Menos controversos são os enormes bebés que Cerný começou por esculpir para uma galeria de arte em Chicago, em 1995, mas que logo depois quis instalar em espaços públicos de Praga. Em 2001 obteve finalmente luz verde da edilidade para a sua montagem nos pilares da Torre de Televisão de Zizkov (1985-92), inclusive com a aprovação de Vaclav Aulicky, o arquitecto que a desenhou. A instalação era para durar apenas meia dúzia de meses, mas o efeito decorativo apurou-se tão extraordinário conferindo beleza e fantasia à severa torre de 216 metros de altura que se reuniu um consenso para a sua permanência durante pelo menos vinte anos.
São doze bebés, todos com uns robustos 800 kg, negros e em fibra óptica, que gatinham para cima e para baixo, nunca a menos de 100 metros de altura. A grandeza e o contraste das esculturas com a torre metálica torna a sua presença na torre perfeitamente visível a uma distância razoável, mesmo se não se percebem as suas feições, que são as de uma entrada de ventilador. Em qualquer caso, a sugestão de invasão de uma das mais odiadas relíquias da arquitectura comunista por um comando de infantes alienígenas ajuda a explicar a popularidade da intervenção. Popularidade essa que justificou mais recentemente (2008) a instalação de mais três bebés gigantes, desta vez em bronze, no relvado à entrada do museu de arte moderna na ilha de Kempa, um dos espaços de lazer preferidos pelos habitantes da capital checa.
Tudo menos na Galeria Nacional
As silhuetas das esculturas da Galeria Futura (Holeckova, 49) podem ser muito semelhantes como os corpos dos bebés da torre feitos homens mas de pacífico é que já não têm mesmo nada. São dois corpos de gigantes cortados ao meio, só pernas e troncos contorcidos contra a parede, instalados em 2003, por ocasião da abertura da galeria no bairro de Smichov, no jardim nas traseiras do edifício. E de traseiras mesmo se trata, uma vez que ambas as esculturas têm escadas para se aceder ao ânus respectivo. Dão a ver vídeos, uma em que o Presidente da República Checa dá um prato de papa ao director da Galeria Nacional, o outro em que a cena se repete, mas com os papéis trocados.
É o género de ofensa que é intolerável para o poder instituído e que também justifica a ausência de obras de Cerný no sítio em que seria mais lógico encontrá-las: o Palácio Veletrzní (Dukelských hrdin, 47), a divisão da Galeria Nacional dedicada à arte moderna e contemporânea. Em 2000, o polémico artista concorreu ao prémio Chalupecksy, esculpindo dois carros em fibra óptica, pintados de vermelho, que fez questão que fossem pendurados nas paredes do átrio do museu como peças de carne num talho. O director do museu irritou-se com a arrogância e expulsou-o da instituição, o que não impediu Cerný de ganhar o concurso.
No dia da entrega dos prémios montou um piquenique à porta do museu e foi o próprio presidente Vaclav Havel que lá foi entregar-lhe o galardão. Agora os dois carros estão pendurados nas fachadas da Meet Factory, um enorme edifício industrial (Ke sklarne, linha B do metro), antes usado pela companhia de comboios checos e desde 2006 convertido pelo escultor em centro de artes (ateliers, galerias, teatros, estúdios de gravação). O centro precisa ainda de ganhar dinâmica própria, mas o lugar não poderia ser mais bem escolhido para a instalação dos bólides vermelhos de Cerný. É que mesmo ao lado há uma sucata onde antigas carcaças de carros de rally decoram o telhado, à maneira de peças de colecção.