Este é restaurante com rosto e Amândio Rodrigues é mesmo um personagem. É certo que sem ele também ali se poderia ser bem servido. Só que não era bem a mesma coisa. Feições miúdas e bigodes arrebitados, o seu papel vai muito para além de zeloso anfitrião ou mestre-de-cerimónias, até porque este não é, definitivamente, um lugar para socialites. Nem Amândio alguma vez o permitiria. Ali pratica-se um culto: a gastronomia. E ele é, assumidamente, o oficiante.
Marca as regras, as distâncias, põe os vinhos e orienta as escolhas. De tal maneira que à primeira não passamos dos mariscos e da segunda não conseguimos chegar às carnes. Haveremos de voltar. A clientela define-o como "activista gastronómico", "gastroliterário" ou "gastropatriota", nas mensagens que por lá vai deixando e que logo denunciam o ambiente de nostálgico romantismo que se respira. A localização, na principal artéria do centro histórico de Caminha (Rua Direita, na ponta oposta à torre do relógio) remete para momentos históricos e, à primeira vista, o estabelecimento poderá até ser confundido com um antiquário ou loja de alfarrabista, tal é a quantidade de livros, quadros e objectos antigos que por ali habitam, ocupando mesmo em permanência algumas das mesas.
Salta à vista que o proprietário não gosta de ter a sala muito cheia, nem de alterar a sua disposição. É preciso preservar a atmosfera, manter o enquadramento. Tínhamos telefonado a fazer a marcação (é sempre conveniente) para um almoço moderado, em dia de praia. "Preparo aí umas coisas", disse Amândio, que à chegada tinha a mesa composta com um generoso balde de gelo onde acondicionou alguns vinhos brancos de catálogo: Alvarinho Soalheiro, Corga da Chã, Brunheda e Redoma Reserva 2007, além de um espumante de Alvarinho ainda sem rótulo. Tudo do melhor.
A mesa compôs-se depois com pratinhos com rodelas de chouriço de Barrancos, fatias de presunto (do Alto Minho, de cura artesanal), um queijo da serra (de Seia, muito bom e em tamanho reduzido) e saladinhas, de bacalhau, de feijão fradinho e de grão. Tudo com os sabores da aldeia e a memória de outros tempos, acentuados ainda pelas fatias de broa de centeio. O bacalhau estava mesmo um primor: desfiado à mão, cebolinha e salsa picadas, uns pozinhos de pimenta e um fio de azeite. Um regalo!
Primorosos também os peixinhos da horta e a pataniscas (minis) que se seguiram, tudo sem quaisquer resquícios do óleo da fritura. Como prato principal dois enormes lagostins azuis, daqueles que nem sempre se encontram e só por si fazem a felicidade de qualquer mesa. Cozidos, simplesmente, para que tudo se guarde e nada se estrague, e que entram ainda vivos na água em ebulição. Um achado, que só por si mais que justificava a jornada.
Faltavam os pratos mais cozinhados e houve, então, que voltar ao Amândio. O mesmo telefonema, a mesma conversa. Também o mesmo espumante (delicioso), desta vez na companhia de três travessas: percebes (que não eram do melhor), caranguejos ecamarãozinho da costa impecáveis. Água, fervura e sabor a mar, sem qualquer complicação de sal ou outros acrescentos tão habituais quanto dispensáveis. Provaram-se também umas amêijoas bem saborosas (equilíbrio entre cebola e coentro), mas o melhor estava mesmo para vir.
- Nome
- Amândio
- Local
- Caminha, Caminha, Rua Direita, 129
- Telefone
- 258921177
- Horarios
- Todos os dias das 12:00 às 15:00 e das 19:00 às 23:00
- Preço
- 30€
- Cozinha
- Trad. Portuguesa
- Espaço para fumadores
- Não