Fugas - Viagens

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O festival dos homens nus

Por Sousa Ribeiro

Todos os anos, no terceiro sábado do mês de Fevereiro, quando o frio chega em força, Okayama acolhe um evento que tem tanto de original como de bizarro mas no qual os participantes a nada mais aspiram do que a um pouco de sorte, a um ano de felicidade.

- Em duas palavras, apenas? Não é fácil. Bem...

Aya Inoue afaga o cabelo como se, com aquele gesto espontâneo, procurasse avivar na memória as recordações e encontrar resposta para a minha questão.

Sorri mas parece ter medo das palavras que lhe possam assomar aos lábios pintados de um vermelho carregado.

- Excitante e único. Mesmo quem fica de fora, limitando-se a observar, vive numa permanente excitação.

Aya Inoue já assistiu por duas vezes ao Saidaiji Eyo, o festival dos homens nus que todos os anos, no terceiro fim-de-semana de Fevereiro, agita a habitualmente serena cidade de Okayama. Escutando a jovem japonesa, enquanto fito os seus olhos brilhantes, imagino já, na antecâmara do espectáculo, o tumulto. Mas faltam umas horas para, como deduzo do arrebatamento de Aya Inoue, se atingir o verdadeiro clímax de um dia cheio de emoções para todas as idades. Outras manifestações culturais vão prender ainda os olhares, começando com a participação das crianças em programas com nomes tão exóticos como Shounen Hadaka Matsuri, Mochi Nage, Gofukuzutsu Soudatsu e Houzutsu Soudatsu, na verdade torneios que, de forma original, envolvem bolos de arroz e tesouros cilíndricos. 

- Vamos então?

Como que contagiado por aquele entusiasmo pueril, acompanho Aya Inoue até à estação de Okayama e, uns minutos mais tarde, chegamos a Saidaiji. A rua, sob um céu com algumas nuvens cinzentas e carregadas, conhece já algum movimento. A pé, cumprimos a última etapa, não mais de dez minutos, até ao templo homónimo e ainda a tempo de presenciar, no meio da euforia organizada, tão característica dos japoneses, os momentos que exacerbam a inquietude dos espectadores – o Hounou Embu, com  performances de grupos femininos de dança universitários e de clubes locais, logo seguido do Eyo Dayko, em que mulheres, tocando em tambores cor de vinho, procuram elevar a moral dos participantes e apelam aos deuses para que os protejam.

- Agora tens de te focar naquele lado.

À excepção de algumas luzes, quando me viro, de acordo com a indicação de Aya Inoue, pouco mais perscruto do que a penumbra. A japonesa, bem-humorada, ri-se.

- Tens de esperar. Aqui bem perto corre o rio Yoshii e, por cima dele, o céu será iluminado por uma sessão de fogo-de-artifício.

Entre o final do espectáculo de luz e cor, que se prolonga por cerca de trinta minutos, e o início do Saidaiji Eyo ainda é necessário aguardar umas boas horas, como se aquele hiato existisse para perturbar ainda mais os espíritos sobressaltados do povo. Aya Inoue aproveita esse tempo para me fazer perguntas sobre Portugal mas também para me fornecer dicas sobre locais a visitar quando o pano cair sobre o festival. E eu, cheio de vontade de os ver, com a sede de viajar que só pode ser comparada à de um camelo após a travessia de uma grande extensão do deserto, sinto que se redobra a minha ansiedade – a hora do festival que não chega e o foco já em nomes como os jardins Korakuen, o castelo, que é o símbolo da cidade, mais um outro, o de Bitchu-Matsuyama, a pouco mais de uma hora de Okayama.

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