normalmente só dispensados às “archi-stars”. Mesmo se a sua pose discreta não tem nada a ver com as de figuras como Zaha Hadid ou Odile Decq e a sua arquitectura muito menos.

Curiosamente, a capital italiana é uma cidade onde o arquitecto português não tem obra. Mas podia não ser assim, já que, no final dos anos 90, Siza recebeu um convite do Vaticano para projectar uma das 50 novas igrejas planeadas para a área metropolitana de Roma, no âmbito da passagem do Milénio.

A de Siza seria a de Santa Maria do Rosário, pensada para uma localidade próxima do aeroporto de Fiumicino. Quando o projecto tinha entrado já na fase dos estudos de engenharia, a mudança de responsáveis na Igreja de Roma fez com que esse e a maioria dos outros trabalhos fossem postos de lado.

De entre os poucos que foram avante, há um que ficou a marcar a nova paisagem arquitectónica no anel da cidade. Trata-se da Igreja de Deus Pai Misericordioso, do norte-americano Richard Meier, inaugurada em 2003, em Tor Tre Teste, nos arredores sul de Roma. É uma estrutura que sugere a imagem de três velas de um barco, e também a Ópera de Sidney, na Austrália. Para além de templo religioso, transformou-se igualmente num ícone da nova arquitectura.

Richard Meier foi também chamado a projectar um novo “fato” para o histórico Ara Pacis, o altar-monumento situado no centro, na margem esquerda do Tibre, vindo do tempo de César Augusto, que com ele quis celebrar a Pax Romana. O arquitecto norte-americano envolveu o monumento com uma cobertura em granito, ferro e vidro, que não só valorizou a histórica iconografi a do altar como o transformou num museu, galeria e centro cultural (actualmente expõe obras do pintor italiano Tullio Pericoli).

Outra igreja-monumento contemporânea a visitar é a Mesquita de Roma, na zona norte, não muito longe do Parque da Música. É um projecto dos italianos Paolo Portoghesi e Vittorio Gigliotti e de Sami Mousawi, este último um arquitecto iraquiano sedeado em Inglaterra, como Hadid. A mesquita, inaugurada em 1995, é uma das maiores da Europa, com capacidade para 2.500 pessoas.

Casa a tradição árabe com o arrojo da arquitectura contemporânea, e é apresentada como um projecto visionário, tanto do ponto de vista arquitectónico como social e cultural, ao fazer a ponte entre duas civilizações.

Luzes portuguesas em Roma: Pedro Cabrita Reis, João Louro e Albuquerque Mendes

Uma luz na janela (2002) é o título da peça de Pedro Cabrita Reis que representa a arte portuguesa na Colecção do Maxxi. Formada pelo caixilho inacabado de uma porta iluminada por uma lâmpada fluorescente, é uma das obras integrantes da exposição de abertura do novo museu, Spazio, onde é apresentada como “metáfora da condição existencial”.

Mas Cabrita Reis não é, por estes dias, uma presença portuguesa isolada no roteiros romanos das artes. João Louro está no Macro, onde tem direito a sala própria na ala mais antiga do museu, mesmo ao lado da instalação X Y Zorio, de Gilberto Zorio, um dos ícones da “arte povera”. Louro prossegue em Roma, onde chegou a convite do director do Macro, Luca Massimo Barbero, a série Blind Images, encenando desta vez, sob o título My Dark Places (imagem ao lado), as aproximações, à partida inverosímeis, entre os imaginários de sexo e morte do Marquês de Sade e do escritor norte-americano contemporâneo James Elroy (autor de "L.A. Confidential" e "A Dália Negra"). É um mundo de espelhos ao mesmo tempo obscuro e brilhante, contraditório e tenso, onde “nada é o que parece, um universo onde o curto-circuito da visão e da linguagem cria caminhos expressivos originais”, lê-se no texto de apresentação.

João Louro completa a sua sala com um jogo de quadros monocromáticos, intitulado Clockwise from above [esteve patente até Agosto de 2010]. E em paralelo com a sua presença no Macro, o artista de Lisboa (n. 1963), a convite da Embaixada Portuguesa, instalou no jardim da representação diplomática uma peça que é uma espécie de sinalização rodoviária apontando para a sua exposição a apenas algumas centenas de metros de distância. É mais um trabalho da série Dead End, desta vez transportando para a berma da rua a poesia de Mário de Sá-Carneiro.

Também a convite da Embaixada Portuguesa, e em parceria com o Instituto Português de Santo António em Roma (IPSAR), Albuquerque Mendes (n. Trancoso, 1953) ousou encenar a Criação (imagem ao lado) na Igreja de Santo António dos Portugueses. Numa instalação formada por sete caixas-confessionários individuais discretamente colocadas numa das capelas da igreja, o artista faz a sua leitura numa espécie de “making of” ou via-sacra, mas desta vez pelas estações do maravilhamento do mundo dos trabalhos de Deus como são descritos no Livro do Génesis. É o regresso de Albuquerque Mendes a um tema que lhe é familiar, Deus e a religião.

O que mais chama a atenção na sua intervenção é o recurso a um dispositivo extremamente simples, que ao mesmo tempo evita o “confronto” com a profusão decorativa barroca da igreja, e liberta o visitante para fazer a sua própria viagem. “O minimalismo conceptual destas estruturas funciona como um indutor da experiência confessional de cada um. Estamos sós perante o esplendor do mundo”, escreve Paulo Cunha e Silva, a quem coube desafiar Albuquerque Mendes para este “making of” da Criação.

O guia do conselheiro: Sugestões

Paulo Cunha e Silva vive e trabalha em Roma desde há ano e meio, estando a meio do seu mandato como Conselheiro Cultural da Embaixada Portuguesa. Vive a cidade intensamente e aprendeu a gostar dela como de poucas outras cidades do mundo. É ele que nos conduz neste roteiro prático para os visitantes que forem à procura de uma Roma diferente da que vem nos guias mais turísticos.

O ex-director do Instituto das Artes habita no centro histórico, perto de duas praças que considera lugares especiais para fruir aquilo que a cidade tem de mais descomplexado e cosmopolita: o Campo dei Fiore e a Piazza Farnese, tão próximas e tão diferentes. O primeiro (que tem no centro a estátua de Giordano Bruno, que a Santa Inquisição queimou na fogueira...) é um dos espaços mais pitorescos da cidade e demonstra a sua versatilidade: mercado de frescos até às três da tarde, zona de esplanadas tranquilas até às 10 da noite, local da movida mais intensa até às 2, com encerramento muitas vezes compulsivo pelas forças da ordem.

A Piazza Farnese, “talvez a mais bela praça de Roma”, diz Cunha e Silva, é dominada pelo imponente palácio com o mesmo nome (sede da Embaixada de França), que foi redesenhado por Miguel Ângelo, e tem duas fontes feitas a partir de duas gigantescas banheiras trazidas das Termas de Caracala.

Quatro restaurantes

Gusto é vários em um: espaço “trendy” para todos os gostos (pizzaria + restaurante), com uma sala só para peixe, a cem metros, e, por trás, uma enoteca com uma montra de queijos “alucinante”.

Pagliaccio (** Michelin) é “um dos melhores restaurantes de Roma”, com uma cozinha de autor do chefe Anthony Genovese, que reinterpreta a gastronomia italiana com uma capacidade inventiva invulgar, sem cair nos delírios da “cozinha molecular, de fusão ou pós-nouvelle”.

Glass (* Michelin), localizado no bairro de Trastevere, é um restaurante também criativo “ma non tropo”, bastante mais em conta do que o anterior.

Felice é “uma feliz descoberta” num dos mais populares bairros da cidade, Testaccio, que ainda tem marcas de antiga “trattoria”, mas que o sucesso transformou numa meca da verdadeira cozinha romana.

Quatro bares

Bar de la Pace. Por trás da Piazza Navona este é o bar da “beautiful people” que habita o centro: os filhos dos príncipes e das princesas que se recusaram a sair dos seus palácios em troca de situações mais cómodas. Óptimos coktails.

Etabli. Um sofisticado bar de Inverno, com um toque rural inglês, em que numerosos “Chesterfield” se organizam negligentemente em frente a uma convidativa lareira.

Camponeschi. Na Piazza Farnesi, o bar dos artistas, curadores, galeristas e seguidores.

Baretto. Bar ligado à filmografia de Nanni Moretti, com uma notável intervenção de arquitectura contemporânea que o suspende sobre a cidade, na encosta do Gianicolo. Décor “retro-sixties” para uma clientela muito “nineties”.

Dois cafés

Café-Atelier Canova. A experiência de tomar café (ou chá) por entre modelos de gesso do grande escultor António Canova (1757-1822). As mesas estão literalmente no meio do café.

Café Greco. O mais famoso café da não menos famosa Via Condotti, onde se acotovelam todas as grandes marcas italianas. É fácil encontrar muitos fatos Prada e carteiras Gucci, e a invasão oriental e russa mistura-se com a aristocracia local residual.

Uma discoteca

La Maison. É a discoteca onde se vai depois da bebida muito espirituosa no Bar de La Pace, ali a poucos metros. A profusão de lustres e a dificuldade que um porteiro zeloso porá na entrada de um comum mortal mostram que Roma ainda consegue ser snob.

Cinco hotéis

Hotel Arts. Uma solução mais contemporânea e em conta para quem quer ficar no centro, na simpática via Marguta, onde vivia Fellini com a sua Giulieta [Massina]. Uma decoração “high tech”, numa zona “low tech” de antiquários e galerias de arte.

Hotel S. Jorge. Pequeno hotel de charme na sofisticada Via Giulia, com um terraço especializado em vinho Rosé, e um ambiente moderno no meio dos palácios do Cinquecento e Seicento.

Hotel Raphael. Por trás da Piazza Navona, este pequeno hotel repleto de antiguidades e obras de arte não é uma solução económica, mas é uma experiência inesquecível.

Hotel de Russie. É onde as estelas de cinema fazem questão de ficar quando vêm a Roma. Sobretudo depois de saberem que a Sofia Loren já não fica no Excelsior. Caro, imponente, impecável.

Hotel Hassler. O luxo clássico em Roma.


Como ir
| preços/rotas: actualização 01.05.2011

easyJet (Lisboa) - Voos para Roma Fiumicino: Primavera/Verão 2011 com preços minimos por voo entre 35€ e 65€. Outono/Inverno 2011 desde €25. (+ taxas opcionais)

TAP - Para Fiumicino: desde €170 i/v (com taxas).

Ryanair (Porto) - Para Roma Ciampino: desde 28€/voo (+ taxas opcionais)

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