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  • Quinta do Sagrado Reserva 2007 e Sagrado Tinto 2009
    Quinta do Sagrado Reserva 2007 e Sagrado Tinto 2009

Quinta do Sagrado: os grandes vinhos são também uma tradição de família

Por José Augusto Moreira

Historicamente ligada ao Vinho do Porto, a Quinta do Sagrado quer fazer igualmente parte da narrativa actual, que são os Douro DOC. Depois de mais de século e meio e cinco gerações na posse da família Cálem, o lema continua a ser a tradição.

Sagrada é a tradição dos vinhos do Douro, mas também o nome da quinta que lhes dá origem. Sendo uma das mais emblemáticas propriedades da região, na imponente encosta sobranceira à foz do rio Pinhão, nem sempre a quinta é, no entanto, associada aos Cálem, um dos históricos apelidos ligados à vinha no Douro. Depois de cinco gerações e cerca de século e meio integrada na história dos Vinhos do Porto, a Quinta do Sagrado reivindica agora também o seu quinhão na moderna tendência de vinhos DOC Douro. E o respeito pela tradição pretende ser o seu mais distintivo sinal de identidade.

Com a venda da AA Cálem & Filho ao grupo galego Sogevinus, em 1997, os Calem foram mesmo a última das grandes famílias portuguesas a sair do negócio do Vinho do Porto, numa altura em que já quase todos se tinham voltado para os emergentes vinhos do Douro.

A venda incluiu a marca, stocks e armazéns, mas a família preservou aquilo que considerava como as jóias da coroa, as quintas do Sagrado, da Foz e do Vedial. Em 2004 avançou para o mundo dos vinhos do Douro com a criação da PV Wines, numa parceria com Cristiano van Zeller e Jorge Serôdio Borges. Seria, no entanto, apenas em 2008, na sequência do desaparecimento do patriarca, Joaquim Manuel Cálem, e do consequente processo de partilhas, que José Maria Cálem acabaria por ficar definitivamente na posse das quintas do Sagrado e da Foz, com o propósito declarado de dar continuidade à histórica tradição familiar ligada à vinha.

“Os vinhos do Douro estavam na moda, mas o mundo mudou nesse ano”, lembra o actual representante dos Cálem, a propósito da crise financeira desde então instalada e dos compromissos bancários que teve que assumir. Houve, por isso, que largar mão da Quinta da Foz, vendida a angolanos em 2011, seguindo-se, já no ano passado, a definitiva evolução da PV Wines para Quinta do Sagrado – Vinhos SA.

Os vinhos de entrada levam os rótulos Sagrado (branco, tinto e rosé), enquanto os Quinta do Sagrado se destinam apenas às gamas superiores. É nestes últimos que é mais profundo o respeito pela tipicidade e tradição dos vinhos do Douro: lotes de vinhas velhas, pisa a pé em lagares de granito, utilização exclusiva de uvas da quinta, controlo de temperatura de fermentação e estágio em barricas de carvalho francês.

O Quinta do Sagrado 2007, que está no mercado por cerca de 15 euros, é um excelente exemplo dessa filosofia. Fruta ainda muito evidente, complexidade de aromas, cor concentrada. A densidade da fruta e de aromas típicos do Douro, mas sempre envoltos numa roupagem macia, fina e elegante como só os vinhos de qualidade superior podem expressar.

“Não me atrai a questão do volume. Esse é um nicho que já está ocupado”, explica José Maria Cálem, para realçar a elegância que igualmente mostram os vinhos da gama de entrada, que custam à volta de 8 euros. No caso do branco — que está ainda no mercado como Egle e só no próximo ano se uniformizará na marca Sagrado — conjugam-se agradáveis sensações de frescura e fruta madura, com uma boa aptidão gastronómica. Sem passagem pela madeira, mostra-se, assim, fino e limpo, tal como o rosé, fruto de uma simples sangria de Touriga Nacional, sendo vinificado como um branco. Nesta gama apenas uma pequena parte dos lotes do tinto (à volta de 10%) passam por leve afinação em cascos de carvalho.

Desde 2008 que a Quinta do Sagrado produz também Vinho do Porto, tendo sido declarada como vintage a colheita de 2011, que foi já provada em garrafa e deverá em breve aparecer no mercado.

A quinta está na propriedade da família há cerca de 150 anos e vai já a caminho da sexta geração. A vinha ocupa cerca de 20 hectares em patamares, organizados em 14 talhões que resultam da sua completa reestruturação levada a cabo nos anos 1980 no âmbito do PDRITM (Projecto de Desenvolvimento Rural Integrado de Trás-os-Montes). Predomina a Touriga Nacional seguida pelas outras quatro castas recomendadas, às quais se juntam ainda Sousão e Rufete. No sentido da progressiva adaptação à produção de vinhos tintos de qualidade — a reconversão foi orientada para o Vinho do Porto — o leque de castas será alargado para dez com a próxima inclusão da Tinta Amarela, Bastardo e a já quase desaparecida Tinta da Barca, que era uma antiga tradição da quinta.

Recentemente foram também plantadas 400 oliveiras, que em breve darão origem ao engarrafamento de azeites com o nome da quinta.

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Quinta do Sagrado Reserva 2007
Quinta do Sagrado, Pinhão, Alijó
Castas: Touriga Nacional (90%) e outras
Graduação: 13,5%
Região: Douro
Preço: 33,90€

Grande concentração de cor e complexidade de aromas potenciados pelas pisa a pé em lagares de pedra, como manda a tradição dos grandes vinhos do Douro. Parte da fermentação maloláctica e o estágio de 18 meses decorre em barricas de carvalho francês, metade novas e metade de segundo ano, que lhe domam a estrutura fogosa e conferem um carácter dócil e elegante, por onde despontam apontamentos mentolados e os sabores e frutos negros bem maduros. Macio e até algo sedoso na boca, deixa rasto prolongado e marcantes notas aromáticas. Foram feitas apenas 2820 garrafas e 150 magnun deste vinho que vale mesmo a pena provar.

Sagrado Tinto 2009
Quinta do Sagrado, Pinhão, Alijó
Castas: Touriga Nacional (53%), Vinhas Velhas (32%), Tinta Amarela (8%) e Touriga Franca (7%)
Graduação: 13,5%
Região: Douro
Preço: 8,30€

Com a Touriga Nacional a pontuar-lhe a personalidade, este é um vinho em cujo lote entra uma grande proporção de vinhas velhas, o que logo o coloca num patamar muito pouco habitual para os típicos vinhos de quinta. Na boca, o que logo sobressai é a fruta viçosa, equilíbrio e harmonia. Os lotes são vinificados em separado, a maioria em lagares de inox e com controlo e temperatura, e apenas um pequeno lote (cerca de 10%) estagia em madeira. Um vinho que expressa bem a filosofia da quinta de vinhos de lote, preferindo sempre a elegância e complexidade ao volume. Além do mais uma excelente relação entre qualidade e preço.

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