Dantes havia carros grandes e carros pequenos. Os maiores exibiam o estatuto dos seus proprietários, os segundos cumpriam a sua missão. Era assim até que alguns carros pequenos começaram a ganhar personalidade e a perseguir os maiores no seu próprio terreno. A revolução estava em marcha. Hoje, até os monovolumes já têm de se cuidar com a concorrência dos mais pequenos. Veja-se o Toyota Verso S: à primeira vista até parece um Yaris, mas, quando o conhecemos, depressa se percebe que as suas ambições são outras.
Um Verso quer ser monovolume, apesar de pequeno; não vira a cara à hipótese de servir de alternativa mais económica às famílias que queiram desistir de um familiar compacto; e encara de frente os desafios da cidade, onde as dimensões exteriores são fundamentais. Como é que um carro pode querer ser grande e pequeno ao mesmo tempo? A resposta é simples: colocando as rodas nos quatro cantos da carroçaria e pondo os engenheiros a "inventar" espaço a bordo.
Porque, antes de mais, é evidente que estamos perante um carrinho tem só menos um centímetro, mas fica aquém da barreira psicológica dos quatro metros. Pode, portanto, afirmar-se como um veículo de cidade. Mas as necessidades da vida moderna exigem que haja múltiplas soluções, mesmo num corpo pequenino. Os pequenos monovolumes vieram preencher este largo nicho de mercado, oferecendo soluções de espaço interior e modularidade que só estávamos habituados a encontrar em viaturas bem mais volumosas.
De caminho, têm de se mostrar mecanicamente evoluídos e proporcionar segurança ao volante sem descurar o conforto dos ocupantes. Uns conseguem melhor do que outros, mas há que dizer que o Verso S leva boa nota neste equilíbrio: é potente q.b., seguro e de comportamento previsível; mas também confortável e de fácil utilização. O motor (nesta motorização 1.4 diesel de 90cv) é bastante interessante, com um binário que chega a ser surpreendente e consumos que andam longe de assustar.
Mas, então, estamos perante um milagre? Não. A suspensão não é brilhante pelo seu conforto ou pela dinâmica que sustenta.
O que impressiona realmente é a capacidade de estabelecer um compromisso perfeito entre estas duas tentações distintas, deixando toda a gente satisfeita. Porque é na capacidade para serem universais que estes modelos assentam o seu apelo.
Em termos mecânicos, a única coisa que deixa algo a desejar é a sensação de que os travões estão pouco disponíveis. Tudo o resto direcção correcta, motor alegre, caixa bem escalonada, suspensão equilibrada está lá. De uma forma que tanto agrada a um condutor do dia-a-dia como a quem viaja lá dentro na qualidade de passageiro.
Por fora, as linhas Toyota costumam dividir opiniões, mas o Verso S parece, ainda assim, capaz de suscitar reacções menos acaloradas do que outros modelos da marca. Uma frente engraçadinha, uma traseira cortada a pique, linha de cintura alta.
E, claro, as rodas nos extremos da plataforma um pormenor que lhe rouba capacidade de manobra, outros dos pontos menos conseguidos do modelo.
Lá dentro, boas notícias, com materiais agradáveis (embora haja alguns que não parecem grande coisa, como o plástico rígido de algumas zonas do tablier) e uma montagem que promete não se deixar bater pelo mau piso das estradas portuguesas. Mas mais importante do que tudo isto é que há bastante espaço. Nos lugares traseiros, conseguiu-se criar uma excelente área para as pernas. A bagageira é grande e tem um espaço muito utilizável por baixo do tapete. Lamentavelmente, esse compartimento deveria conter um pneu suplente...
O condutor está numa posição elevada, como convém num monovolume, mas isso é conseguido à custa de uma posição de condução pouco agradável.
Talvez esse pormenor perca importância com o hábito, mas uma coisa não melhorará com o tempo: a insonorização é bastante má, não só devido ao ruído do motor, mas também ao sopro do vento nos retrovisores laterais.
São prós e contras, como se encontram em todos os modelos.
Neste, como argumento final, há que considerar o elevado nível de equipamento (ecrã táctil, câmara de estacionamento traseira, airbag de joelhos para condutor...).
Apesar de se lamentarem algumas ausências como os sensores de chuva e luminosidade, bem como o tecto panorâmico, não disponível em Portugal fica bem justificado um preço que, por si só, não assusta a concorrência.
Boa soluçãoA caixa não é muito rápida nem um portento de suavidade. Mas esses pergaminhos também não costumam aparecer neste segmento... O que interessa destacar é o bom toque (acabamentos em pele na alavanca) e correcto escalonamento, com as primeiras mudanças mais curtas e as outras longas. É claro que, com o carro carregado (e um motor pequeno), torna-se necessário usar a caixa em recuperações mais exigentes. Não há milagres. A colocação da alavanca num plano sobrelevado marca pontos em termos ergonómicos.
Surpreendente
Sentar três adultos nos bancos traseiros não é coisa que se aconselhe para viagens longas.
Mas encontrar mais de 60cm de espaço para as pernas num pequeno carro como este é francamente surpreendente.
O espaço interior é uma das grandes virtudes deste modelo e ganha ainda contornos mais incríveis quando contabilizamos os 430 litros da bagageira um valor notável, mesmo sabendo que é conseguido à custa da não colocação de pneu suplente.
Desagradável
E é exactamente por causa da boa solução para a caixa que o resto parece mal pensado. O banco está numa posição bastante alta, o que melhora a visibilidade.
Mas o volante, por mais que se regule, anda sempre lá por baixo.
E puxar o travão de mão exige um dinâmico mergulho sobre o braço direito para segurar a alavanca.
A médio prazo, o hábito vencerá estas reticências iniciais, mas será sempre desagradável sentir o volante "entre os joelhos"...
Prático
A noção de monovolume atiranos para um universo de grande modularidade a bordo, mas isso é uma miragem quando falamos de um carro deste tamanho. Neste segmento, o que conta mesmo é a capacidade para simplificar a vida aos utilizadores. E, nesse pormenor, o sistema de rebatimento dos bancos traseiros é exemplar: um manípulo na bagageira e já está. Boa nota também para a preocupação de criar espaços para arrumos um pouco por todo o carro (são 19, ao todo).
Barómetro
+ Espaço a bordo, motor, equipamento, caixa de velocidades, instrumentação, consumos e emissões
- Travões pouco disponíveis, insonorização, posto de condução, manobrabilidade apenas razoável, modularidade limitada