Não é grande, a carruagem — 12 lugares sentados, mais 13 em pé (e possibilidade de transportar cadeiras de rodas, carrinhos de rodas e até bicicletas) — e parece que estamos numa qualquer carruagem de metro, salvas as distâncias de tamanho (dizem-nos, da Câmara Municipal de Viana do Castelo, que é o mais moderno de Portugal). Olhos no caminho, por enquanto no que se ergue diante nós: o desnível é de 160 metros (o maior do país), com uma inclinação média de 25%. Os primeiros metros são feitos entre prédios e casario, passamos sob duas pontes e parece que é só floresta à nossa volta — é, pelo menos, dominante a vegetação coroada pelo topo do Santuário de Santa Luzia, uma imagem com reminiscências românticas. Olhando em sentido contrário ao nosso movimento, para baixo, portanto, é a cidade que se começa a agigantar à medida que subimos: o centro histórico alvo, o rio Lima, o porto. A meio do percurso, um “cruzamento” obrigatório, já que há uma linha única e as carruagens funcionam em contrapeso, o que significa que a que desce ajuda a puxar a que sobe. De resto, o funcionamento é automático, movido a energia eléctrica, com operador – e aqui ficam alguns dados técnicos: é o funicular mais seguro do país, com um processo de energia de socorro com motor diesel para o movimento e baterias para os sistemas eléctricos, possuindo um sistema de travagem no grupo motriz (normal – eléctrico –, de serviço e de emergência – hidráulico) e um sistema de travagem nos veículos (dois freios de via hidráulicos).
Cerca de 650 metros e sete minutos depois do início, a nossa viagem termina. A desaceleração é evidente nos derradeiros metros, vista para uma antiga carruagem, esbranquiçada, abandonada ao lado da estação: se a velocidade nominal é de dois metros por segundo, e nunca a parecemos ter alcançado, aqui a diferença é tal que o ruído do funcionamento da carruagem se transforma em silêncio total. A sala da estação do funicular aqui é maior e mais como uma sala de espera, com filas de cadeiras modernas e a cabina do cobrador: funcionou aqui uma loja de souvenirs e de exposições da última concessionária do funicular antes de este ter passado para o domínio da autarquia, deixando de estar sob a alçada da Refer.
Deixando a estação com a sua fachada de azulejos verdes para trás, o que se ergue diante de nós é o santuário de Santa Luzia, volume imponente na forma, na decoração, no alcance da sua vista, qual farol em terra de marinheiros — ainda que já não se ouçam as marteladas no estaleiro naval, como nota tristemente Sérgio, um dos fotógrafos à la minute de serviço no ex-líbris de Viana; se se ouvissem, ele estaria ali, aponta, “a construir barcos”, naquele que foi o seu local de trabalho durante 35 anos. “Nunca pensei vir para aqui tirar fotos.” Veio há um ano, substituir o sogro; a única concorrência é o seu tio, que há 69 anos faz deste miradouro o seu escritório. Estão cada um do seu lado da escadaria final, abrigados por monumentais colunas que as flanqueiam — foi projectada apenas uma, como “base” para uma estátua ao Sagrado Coração de Jesus, no entanto esta revelou-se ineficaz para o efeito — e em breve hão-de servir de mesa e cadeira a uma visita escolar. E, claro, Sérgio vai ser mais fotografado do que fotografa, como já havia dito. São mais os portugueses e os brasileiros que querem as suas fotos, alguns espanhóis também, chineses é que de maneira alguma. A maioria dos visitantes chega em excursões, carrinhas de nove pessoas, muitas, “vê-se que vêm do Porto fazer visitas de um dia”. Não sabemos se Betty Faria ou Glória Pires, algumas das celebridades fotografadas pela sua máquina, chegaram de funicular, mas ele lembra-se de este ser “muito antiguinho”. “A outra empresa deixou-o deteriorar-se, a câmara pegou e está muito melhor.”