Fugas - Motores

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Uma R de corrida no confortável corpo de uma trail

Por Nuno Ferreira Santos

Pegue-se nas prestações de uma moto de estrada, junte-se um quadro, ciclista e posição confortável de uma trail, shake it, e temos um belo cocktail.

As motos de trail foram pensadas para longas provas de enduro, ao género de um Paris-Dakar. E para serem robustas e suportarem a dureza de tais desafios, eram motores de cilindradas (750cc) superiores às motos de motocross, com depósitos de boas capacidades mas, consequentemente, mais pesadas.

Com o tempo e o desenvolvimento dos motores, blocos mais pequenos começaram a prestar garantias para as mesmas competições e as motos de trail foram perdendo terreno, obrigando a sua sobrevivência a um repensar das suas funcionalidades para que conseguissem dar outras soluções e assim conquistarem novos mercados. Surgiram então as maxi trail: motos com capacidades de todo-o-terreno, mas servidas por motores de cilindradas superiores que poderiam funcionar na perfeição em longas viagens de estrada.

A posição de condução confortável e a capacidade de carga com motores para velocidades cruzeiro superiores fez com que a procura pelas maxi trail tenha criado um mercado grande. Ainda assim, até aqui, as motos de trail ou maxi trail continuavam a manter algumas características: rodas grandes à frente, sobretudo motores bicilíndricos sem gigantes potências mas com grandes binários, com a funcionalidade de estrada e alguns passeios fora de estrada. A Yamaha TDM 850 (1991) terá sido das primeiras motos maxi trail a pensar numa utilização somente estradista.

Porém, não chegava. E, como acontece hoje no mercado automóvel, no sector das motos as transformações foram sendo introduzidas ao encontro dos desejos dos clientes. Nos automóveis, esses exemplos passam pelos pequenos SUV, carros que assentam em plataformas de utilitários ou familiares, sem pretensões off-road, mas que se destacam por serem mais versáteis e por uma maior altura ao solo, imprimindo uma aura aventureira sem beliscar o conforto do dia-a-dia. Já nas motos, a mais recente incursão por estes meandros surge com a BMW S 1000 XR, com o motor de uma desportiva a dar vida ao corpo confortável de uma trail, juntando assim o melhor dos mundos. Fomos experimentar este cocktail, sendo de sublinhar que o modelo experimentado vinha com full extra de equipamentos.

De design agressivo, que não a deixa passar despercebida, esta trail com um motor de quatro cilindros em linha, rotativo e potente, é uma agradável experiência em estrada. Mas temos de pensar que a S 1000 XR não é mais que isso: uma confortável moto de estrada. Mesmo tendo em conta que os seus 160cv às 11.000rpm compensam bem o menor binário a baixas rotações relativamente às motos de trail.

Com uma ciclística muito agradável, que dá uma segurança e uma facilidade incrível de condução, aliada a um grande conforto, há apenas a referir que o guiador poderia estar um pouco mais subido e as peseiras uns poucos centímetros à frente. O centro de gravidade da moto está bem distribuído e faz com que os 228kg com depósito cheio pareçam bastante leves. Além disso, devido a uma ampla brecagem, permite uma maneabilidade de manobras acentuada e útil. Com uma condução segura, transmite confiança mesmo a velocidades um pouco mais altas que o costume para uma moto de trail. O amortecedor de direcção ajuda muito a, em auto-estrada, por exemplo, não ter receio de fazer curvas sem se desenrolar o punho do acelerador.

Ao contrário das motos de trail, com rodas grandes à frente para melhor ultrapassar obstáculos, a BMW S 1000 XR vem equipada da mesma forma que as motos de estrada, apresentando rodas à frente e atrás de jantes em alumínio fundido de 17” e pneus de estrada. Equipada com potentes travões, na roda dianteira de 265mm com pinças de quatro pistons e atrás de um disco de 265mm com pinça de dois pistons, o sistema BMW Motorrad Race ABS pode ser desligado.

Opcional é o ABS Pro, que dará mais segurança a travar em curva. As suspensões com vários ajustes, mas com menores cursos relativamente às motos de trail, em terreno mais acidentado e em batidas secas, são um pouquinho duras. Mas lá está: não se pode ter tudo.

Um ponto alto da BMW S 1000 XR é a transmissão, de seis velocidades, bastante precisa e apoiada pelo sistema quick shift (veio de sincronização com engrenagem de dentes direitos) que permite mudar de mudança sem ter de apertar a embraiagem ou desacelerar. O sistema corta a ignição, fazendo com que a mudança de caixa seja feita mais rapidamente e com menor quebra na rotação num comportamento mais desportivo. Já numa condução de turismo, beneficiamos desta caixa pelo conforto e despreocupação com a embraiagem. Paralelamente, o cruise control (opcional) dá jeito para conseguir estabilizar a moto numa velocidade constante, o que a 90 km/h permite-nos conseguir cumprir os 5,4 l/100km. Sem aquele sistema será difícil cavalgar em tal monotonia e o depósito de 20 litros vai parecer sempre pequeno, obrigando a visitas regulares à bomba de gasolina. É que a alma do rotativo motor a ouvir-se sair pelo escape empolga-nos e resulta sempre nisto: rodar mais um pouco o pulso direito.

Resumindo, a BMW S 1000 XR é moto para ter boas, longas e escaldantes aventuras. Não sendo uma moto leve e pequena, pode ser a moto colega desembaraçada para os trajectos do dia-a-dia na cidade; pode ser a amante que nos leva a um passeio de curvas e rectas onde queremos sentir o seu poder, a força de travagem e a segurança em curva que nos fará sentir o sangue a correr mais depressa; pode também ser a companheira confortável de longas viagens estrada fora, onde poderemos esquecer as fronteiras e conhecer o mundo.

Enfim, é uma moto que pode assumir vários e distintos papéis e que nos fará sentir felizes em diferentes situações.

Um empecilho?

O modelo que ensaiámos vinha equipado somente com malas laterais, um opcional de mais de 700€ e que permite guardar dois capacetes. Mas o volume exagerado da moto com essas malas laterais faz com que nos pareça muito mais racional a utilização de uma mala top case numa condução de dia-a-dia. Tal traduz-se numa maior facilidade de utilização, além de contribuir para a segurança e conforto de um passageiro. As malas laterais poderão ficar reservadas para grandes viagens.

Fraca visibilidade

Os espelhos pecam pelo tamanho reduzido e por, a partir de uma certa rotação, serem sensíveis à trepidação, fazendo com que a interpretação da imagem reflectida pelos mesmos não seja imediata. As protecções das mãos também poderiam ser um pouco maiores. Já os manómetros são muito completos para o elevado conjunto de informações da moto — velocímetro, caixa de velocidades, modo de condução escolhido, quilómetragem total, temperatura do motor, nível do depósito de combustível, autonomia restante, quilometragens parciais da viagem, consumo médio, velocidade média, relógio... Destaque para o forte LED que nos informa quando a rotação entra em zona vermelha.

Bem informado

Além dos completos manómetros, o computador de bordo permite uma ampla individualização da moto. A começar pelo facto de se poder escolher um modo de condução que melhor se adeque às condições externas: Rain, Road, Dynamic e DynamicPro. Tanto o controlo do ABS como dos modos da suspensão vem de origem, com destaque para o ASC (Automatic Stability Control), também de série, que se traduz num controlo de estabilidade que permite acelerações sem nos preocuparmos com a tracção no pavimento. Como opção, podemos ter o sistema de GPS da BMW Motorrad Navigator V com o controlo no punho esquerdo de fácil manuseamento.

Quase perfeito

Prestando uma boa protecção aerodinâmica, que nos permite andar em velocidades altas confortáveis sem grande vento, o vidro da frente pode ser mais ou menos subido, podendo ser calibrado em duas posições distintas. Ainda assim, tal como o guiador, também o vidro poderia ser mais subido um ou dois centímetros, contribuindo para uma posição que se poderia designar de perfeita.

FICHA TÉCNICA*

Motor

Tipo: Motor tetracilíndrico em linha, a 4 tempos com refrigeração líquida, quatro válvulas por cilindro em titânio, duas árvores de cames à cabeça
Diâmetroxcurso: 80mmx49,7mm
Cilindrada: 999 cc
Potência: 160cv às 11.000rpm
Binário: 112 Nm às 9250rpm
Taxa de compressão: 12.0 : 1
Gestão motor: Injecção electrónica
Controlo da emissão de gases: Conversor catalítico de 3 vias com colector de interferência
Sistema eléctrico Alternador: 486 W
Bateria: 12 V / 8 Ah, sem manutenção

Transmissão

Embraiagem: Multidisco banho de óleo, embraiagem deslizante, accionamento mecânico
Caixa de velocidades: Seis vel. com veio de sincronização, com engrenagem de dentes direitos
Transmissão secundária: Corren-te com relação 17/45

Ciclística

Quadro: Dupla trave em composto alumínio com motor autoportante
Suspensão dianteira: Forquilha telescópica invertida com Ø 46mm, afinação da expansão e compressão
Suspensão traseira: Braço osci-lante em alumínio, afinação da expansão
Curso da suspensão dianteira / traseira: 150mm / 140mm
Distância entre eixos: 1548mm
Avanço: 117mm
Ângulo coluna de direcção: 64,5°
Jantes: Alumínio fundido
Jante dianteira: 3,50 x 17”
Jante traseira: 6,00 x 17”
Pneu dianteiro: 120/70 ZR 17
Pneu traseiro: 190/55 ZR 17
Travão dianteiro: Dois discos flutuantes, pinças fixas radiais de quatro êmbolos, diâmetro de 320mm
Travão traseiro: Disco simples, diâmetro de 265mm, pinça flutuante de êmbolo simples
ABS: Race-ABS BMW Motorrad (parcial-integral), pode ser desligado

Prestações

Velocidade máxima: 200 km/h +
Consumo médio: 5,4 l/100km **
Combustível: Gasolina 95-98

Dimensões

Comprimento: 2183mm
Largura (com espelhos): 940mm
Altura (sem espelhos): 1408mm
Altura do banco, peso sem carga: 840mm
Arco interior das pernas, peso sem carga: 1894mm
Peso: 228 kg
Capacidade do depósito: 20 l

Preço: 16.603,38€ (unidade ensaiada, 20.997,78€, com Pack Touring, Pack Comfort, Protecções de mãos, Alarme, Malas Laterais e sistema Navigator V)

** a uma velocidade de 90 km/h
* dados do fabricante

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