Fugas - Viagens

  • Diogo Baptista
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Coimbra de A-a-Z

É um caso de esquizofrenia o que se vive em redor da Sé Velha de Coimbra e é ela quem perde. Estamos a meio caminho entre a Baixa e a universidade quando se abre o largo irregular, de inclinação acentuada e casario apertado. A Sé-Velha, que tenta respirar no meio, é uma igreja-fortaleza quase puramente românica, onde não faltam ameias na fachada que deixa desmaiar a severidade nos três arcos perfeitos a enquadrar um janelão. No exterior, vale  pena observar as traseiras, com a abside principal enquadrada pela torre-lanterna, mas é o alçado norte que guarda o “tesouro”, a Porta Especiosa, que foi adossada à romântica transformando-a numa obra-prima da Renascença em Portugal. No interior, o maior deslumbramento também vem de uma capela renascentista, em pedra de Ançã. Dizem que é a catedral mais portuguesa de Portugal porque acompanha toda a vida da nação, mas é sobretudo guardiã de um caótico parque de estacionamento durante o dia, e de uma vida nocturna desbragada – esta é zona de convívio etílico, alimentado com bares que são réplicas no modelo: televisão a passar desporto, cerveja, baldes de vodka anunciados a preços baratos. Por estes dias a pergunta que mais se ouve é: “Vocês são de que curso?” A noite faz-se na rua e faz-se (aparentemente) o que se quer.

Alguns crêem que durante o século XX se perpetrou o maior atentado urbanístico em Coimbra e dele resultou a diluição do conceito de Alta. Foi da Alta, muralhada, que houve cidade, entre ruelas que trepavam até ao castelo. A população começou a viver fora desta área, na Baixa, e só quando em 1537 aqui foi instalada definitivamente a universidade – no Paço da Alcáçova – a Alta recuperou importância: a degradação anterior deu lugar ao renascimento com a construção de colégios e a instalação de ordens religiosas. E, em traços largos, a Alta passou a ser domínio de estudantes e lentes, a Baixa de todos os outros: nesses tempos, desta divisão informal, nasceram muitas das tradições que ainda hoje preenchem o imaginário estudantil de Coimbra. Até que, na década de 40 do século XX, parte importante da herança de séculos de ocupação, a “velha Alta”, poderíamos dizer, foi arrasada para a construção de novos edifícios que concentraram a cidade universitária tal como a conhecemos – e que se reflectem na sua grandeza ao estilo Estado Novo, sobretudo na rua Nova, que une a praça D. Dinis à Porta Férrea. Claro que nas décadas entretanto decorridas, a cidade universitária já se expandiu (muito) mais, com pólos em vários pontos de Coimbra – e o conceito de Alta cada vez mais diluído.

É o ar do tempo que aqui se respira. Chegamos pouco antes do início da Matiné, marcado para as 18h: o relvado ainda está praticamente deserto; na cozinha, o postigo está aberto e preparam-se petiscos; em pouco chegará o DJ (Chico, dos Wraygunn) e começará a montar-se a mesa de som – todos os voluntários são bem-vindos para carregar a aparelhagem de uma das salas de exposição (hoje também é a finissage da mostra “69 Happy Cocks”) para a mesa baixa tutelada por um cadeirão algo barroco donde haverá música. E mais tarde começarão a chegar os vendedores de hortícolas biológicos frescos e artesanato. Não é o dia-a-dia desta Casa das Artes da Fundação Bissaya Barreto (a mesma que detém o Portugal dos Pequenitos, um clássico de Coimbra), são as sextas-feiras, o final da semana de trabalho, um dos momentos mais óbvios de abertura à cidade.

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