Fugas - Motores

  • E quando 400 ovelhas aparecem...
    E quando 400 ovelhas aparecem... DR/Clube Escape Livre
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    A "estrela" do passeio, o surfista McNamara DR/Clube Escape Livre
  • Uma prova para o condutor que gosta de apreciar paisagens distintas
    Uma prova para o condutor que gosta de apreciar paisagens distintas DR/Clube Escape Livre
  • Um pastor no alto da serra. O detalhe é que este veio do Mali
    Um pastor no alto da serra. O detalhe é que este veio do Mali DR/Clube Escape Livre
  • O passeio foi organizado pelo Clube Escape Livre
    O passeio foi organizado pelo Clube Escape Livre DR/Clube Escape Livre
  • O passeio foi organizado pelo Clube Escape Livre
    O passeio foi organizado pelo Clube Escape Livre DR/Clube Escape Livre

Atracção integral pelo Património da Humanidade

Por Álvaro Vieira

O surfista Garrett McNamara experimentou trocar as ondas da Nazaré pelo sobe e desce das ravinas do Marão, ao volante de um GLK 250 CDI 4MATIC. No alto da serra, os milhares de cavalos da coluna de 42 viaturas foram travados por apenas 400 ovelhas, apascentadas pelo tradicional pastor... do Mali.

Régua e curvas são substantivos que raras vezes coabitam na mesma frase, mas faz todo o sentido juntá-los quando nos referimos ao Mercedes-Benz 4MATIC Experience, Rota do Património da Humanidade, que se pôs em marcha de 18 a 20 de Outubro.

Foi mesmo no Peso da Régua que arrancou este passeio organizado pelo Clube Escape Livre, que, além da denominação comum do Património Mundial, das encostas do Douro Vinhateiro e do centro histórico de Guimarães, se orientou pelo propósito de prestar uma homenagem subtil - uma piscadela de olho cúmplice aos nostálgicos - àquelas edições épicas do rali de Portugal que incluíam classificativas no Marão e Fafe. Também andou por esses bons caminhos este raid reservado a viaturas das gamas ML, G, GL e GLK, equipadas com o sistema de tracção integral 4MATIC da Mercedes-Benz.

Além da estrela de três pontas do símbolo da marca alemã, a caravana de cerca de 42 de viaturas contou com outra estrela: o surfista Garrett McNamara que, ao volante do GLK 250 CDI Bluematic que lhe foi disponibilizado para as suas andanças por Portugal, saiu da Nazaré - patrocínios oblige - onde tem estado nas últimas semanas a tentar bater o seu próprio recorde.

Saiu é como quem diz. O ainda detentor do recorde mundial de 2011, uma onda de 24 metros, que em Janeiro deste ano surfou uma vaga ainda maior - supõe-se que de pelo menos 30 metros, marca que poderá ter sido superada há duas semanas pelo brasileiro Carlos Burel - esteve quase sempre com o pensamento, e o coração, na Nazaré.

Não é que se tenha mostrado distante. Pelo contrário, o surfista norte-americano cativou os mais 120 participantes no raid, gente de diferentes idades e oriunda de vários pontos do país, com a sua simpatia e disponibilidade permanente para autógrafos e fotografias.

Mais habituado a equilibrar-se na prancha, McNamara também lá se foi aguentando entre os casais da comitiva que, à vez, como nas fotografias de casamento, volta e meia faziam fila para posarem com ele. Mas notou-se que Garrett McNamara estava permanentemente atento às notícias sobre a meteorologia e as ondas do canhão da Nazaré e, após o almoço do segundo dia, lá arrancou para a Praia do Norte, para se fazer ao mar logo às 6h de domingo.

Enquanto participou neste Mercedes-Benz 4MATIC Experience, Rota do Património da Humanidade, McNamara deixou claro que o seu conhecimento de Portugal ainda ia pouco além das praias da Nazaré e que o seu elemento era mesmo a água.

Para a posterioridade, desta experiência automobilística o surfista deixou apenas na sua página do Facebook uma fotografia tirada junto aos tonéis de vinho da Quinta de Campanhã, outra da feijoada (de feijocas) servida como entrada ao jantar no Hotel Régua Douro - que o surfista descreve como "a sopa de feijão portuguesa" - e um brevíssimo clip de vídeo, feito já no carro, pelos montes, que não lhe há-de render qualquer prémio de realização cinematográfica, como comentou um dos seus amigos: "Garrett - You need to work on your home movie skills."

Para um vislumbre do que foi o passeio, mais vale espreitar o vídeo da autoria de Renato Guerra, disponível na página de Facebook do Clube Escape Livre e no YouTube.

Esplendor de Outono

O Mercedes-Benz 4MATIC Experience de 2013 começou com a visita e prova de vinhos na Quinta de Campanhã, propriedade adquirida em 1916 pelo Visconde de Alijó. Hoje, a quinta de 27 hectares, que produz cerca de 200 pipas de vinho de mesa por ano, é também uma unidade de enoturismo, do mesmo grupo do Hotel Régua Douro. Nem todos os participantes conseguiram libertar-se dos afazeres na sexta-feira à tarde a tempo de participarem na visita à quinta e de disfrutarem das suas vistas sobre o vale do Douro. Foi mesmo no hotel que funcionou o secretariado da prova, que se realizou o primeiro briefing sobre a utilização do road book e que decorreu o jantar de boas-vindas. Com uma homenagem a... Garrett McNamara, advinhou.

No dia seguinte, a alvorada era às 7h30, porque a partida dos automóveis estava marcada para as 8h30. Convinha deitar cedo, mas ainda havia a visita ao Museu do Douro, instalado desde o final de 2008 na antiga Casa da Real Companhia Velha, e três curiosas exposições para ver: O México fotografado por Luís Buñuel (até 30 de Novembro), que reúne fotografias cuja composição foi emulada em planos dos filmes que o realizador surrealista filmou no seu México de adopção. O grupo viu também a Colecção de Retratos da Santa Casa da Misericórdia da Régua, uma exposição cujo interesse, além de histórico e sociológico, radica no facto de estarmos perante quadros restaurados pelas oficinas do museu, e O Douro de Georges Dussaud, com algumas das belíssimas imagens que o fotógrafo que nasceu francês, em 1934, na Bretanha, mas que se foi tornando cada vez mais português, captou na região a partir de 1980. A exposição de Dussaud é acompanhada pela exibição do documentário ?5 x 5?, produzido pelo Museu do Douro, que tratou de descobrir e entrevistar cinco pessoas retratadas pelo fotógrafo há cerca de 30 anos. E depois de um cálice de vinho do Porto no museu, foi tudo para a cama, que se fazia tarde.

Quando o despertador toca, às 7h15 de um sábado, é natural que os participantes num evento deste género se perguntem onde estavam com a cabeça quando se meteram nisto. Ao fim do dia, porém, já se terão rendido e disponibilizado para testemunhar que, se não fosse assim, se não tivessem atacado a estrada cedo, não haveria tempo para fazer tudo e ver tudo que o dia guardava.

E o que o dia guardava era só uma das paisagens mais belas do mundo: o rio a reflectir o esplendor dos socalcos de vides douradas ou pintadas de vermelho pelo Outono, a altura do ano em que o Douro se apresenta mais exuberante. Era o que o dia guardava e guardado ficou. Faltou o tempero do sol na etapa de ligação da Régua ao alto do Marão. À medida que os carros subiam, já por estradões, iam-se descobrindo cada vez mais imersos nas nuvens baixas. E no frio.

Já muito perto do cume da serra, a 1415 metros de altitude, a caravana foi barrada por um rebanho. Os 42 automóveis, cada um com pelo menos 200 cavalos, foram travados por ovelhas que saíam aos magotes do nevoeiro. "Cerca de quatrocentas", precisou o pastor que assistia à cena de longe, apoiado no cajado. Não era exactamente o pastor que se esperaria encontrar no cimo do Marão, já muito perto do Observatório Astronómico e dos retransmissores de radiotelevisão. Era um homem que estava muito longe do país de origem: a República do Mali. Usava luvas de esqui e trazia a cabeça coberta por um boné branco e envolta num cachecol preto, para se proteger do frio cortante. Num português rudimentar explicou que emigrara há oito anos, muito antes dos conflitos armados que vêm assolando aquele país africano - mais conhecido na Europa, até há bem pouco tempo, pela sua música. E contou que trabalhara na construção civil em Espanha, antes de chegar à serra do Marão.

Dobada a meada das ovelhas, a caravana fez inversão junto ao vértice geodésico e à ermida da Senhora da Serra para logo se deparar com nova surpresa. Um autocarro de excursão despejava praticantes de BTT vindos de Gaia e Matosinhos que se preparavam para fazer a descida, nevoeiro adentro e pelos caminhos de terra, até Amarante. "Normalmente demoramos uma hora e um quarto. Com o tempo assim, vamos precisar para aí de duas horas", disse um deles à Fugas.

A manhã deste Mercedes-Benz 4MATIC Experience também acabou em Amarante, num almoço na Casa da Calçada, hotel de charme da rede Relais & Châteaux. Mas até lá ainda tinha muitos caminhos de terra e pedra a vencer. Após uma paragem para café e bolo na Estalagem do Marão, a caravana voltou retemperada à crista dos montes, atravessando enormes áreas de mata que os incêndios do último Verão consumiram. Aqui e ali atravessaram-se bosques fantasmagóricos de árvores despidas e troncos negros, com a primeira vegetação nascida após o fogo a romper muito verde, no chão escuro e agora húmido. O belo horrível.

Fantasmagóricos, ou menos que isso, são os vestígios que restam da antiga mina de estanho e volfrâmio de Fonte Figueira, desactivada desde os anos 1970. É difícil acreditar que, ao longo de 40 anos, e sobretudo nas décadas de 40 e 60, chegaram a trabalhar nesta mina de sete pisos centenas de pessoas que arrancavam às entranhas da montanha, à força de dinamite, cerca de três toneladas de minério por mês.

Muitos solavancos mais tarde, já em Amarante, visitou-se o Convento e Igreja de São Gonçalo, esse curioso monumento nacional, construído ao longo de 80 anos, entre os séculos XVI e XVII, e que foi sucessivamente incorporando elementos de vários estilos, do renascentista ao austero barroco setecentista, passando pelo maneirismo. Destaque para a Varanda dos Reis, ou Loggia, da fachada lateral, com as estátuas dos quatro reis que patrocinaram a sua construção: D. João III, D. Sebastião, o cardeal D. Henrique e D. Filipe (II de Espanha). No interior, ouviram-se histórias sobre São Gonçalo, a quem se atribuem milagres como o de ter feito jorrar vinho do chão e se reconhece, ainda hoje, uma especial vocação casamenteira, sobretudo no que toca a desencalhar as "senhoras mulheres".

Durante o almoço na Casa da Calçada, a chuva caiu em abundância, o que implicou ligeiras alterações de percurso da parte da tarde, como a anulação de uma íngreme ravina de terra que se havia feito lama. A visita ao que resta do peculiar Castelo de Arnoia também não foi além do respectivo centro de interpretação, onde os participantes na Mercedes-Benz 4MATIC Experience ouviram a lenda dos cristãos que dali expulsaram os mouros que os escravizaram com um ardil. De noite, colocaram badalos ao pescoço de tudo quanto era gado e espalharam archotes pelo sopé do monte. De tal modo que conseguiram pôr os mouros em fuga, convencidos de que vinha ali um grande exército cristão. Diz-se que o castelo oferece uma das melhores vistas do Marão, mas não em dias assim, com um nevoeiro muito adequado às lendas mas pouco amigo dos miradouros.

Na parte da manhã, o raid já tinha percorrido alguns troços do Marão que, num passado já distante, viram passar o rali de Portugal. À tarde, o ponto alto foi mesmo o piso de terra dura do épico troço de Fafe-Lameirinhas, do qual os aficionados, e não só, têm bem presentes as lombas e as fantásticas fotografias dos carros de WRC com as quatro rodas no ar.

Mas estes passeios não são provas de velocidade nem de todo-o-terreno, destinam-se ao condutor comum. E também, convenhamos, não é com automóveis de 57 mil euros para cima, que não foram feitos para essas maluqueiras, que alguém minimamente sensato se vai pôr a testar os limites da perícia e da mecânica.

Assim, todas as máquinas e passageiros chegaram em perfeita forma a Guimarães. A única baixa no pelotão foi mesmo Garrett McNamara e os amigos, que se haviam feito ao asfalto, rumo à Nazaré. O resto do grupo participou na visita guiada ao castelo de Guimarães e recolheu-se à Pousada de Santa Marinha, um mosteiro alterado ao longo dos séculos que foi erigido num local da encosta da Penha que terá servido de morada aos primeiros condes portucalenses. Incluindo a Mumadona Dias, essa figura do século X - anterior à fundação da nacionalidade - tão cara à história de Guimarães. E então, sim: com os participantes no passeio já com um copo do "vinho verde de boas-vindas" na mão, num dos salões da pousada, muito bem aconchegados na "cidade-berço", a chuva que educadamente se foi contendo ao longo do dia pôde, enfim, deixar-se cair, pesadamente.

A última manhã do evento incluiu novos caminhos de terra e visitas aos santuários da Penha, com o seu curioso templo projectado por Marques da Silva, que também foi o arquitecto da sede da Sociedade Martins Sarmento, de Guimarães, e de inúmeros edifícios emblemáticos do Porto, como a Estação de São Bento, o Teatro Nacional de São João ou a Casa de Serralves, entre muitos outros.

Seguiram-se visitas ao templo e museu do Santuário de São Torcato, ao Paço dos Duques de Guimarães e ao centro histórico da cidade, classificado pela UNESCO como Património da Humanidade. Recorde-se, a propósito, que poucos dias depois a Câmara de Guimarães deu início ao processo de candidatura, a submeter à UNESCO, do alargamento da área classificada à zona de Couros, onde algumas das antigas fábricas de curtumes foram reabilitadas e reconvertidas em equipamentos públicos, durante a Capital Europeia da Cultura de 2012.

Como já se percebeu, este tipo de passeios não se destinam a quem gosta apenas de fazer todo-o-terreno ou de acelerar. Quem não é capaz de se entusiasmar com a descoberta de novas paisagens, nem sempre de acesso fácil, com a gastronomia e com a cultura, virá ao engano. Quem gostar de tudo isto, pode sair algo moído, mas parte com o corpo e o espírito bem nutridos.

A Fugas participou neste passeio a convite do Clube Escape Livre. Seria, por isso, mais prudente não comentar a qualidade da organização do evento. Mas tal seria também cometer uma injustiça e omitir um aspecto relevante do evento. De facto, o Clube Escape Livre voltou a evidenciar a sua já proverbial eficiência e criatividade na organização, que, seja qual for a marca com que trabalha, é sempre "premium".

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