Antes já tínhamos passado pelo jardim da quinta, onde Helena nos proporcionara uma degustação de cheiros: rosmaninho, alecrim, esteva, erva príncipe, hortelã-pimenta e cidreira, entre outras. Mas não se enganem ao pensar que as plantas que o casal Vinagre usa para fazer os seus produtos são cultivadas na quinta. Helena, que deixou a direcção de vendas de uma multinacional para se dedicar de corpo e alma aos Aromas do Valado, explica que a matéria-prima é colhida na natureza, com autorização dos proprietários das terras, que até agradecem a limpeza. E não falta o que colher, em pleno Parque Natural do Tejo Internacional, numa paisagem que, nesta zona, se assemelha à planície alentejana: tons de amarelo pintalgado pelo verde das árvores.
Natureza a solo
Antes da despedida, servem-nos um refrescante chá frio, também feito a partir de ervas autóctones. Mata-se a sede, mas não a fome. As horas foram passando sem avisar e o estômago já começa a exigir recarga. Regressamos ao Ô Hotel Fonte Santa, em Monfortinho, onde estamos instalados, e espera-nos um almoço recheado com pratos da região, com destaque para as carnes. Mas acalmem-se os amantes do peixe, que a tantos quilómetros do mar não falta frescura nem boa confecção.
O serviço é buffet, o que permite a cada um fazer uma ementa à medida do seu paladar. Mas tão boa como a comida é a vista do restaurante, com um fantástico deck plantado sobre a paisagem. No horizonte não há sinais de civilização. Nem casas, nem antenas de telemóvel, nem turbinas eólicas. A natureza, a solo. Sem corantes nem conservantes.
Um nível bem abaixo do terraço fica o ex-líbris do hotel: as piscinas. Gigantes, num arredondado irregular. Nem o almoço nos faz resistir à tentação. Um jardim exuberante, repleto de árvores e plantas em diversidade e quantidade completam o cenário e constituem um convite descarado ao ócio. Ao puro dolce far niente. Numa região árida do interior, este oásis só é possível graças à abundância das águas, cujas propriedades justificaram a criação das Termas de Monfortinho.
Ao fim da tarde calçamos sapatos confortáveis e aproveitamos as temperaturas mais amenas (mesmo assim perto dos 30º) para uma visita pelas redondezas. A pouco mais de uma dúzia de quilómetros chegamos ao primeiro destino: Penha Garcia. Calcorreamos as ruelas estreitas e inclinadas da aldeia e subimos ao seu castelo altaneiro, onde espiolhamos o vale do rio Pônsul. Lá no fundo, as encostas salpicadas por moinhos de água tentam-nos a uma visita mais desprendida, que não conseguimos concretizar. No caminho, compramos o pão típico amassado por Ana Mena e pela mãe Margarida, que deixaram a azáfama de Lisboa para reabrir o forno comunitário da aldeia. E ainda compramos uma marafona — uma boneca de pano feita a partir de uma cruz de madeira — a uma artesã local.
Ficávamos por aqui, a ouvir as histórias de Margarida e das receitas secretas da tia Alice, sentadas numa sombra do largo do pelourinho. Mas o roteiro ainda tem mais uma paragem obrigatória, a mais uma dúzia de quilómetros: Monsanto. Enquanto subimos pelas ruelas íngremes da aldeia, o guia explica-nos que o rótulo de vila mais portuguesa de Portugal se deve a um polémico concurso levado a cabo pelo Estado Novo, nos finais dos anos 30 do século passado. Pretendia-se assim enaltecer a pátria através do seu “glorioso” passado, resguardando-se a nação de “ideias perturbadoras”, que pusessem em causa a unidade nacional. Uma réplica do prémio, um galo de prata, ainda se encontra no topo de uma torre de Monsanto. Não se sabe se foi a polémica sobre a parcialidade dos juízes que ditou o fim do concurso, facto é que a prova acabou por ficar solteira. Isso permitiu amplificar o rótulo de Monsanto, que, marketing à parte, merece bem a visita.