Aliás, tanto Carlos do Carmo cresceu entre estas quatro paredes como Pedro Ramos também, que já na adolescência por aqui andava a trabalhar. "Mantém-se este fado de ser um negócio familiar". Antes, era habitual as casas pertencerem ou estarem ligadas a um artista. Agora, contam-se pelos dedos os espaços com tais características. "Acontecia muitas vezes que os fadistas tinham todas as qualidades para terem uma casa, menos a da gestão, e nem sempre corria bem...", diz Pedro.
Mas o Faia, outro grande refúgio de turistas ("temos 20 a 30 por cento de clientes portugueses") é, na verdade, uma casa marcada por presenças quase permanentes e contínuas, como António Rocha ou Anita Guerreiro e, particularmente, Lenita Gentil, voz poderosa - "canto com o corpo todo" - , duas décadas aqui: "Faço diariamente um espectáculo de uns 45 minutos", "é um grande esforço", diz-nos a artista, rouca porque o frio e o cansaço não perdoam, após um show mais curto que o habitual e ter assinado alguns CD comprados por turistas conquistados. "Acabei de assinar dois CD a um casal polaco, falámos um bocadinho, até agradeci em polaco, é assim".
A sessão não é só fadista, até porque a estrela gosta de diversificar, passando por todos géneros populares. Entre o fado clássico de António Rocha, o rei do fado menor, a garra de Anita Guerreiro, que passa de um fado sentido a uma "coisinha mais alegre" e a pujança de Lenita Gentil, o auditório fica conquistado e até nós não resistimos a um "lalala".
Com uma grande e repleta sala, decorada a grandes painéis de azulejos de referências lusas, entre pescadores e Santo António ou a natural homenagem a Lucília do Carmo, mais um pequeno lounge-bar e um bar independente para quem se cansa dos fados, o Faia é a opção clássica para quem procura o fado entretido. Até porque "aqui come-se muito bem", garante Anita, 57 anos de espectáculos. "Se as pessoas forem mal servidas, não adianta dar-lhes boas cantigas que não voltam a sítio nenhum". "Tentamos que a oferta seja de alto nível, elenco, gastronomia, serviço, ambiente, para acabar com aquela coisa que as casas de fado carregam de que se come mal nos fados e não tem que ser assim", remata Pedro Ramos, salientando: "Na última edição do Lisboa à Prova até fomos finalistas, o que foi uma primeira vez para uma casa de fados."
Fado da Lapa e Madragoa
Para os lados da Lapa, há mais de 35 anos que uma casa faz correr rios de fado e faz história. O Senhor Vinho, de Maria da Fé e José Luís Gordo, uma sala familiar e aprumada, é uma referência para portugueses e turistas, decorada a memórias da carreira e referências fadistas. A casa é marcada por Maria da Fé, confessa "perfeccionista" mas que não integra o elenco regular: "Canto quando me apetece, quando acho que devo cantar", diz, até porque é afamada por apresentar elencos fortes e vozes seguras, dando espaço a nomes que marcam rumos do fado (Aldina Duarte, António Zambujo) ou vozes prometedoras.
Os fadistas aguardam o seu momento num espaço recolhido. "É uma escola", diz a fadista, com mais de meio século de carreira, e "é muito gratificante para mim ver as pessoas crescerem e darem frutos".
"Nunca quis ser só eu, o Senhor Vinho foi sempre uma casa com um elenco grande, com grandes nomes" (e aqui entra o detalhe: "Eu e o meu marido descobrimos a Mariza e aqui é que ela começou profissionalmente").