Depois de séculos a ser usada pela família real nas suas deslocações a Óbidos, depois de ter sido destruída pelo terramoto de 1755 e reconstruída em 1772, a Igreja de S. Tiago foi em, 2011, transformada numa livraria recheada com 40 mil obras, acondicionadas em estantes, na grande maioria redondas, criadas especialmente para acolher os livros, naquele local.
Um espaço improvável, escolhido agora para algumas das 80 sessões literárias que integram o Folio Paralelo, um dos cinco capítulos do Festival Literário Internacional de Óbidos, que arranca dia 15 de Outubro e se prolonga por dez dias.
Não menos improváveis são as outras dez livrarias que compõem a vila literária projectada por José Pinho, administrador da Ler devagar, e que dotou a vila de "200 mil livros" espalhados por museus, galerias de arte, um centro de design de interiores e uma antiga escola primária, como explicou à Lusa.
Nestes espaços, a literatura convive com vizinhanças pouco comuns, como sejam as frutas e hortícolas biológicas que se vendem no mercado, lado a lado com os 40 mil livros expostos.
Transformado em alfarrabista generalista, o mercado apresenta os livros os livros guardados em "mil caixas de fruta, colocadas nas paredes do edifício", e os diferentes exemplares são, segundo José Pinho, "muito procurados por turistas nacionais e estrangeiros", com destaque para "os brasileiros, que são os que compram mais".
Numa antiga adega requalificada, a ordem é "Ler devagar", tal como o nome da livraria aí instalada e onde, por se tratar de uma adega, se encontram centenas de livros ligados ao vinho. Quem quiser, pode aliás acompanhar o livro com um copo do dito. Para outros, a escolha recai numa ginja, num café ou na doçaria regional. Até porque "há sempre uma actividade a acontecer desde as 10h00 até às 22h00". Neste como em todos os outros espaços improváveis que, por estes dias, aumentam os atractivos de Óbidos, garantiu José Pinho à agência Lusa.
Às 80 sessões literárias propostas pelos autores, livreiros e editoras presentes em Óbidos, juntam-se ainda quatro conversas da actualidade sobre "muros, migrações e nacionalismos", "cultura e o que há de vir", "as eleições que todos queriam ganhar" e "a vida nas cidades, a reabilitação e o património".
Mas neste universo literário paralelo, as conversas transpõem as paredes das livrarias e instalam-se num 'lounge', num hotel literário, em esplanadas literárias ou pelo casario da vila.
Na "Casa dos Poetas", num torreão próximo da igreja da Misericórdia, "haverá todas as sextas-feiras, sábados e domingos, em horários improváveis, sessões de poesias inesperadas, em que não se sabe que poemas se irão ouvir e, quem quiser, pode até levar um livro e propor que seja lido", adiantou o curador do Folio Paralelo.
Numa pequena tabacaria da vila, batizada "Casa dos bons malandros" instala-se, este fim de semana, Mário Zambujal, pronto a receber "quem aparecer, para conversar e beber uma ginja", acrescentou José Pinho, nesta visita guiada.