Fugas - Motores

Guilherme Marques

O carro que não quer ser Citroën

Por João Palma

“Com que carro andas agora?” “Um DS 4.” “Ah, um Citroën…” “Não. Um DS 4 não é um Citroën!” “Está bem, um Citroën DS 4.” “Não. Agora são marcas distintas do grupo PSA, a DS já não é Citroën!” “Pois, pois…” E o diálogo repete-se até à exaustão…

A Toyota, quando decidiu ter uma marca de luxo no grupo, criou a Lexus. O mesmo fez a Nissan ao instituir a Infinity. Isto é, a partir do zero, foram construindo a imagem desses emblemas. Já a Citroën escolheu outra via para atingir o mesmo fim: pegou na linha DS, que já tinha uma aura de sofisticação, e tornou-a independente. A vantagem é que a DS já tem uma reputação de 60 anos iniciada com o Citroën DS de 1955, o famoso “boca de sapo”. O problema é conseguir separar a DS da “mãe” Citroën.

Tanto a Toyota como a Nissan optaram por “revoluções”, já a Citroën, em 2014, escolheu uma linha de evolução, uma separação tranquila. E a reforçar esse modo de agir, até os primeiros veículos DS independentes da Citroën pouco mais eram que a substituição do emblema do duplo Chevron pelo DS estilizado nos veículos da até então linha DS da Citroën.

Por isso, só aos poucos é que a DS vai ganhando personalidade própria. O DS4 Crossback que agora conduzimos é mais um corte no cordão umbilical. Ainda utiliza a plataforma EMP2 comum a veículos da Citroën (nova plataforma só em 2017), mas no que toca a estilo e a visual já tenta afirmar uma identidade própria. É um crossover em estilo coupé com maior altura ao solo (30mm) que o DS4 “normal” e um ar mais desportivo, como é o caso do carro que conduzimos em tom laranja, com retrovisores, grelha frontal, jantes, spoiler e difusor de ar traseiros em preto. Cromados reforçam o visual premium, como nas duas saídas de escape ligadas entre si por uma barra, nas molduras das janelas e da grelha frontal e nas barras do tejadilho.

Em suma, um crossover de design elegante como foi sempre apanágio dos DS. Não se pense, porém, em grandes aventuras fora do asfalto — a cidade é o seu habitat natural. Quando muito, a sua maior altura ao solo permite-lhe circular por estradões de terra de baixa dificuldade.

A DS pretende distinguir-se da Peugeot e da Citroën afirmando-se como marca premium, com ênfase no design e na qualidade dos materiais utilizados e cuidado nos acabamentos. Isso é evidente tanto no exterior como no interior, mas, no caso do DS4 Crossback que conduzimos, o estilo, por vezes, sobrepõe-se à funcionalidade. Exemplos: as portas traseiras terminam num bico que, num momento de distracção, pode criar algum perigo. O acesso aos bancos traseiros, apesar da maior altura ao solo, não é fácil para pessoas que tenham pouca elasticidade. Os vidros traseiros são fixos, dificultando a circulação do ar, o que pode tornar o ambiente pesado, num dia quente. Aliás, não se compreende bem em que iria afectar o visual o facto de se poder baixar os vidros traseiros.

A posição de condução é boa, a visibilidade e os bancos dianteiros são confortáveis e envolventes. Atrás, o túnel de transmissão restringe o espaço para o passageiro do meio. No carro que conduzimos, o grande pára-brisas (a superfície pode ser reduzida se necessário, graças à parte amovível do tejadilho à frente) acrescenta luminosidade a um ambiente sóbrio mas algo escuro (tejadilho, tablier, forros das portas e tapetes a preto). A instrumentação é simples e completa e o ecrã táctil do sistema de infoentretenimento e navegação é de fácil accionamento. A mala, com 359 litros, tem um formato regular e o acesso é bom. Sob o fundo da mala, encontra-se uma roda sobresselente, o que é sempre positivo.

O motor 1.6 BlueHDI de 120cv cumpre sem problemas a sua missão de deslocar os 1428kg deste DS4 Crossback. A nova caixa automática de seis relações tem um funcionamento competente. O mesmo se aplica ao sistema Start/Stop de paragem e arranque automáticos do motor. Com uma suspensão confortável, na boa tradição francesa, este DS4 Crossback, estando longe de ser um desportivo (apesar de ser um pouco mais vivo em modo Sport), tem um comportamento estável e equilibrado, tanto em recta como em curva.

Se, no geral, as impressões de condução, qualidade, conforto e vida a bordo merecem nota positiva, já a média de consumos verificada num percurso misto de cerca de 400km excedeu bastante os valores oficiais: 6,4 l/100km para uma média anunciada de 4,1 l/100km, o que faz com que o DS4 Crossback não seja propriamente uma referência no que se refere a economia de utilização. E isto quando cerca de 90% dos quilómetros foram feitos em modo Eco e só 10% em modo Sport. É verdade que os consumos reais no dia-a-dia excedem sempre os anunciados por todos os fabricantes de automóveis (sem excepção) para os seus veículos, mas 2,3 l/100km já é uma diferença apreciável.

Ficha Técnica*

Motor: 1560cc, 4 cil., 8v, 1560cc, gasóleo
Potência: 120cv às 3500 rpm
Binário: 300 Nm às 1750 rpm
Veloc. máxima: 190 km/h
Aceleração 0/100 km/h: 11,4s
Consumo médio: 4,1 l/100 km
Emissões CO2: 108 g/km
Preço: 35.515€ (preço-base, 32.615€)

* Dados do construtor

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