A arquitectura exterior do imóvel, uma casa senhorial dos finais do século XIX, com vários apontamentos Arte Nova, cria, desde logo, expectativas bem elevadas, que não saem goradas assim que entramos pelo edifício adentro. Logo à entrada, os corrimões em ferro forjado e os tectos trabalhados anunciam que o charme exibido na fachada da casa não foi esquecido no seu interior. Até porque, reza a história – pelo menos é o que contam os habitantes mais antigos da cidade —, esta antiga habitação da Rua Gustavo Ferreira Pinto Basto, em pleno centro de Aveiro, era palco de “grandes e longas festas, com muito requinte”.
Hoje, vive dias mais tranquilos — foi transformada em hostel — mas o requinte continua a evidenciar-se entre quatro paredes. Deve ser essa a principal razão pela qual a unidade de alojamento que agora ali funciona, e que acaba de abrir, faz questão de exibir — e em duplicado — charme no nome: OC’Salon Charm Hostel & Suites, sendo que OC é a sigla de Our Charm.
A reabilitação deste antigo imóvel tentou manter a casa o mais próximo do original. As paredes, as madeiras, os painéis de azulejos antigos, o quadro eléctrico e até mesmo alguns dos objectos de decoração que já se encontravam no edifício foram recuperados. E a outros objectos originários da casa senhorial foram dadas outras funcionalidades. Exemplos? Uma das antigas banheiras da habitação foi transformada em sofá e convida, agora, os hóspedes a usufruírem da vista que é dada a conhecer numa das varandas.
A ideia passou, assim, por manter a essência da casa original e partir dessa mesma condição para idealizar, depois, a decoração. O resultado final, que resulta de um trabalho assumido pelos próprios gestores do espaço, gira em torno da temática das viagens, na certeza de que o mote é dado logo à entrada, na recepção, onde o hóspede é confrontado com um exemplar de uma antiga — e devidamente recuperada — motorizada Casal (verdadeiros clássicos, que eram construídos precisamente no concelho de Aveiro).
Em cada quarto, uma viagem
O convite para partir à descoberta da região passa, depois, para os 11 quartos e suites do OC’Salon. Em cada quarto é proposta uma viagem diferente, começando desde logo pela suite “Bilhete Postal” — precisamente aquela em que a Fugas ficou alojada —, que nos consegue transportar directamente para os palheiros da Costa Nova, essas famosas casas de riscas coloridas existentes na praia com o mesmo nome e que “viajam para todo o mundo em forma de bilhete postal”.
Os palheiros da Costa Nova que surgem, também, fortemente representados no quarto “Amor e uma cabana”, inspirado, como não podia deixar de ser, na imortal balada desse ilustre filho da região de Aveiro, José Cid — a letra de Na cabana junto à praia está estampada numa das paredes da suite. Aliás, importa referir que essa aposta em decorar o branco das paredes interiores com poemas e letras das canções é uma constante em praticamente toda a casa.
Ary dos Santos, Zeca Afonso, Eça de Queirós e até Caetano Veloso (que fez questão de criar uma canção, Menina da Ria, alusiva à cidade de Aveiro), têm os seus nomes e escritos desenhados nesta casa. Na certeza de que numa das paredes encontramos um poema criado propositadamente para esta unidade de alojamento. Uma “prenda” de uma fadista da região (Andreia Alferes) que passará, em breve, a canção.
Homenagem à padroeira e aos moliceiros
Outro dos quartos principais recebe o título da padroeira da cidade, “Santa Joana” - a princesa que renegou à sua condição para viver no convento de Jesus, hoje Museu de Aveiro -, com uma decoração que faz questão de “identificar a simbologia da monarquia” (a coroa desenhada por cima da cama salta à vista).
Os moliceiros, grandes emblemas da cidade da ria, também não foram esquecidos e aparecem em grande destaque nos quartos “Canto da Sereia” (múltiplo) e no “Petinga” (duplo) — tanto um como outro, têm pintadas, numa das paredes, a proa dessas embarcações tradicionais.
E numa terra que já teve grande parte da sua paisagem pintada por montes brancos de sal, não podia deixar de ser feita homenagem à tradição do salgado. O quarto “Sal d’Aveiro” apresenta uma decoração acolhedora, de tons cristalinos, baseada no documento de doação testamentária efectuada pela condessa Mumadona Dias, ao mosteiro de Guimarães em 26 de Janeiro de 959, e na qual consta a referência “Suis terras in Alauario et Salinas” — que é tida como a mais antiga forma que se conhece do topónimo Aveiro.
Ainda que tenham nomes e decorações distintas, todos os quartos têm vários pontos em comum: o espaço considerável (cada um tem uma área entre 35 a 40 metros quadrados) e a casa de banho privativa (com toalhas e amenities básicas).
Um convívio à lareira na Sala Veneza
Por esta época do ano mais dada a temperaturas pouco convidativas, o principal espaço de convívio do OC’Salon Charm Hostel & Suites passa pela sala de estar e de jantar, que foi baptizada com o nome de “Veneza” – afinal de contas, estamos numa cidade de canais, muitas vezes comparada à mítica cidade italiana. A enorme lareira, decorada com azulejos antigos, convida a longos serões entre amigos ou família. Ao lado, na sala de jantar, as mesas estão preparadas para a disputa de jogos de damas ou cartas, na certeza de que, entre as 7 e as 10 horas, as atenções centram-se no serviço de pequeno-almoço (bastante variado e incluído no preço diário das dormidas).
A cozinha, baptizada de “Pão de Açúcar” — a evocar as várias as rotas feitas, entre Aveiro e a Madeira, por caravelas que traziam açúcar em troca de formas (Pão de Açúcar) – é outros dos espaços disponibilizados aos hóspedes do hostel. Nos dias de temperaturas mais amenas a melhor proposta passará, certamente, por aproveitar o Jardim dos Cagaréus e Ceboleiros, nomes populares dados aos habitantes daquelas que eram as duas freguesias da cidade (agora são uma só) — os da Vera Cruz são conhecidos como cagaréus e os da Glória como ceboleiros.
- Nome
- OC’Salon Charm Hostel & Suites
- Local
- Aveiro, São Bernardo, Rua Gustavo Ferreira Pinto Basto, 16
- Telefone
- 234041202
- Website
- http://www.ocsalonhostel.com/