Fugas - Motores

Chevrolet Corvette, o velhinho moderno

Por João Palma

Sessenta anos e sempre a bombar. O Chevrolet Corvette atingiu em Julho passado uma idade avançada, mas conserva o sangue na guelra da infância. Hoje, o mítico superdesportivo tornou-se um ícone que é parte integrante da cultura americana.

Os puristas europeus que gostam de grandes bombas torcem o nariz ao Corvette. Para eles, um superdesportivo é algo como um Ferrari, que só serve para correr em pista ou exibir em percursos curtos. Sim, porque fazer uma viagem mais longa num Ferrari requer tampões nos ouvidos para suportar o barulho do motor e sessões de fisioterapia após a tareia causada por uma suspensão duríssima. Por isso, um carro que até pode ser conduzido por uma senhora de provecta idade não se enquadra nos seus cânones.

O facto é que, nos EUA, o modelo com o emblema das bandeirinhas cruzadas goza de tanto prestígio como o do cavallino rampante. Será que isso se deve a um certo chauvinismo ou falta de gosto dos americanos? É capaz de não ser verdade. O facto é que, sete gerações volvidas e 1,5 milhões de carros vendidos, o Corvette continua a gozar de prestígio e popularidade no continente americano, sendo o carro de estrelas de cinema, músicos e até de astronautas, a quem, nos anos 60 do século passado, eram disponibilizados Corvettes novinhos em folha, que podiam comprar como usados depois de fazerem 5000km com eles. Entre os astronautas, destaque para Alan Shepard, um fã do Corvette, que conduziu modelos de pré-produção e até teve direito a uma versão especial personalizada.

O Corvette é o automóvel de passageiros há mais tempo em produção contínua no mundo. Considerando todos os segmentos, é outro modelo da Chevrolet, o grande SUV Suburban já descrito aqui na Fugas, quem leva a taça. Os primeiros Corvette de 1953 eram brancos com os interiores a vermelho e vinham dotados de um motor de seis cilindros. Só a partir de 1956 é que o superdesportivo americano passou a vir equipado com um motor V8, que, nas suas diversas versões, passou a constituir a motorização exclusiva do Corvette. Outra característica deste carro é a caixa manual de sete velocidades, que foi melhorada para, através de sensores, antecipar as mudanças de velocidade, tornando as transições mais suaves. Em opção, há uma caixa automática de seis relações. O actual Corvette retomou a clássica designação Stingray que tinha sido abandonada em 1976.

No desporto automóvel, o Corvette tem um extenso palmarés nas corridas de endurance da categoria GT, com vitórias nas 24 Horas de Le Mans, 24 Horas de Daytona, 12 Horas de Sebring e nas American Le Mans Series. E já por uma dúzia de vezes foi escolhido como pace car nas 500 Milhas de Indianápolis.

O que faz do Corvette um superdesportivo diferente dos europeus é a sua versatilidade, que o torna uma espécie de “carro-camaleão”. Com uma configuração de 2+2 lugares e uma mala de 634 litros no coupé e de 295 litros no descapotável (que se reduzem a 144 litros com a capota em baixo), está preparado, em especial no coupé, para levar a bagagem necessária para longas viagens. Depois, na sequência de uma tradição que já vem das anteriores gerações, o Corvette Stingray Coupé 2014 apresenta cinco modos de condução: Weather (com mau tempo), Eco (condução económica), Tour (o modo standard), Sport (para condução desportiva em estrada) e Track (para condução em pista). Na prática, cinco carros com comportamento distinto num só. No modo Eco, por exemplo, apresenta médias de cerca de 9,0 l/100km em auto-estrada (média oficial, 13,6 l/100km), graças a desligar 4 dos 8 cilindros do motor 6.2 V8, quando estes não são necessários.

Na condução urbana, as suas dimensões, a brecagem e a menor altura ao solo colocam-no em desvantagem face a um citadino, mormente quando se trata de estacionar o monstro, mas comparado com outros superdesportivos não fica nada atrás. Já nos modos Sport e Track, em especial neste último (com launch control e afinações para correr em pista), o Corvette transforma-se num bicho que acelera dos 0 aos 100km/h em 4 segundos e atinge velocidades bem acima dos 300 km/h, pondo em evidência os 466cv de potência e os 630 Nm de binário.

É talvez esta versatilidade que faz com que 82% dos possuidores de um Corvette nos EUA tenham entre 40 e 69 anos de idade — pessoas que privilegiam a racionalidade face ao impulso e apreciam a combinação de performance e funcionalidade proporcionadas pelo superdesportivo americano. É certo que, face aos modelos italianos, o Corvette perde em termos de performance e de design (embora esteja longe de ser um carro feio, bem pelo contrário), mas nos outros aspectos o carro americano ganha de goleada.

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