Sem esqui, com spa e alguma cidra
Nada fazia prever o cenário de sexta-feira de manhã. Chuviscos gelados saúdam-nos; e nós equipados para o esqui. A neve continua a amontoar-se em jardins, telhados, carros, mas nas estradas e passeios deixou de ser a visão fofa e branca e passou a ser uma mistura de bloco de gelo negro com lama “granizada”. Sim, não é fácil viver com neve quando esta deixa de ser “perfeita”. Ao pequeno-almoço, dizem-nos que as condições atmosféricas “à l’haut” não estão melhores, fala-se em nevoeiro. “Mas as pistas estão abertas?”, insistimos. “Algumas, mas não sabemos por quanto tempo.”
Não obstante, já com o forfait no bolso certo para evitar complicações, seguimos Manu, com o seu casaco cor-de-laranja e gorro por cima do cabelo revolto, até ao teleférico. Vamos tentar. Connosco vão muitos jovens, preparados para um dia nas pistas. Nós chegamos pela primeira vez à estância, 1700 metros de altitude no Pla D’Adet, e somos recebidos por uma mistura pouco agradável: a chuva vem com nevoeiro e vento cortante, as ruas da zona comercial e residencial estão intransitáveis e há lama e gelo.
Estamos na zona de iniciantes por excelência, onde as escolas de esqui se concentram e a pista quase sem desnível está cheia de crianças em grupos a dar os primeiros passos em cima de esquis — foi uma área recentemente renovada, que reforça a aposta da estância em acolher famílias com crianças; possui, aliás, o rótulo “Família Mais Montanha”.
Aqui, deste pequeno planalto, abre-se um vale onde pistas verdes já se cruzam com azuis, há esquiadores a subir nos “agarra-rabos” e nas telecadeiras enquanto outros ziguezagueiam pelas pistas que a certa altura são engolidas pelo nevoeiro. Na outra ponta, a telecabina sobe e desce para a vila e é apenas esta porção de pistas que está aberta — o que significa que cerca de mais de 80 por cento do domínio esquiável está fechado, à espera de melhores dias.
O nosso plano era esquiar um pouco e conhecer a estância, levados pelos meios mecânicos; inclusive almoçar num dos restaurantes de altitude (há três). O nosso plano aborta. Não teremos oportunidade de ver mais do que já estamos a ver, o Pla D’Adet (Saint-Lary 1700), uma das três secções da estância — as outras são o Espiaube (Saint-Lary 1900) e Saint-Lary 2400 — que, juntas, oferecem cem quilómetros de pistas em 700 hectares, mesmo às portas do Parque Nacional dos Pirenéus e da reserva natural do Néouvielle.
É o proverbial morrer na praia, pensamos, quando voltamos costas às alturas sem conhecer quase nada da estância (ver caixa). Baixamos em telecabina, um silêncio quase espectral perante o cenário branco pintalgado de árvores “queimadas” pelo Inverno que sobrevoamos. Mais um passeio pelas ruas de Saint Lary, chocolate e vinho quente e incredulidade perante o que está a acontecer.
“O ano passado”, conta Christian Portello, o director de turismo de Saint-Lary, “foi o melhor de sempre”. “Tivemos 500 mil esquiadores” (aqui leia-se: entradas, forfaits diários). “E este ano já subimos mais 40 por cento”, aponta, mesmo se ainda não chegamos a Fevereiro, mês de férias escolares em França, que o ano passado trouxe 15 mil entradas por dia.