O termo não é novo e costuma ser usado no futebol, mas também no mundo dos vinhos tudo indica que vamos ter que nos habituar à palavra coach. Portugal tem já a sua primeira wine business coach e o grande objectivo passa por dinamizar o consumo, ajudando o sector a adoptar uma atitude e estratégia empresarial orientada para mercados e sectores específicos.
Bárbara Sistelo, assim se chama a nossa wine coach, explica com a sua própria experiência profissional aquilo que considera ser a grande lacuna na área da produção e comercialização do vinho: dar atenção e importância ao momento do consumo. “Assistimos a um crescimento enorme na viticultura, temos conhecimento e competência quanto a castas e estudo dos solos, a enologia deu também um enorme salto e com isto temos um produto com capacidade para ser apreciado em todo o mundo, mas falta ainda dar a necessária importância ao momento do consumo”, explica a técnica, que acaba de obter a certificação pela International Coaching Community.
E não é só uma questão de marketing, vendas ou estratégia comercial, já que também nestas áreas há empresas e produtores com forte dinâmica e grande capacidade.
Licenciada em Enologia, foi ainda na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, em Vila Real, com a cadeira de Marketing, que Bárbara descobriu o gosto pela área comercial. A vida profissional iniciou-a na indústria corticeira como técnica comercial — “talvez a primeira mulher a trabalhar nesta área em Portugal”, diz —, passando depois para uma empresa produtora e distribuidora de produtos enológicos, o que lhe proporcionou o contacto com vinhos, produtores, enólogos e adegas, não só em Portugal, mas também em Espanha, França, Itália e Estados Unidos da América.
Do comércio passou à experiência prática na produção com dois anos de trabalho de enologia no Alentejo, na Adega de Redondo, antes de regressar ao Douro para abraçar o projecto empresarial da Vinideias, focado na importação de conhecimento técnico e científico para o sector vitivinícola nacional.
O empenho nas funções técnico-comerciais leva-a a fazer um Master em Gestão Comercial e Marketing e à posterior criação da Flavour Taste, uma empresa que, além de produtos para a comercialização do vinho, aposta no sucesso e valorização de pessoas e empresas ligadas ao sector vitivinícola. É assim que nasce a parceria com o ISAG (Instituto Superior de Gestão e Administração) e a Escola de Negócios Novacaixagalicia para a criação da Pós-Graduação em Gestão Comercial e Marketing de Vinhos, que ainda este mês inicia um novo curso.
O que o vinho nos diz
É no conjunto destas múltiplas experiências e no contacto com os mais diversos agentes e técnicos que Bárbara Sistelo constata que falta a tal ligação com o momento de consumo e perspectiva o papel do coaching. “Temos bons vinhos, muita competência nas áreas da investigação, produção e comércio. Há gente, mas falta coser tudo isto. A produção e o comércio numa estratégia de gestão única e coerente”, avalia, lembrando que “é frequente verem-se os enólogos a serem chamados a vender e os comerciais a falar sobre os vinhos”.
É em jeito de brincadeira que diz que “o que falta é ouvir o vinho, saber o que tem para nos dizer”, mas é precisamente essa a ideia central. Nas formações que tem ministrado por todo o país é este o desafio que lança, ouvindo as pessoas dizerem-lhe que um vinho lhes lembra coisas como a adega, o pomar dos avós, espaços de infância, uma festa de anos ou até os cheiros da vizinha.
“E é essa ligação emocional com o momento de consumo que os técnicos e especialistas tendem a negligenciar”, acentua, chamando a atenção para as estratégias seguidas nos sectores como a moda, cosmética ou o comércio automóvel, “que fazem o consumidor sentir o produto ainda antes de o ter”. Ou seja, são capazes de criar apetência sabendo o que pensam e o que esperam os potenciais clientes daquele produto.
Daí que awine coach pense que o que falta no nosso sector vitivinícola é uma estratégia empresarial orientada para mercados e sectores específicos. “A diferenciação e o posicionamento são importantes, até porque não temos produto para todos”, analisa Bárbara Sistelo, lembrando que é por aí que tem que passar a dinamização do consumo.
Neste aspecto, salienta que, como país, temos até características muito competitivas. “O vinho une os portugueses, toda a gente tem contacto com o vinho, há vinho em todas as regiões e há portugueses espalhados por todo o mundo”, enumera, salientando também que “o produto está feito, já existe, o que falta é ouvir os clientes e trazer para dentro das empresas essa expectativa”.
Uma lógica de equipa que o coaching pode fomentar a partir do potencial dos produtores e dos elementos das suas empresas, fazendo com que o todo se sobreponha à mera soma das partes. “Não basta ter um bom produto e ser um bom vendedor. A enologia e a viticultura são ciências exactas mas as vendas mexem com as pessoas e as suas emoções. É preciso criar um contexto, contar uma história e dar importância ao momento de consumo”, sintetiza.
Em Portugal, a wine coach diz que é preciso começar por ultrapassar a fase do “conscientemente ignorante” e desenvolver a vontade de aprender e explorar o que o sector do vinho tem para nos dar: “Temos o produto, temos as pessoas e o que é preciso é acreditar e perceber que temos a oportunidade de fazer muito mais pelo sector”. Daí que a sua grande ambição seja começar pelas grandes empresas e os líderes institucionais do sector. E não pede muito: “Seis sessões de coaching já seriam um bom impluso”.