Sagrada é a tradição dos vinhos do Douro, mas também o nome da quinta que lhes dá origem. Sendo uma das mais emblemáticas propriedades da região, na imponente encosta sobranceira à foz do rio Pinhão, nem sempre a quinta é, no entanto, associada aos Cálem, um dos históricos apelidos ligados à vinha no Douro. Depois de cinco gerações e cerca de século e meio integrada na história dos Vinhos do Porto, a Quinta do Sagrado reivindica agora também o seu quinhão na moderna tendência de vinhos DOC Douro. E o respeito pela tradição pretende ser o seu mais distintivo sinal de identidade.
Com a venda da AA Cálem & Filho ao grupo galego Sogevinus, em 1997, os Calem foram mesmo a última das grandes famílias portuguesas a sair do negócio do Vinho do Porto, numa altura em que já quase todos se tinham voltado para os emergentes vinhos do Douro.
A venda incluiu a marca, stocks e armazéns, mas a família preservou aquilo que considerava como as jóias da coroa, as quintas do Sagrado, da Foz e do Vedial. Em 2004 avançou para o mundo dos vinhos do Douro com a criação da PV Wines, numa parceria com Cristiano van Zeller e Jorge Serôdio Borges. Seria, no entanto, apenas em 2008, na sequência do desaparecimento do patriarca, Joaquim Manuel Cálem, e do consequente processo de partilhas, que José Maria Cálem acabaria por ficar definitivamente na posse das quintas do Sagrado e da Foz, com o propósito declarado de dar continuidade à histórica tradição familiar ligada à vinha.
“Os vinhos do Douro estavam na moda, mas o mundo mudou nesse ano”, lembra o actual representante dos Cálem, a propósito da crise financeira desde então instalada e dos compromissos bancários que teve que assumir. Houve, por isso, que largar mão da Quinta da Foz, vendida a angolanos em 2011, seguindo-se, já no ano passado, a definitiva evolução da PV Wines para Quinta do Sagrado – Vinhos SA.
Os vinhos de entrada levam os rótulos Sagrado (branco, tinto e rosé), enquanto os Quinta do Sagrado se destinam apenas às gamas superiores. É nestes últimos que é mais profundo o respeito pela tipicidade e tradição dos vinhos do Douro: lotes de vinhas velhas, pisa a pé em lagares de granito, utilização exclusiva de uvas da quinta, controlo de temperatura de fermentação e estágio em barricas de carvalho francês.
O Quinta do Sagrado 2007, que está no mercado por cerca de 15 euros, é um excelente exemplo dessa filosofia. Fruta ainda muito evidente, complexidade de aromas, cor concentrada. A densidade da fruta e de aromas típicos do Douro, mas sempre envoltos numa roupagem macia, fina e elegante como só os vinhos de qualidade superior podem expressar.
“Não me atrai a questão do volume. Esse é um nicho que já está ocupado”, explica José Maria Cálem, para realçar a elegância que igualmente mostram os vinhos da gama de entrada, que custam à volta de 8 euros. No caso do branco — que está ainda no mercado como Egle e só no próximo ano se uniformizará na marca Sagrado — conjugam-se agradáveis sensações de frescura e fruta madura, com uma boa aptidão gastronómica. Sem passagem pela madeira, mostra-se, assim, fino e limpo, tal como o rosé, fruto de uma simples sangria de Touriga Nacional, sendo vinificado como um branco. Nesta gama apenas uma pequena parte dos lotes do tinto (à volta de 10%) passam por leve afinação em cascos de carvalho.