Fugas - Viagens

  • Mário Lopes Pereira
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O mar, o céu e a duna só para nós

Percorremos o caminho de madeira e logo no início encontramos pequenas saliências, com três degraus, uma espécie de miradouros privados, com espaço para duas, três pessoas no máximo. Esses aproximam-nos um pouco mais do mar, para o qual estão virados.

Depois, ao longo do percurso, o passadiço oferece-nos bancos corridos, uns com costas, outros sem, alguns voltados para o mar, outros para diferentes pontos. Três crianças aparecem a correr, dois rapazes com t-shirts com a cara de Cristiano Ronaldo e uma menina de totós presos com elásticos cor-de-rosa. “Por aqui ou por ali?”, perguntam aos pais, em inglês, perante uma bifurcação. Esta liberdade de escolha foi algo que Nádia quis ao desenhar o projecto. “É importante poder escolher para onde se quer olhar.”

Também os espaços individuais, com bancos giratórios, têm a ver com essa liberdade. Eles surgem quando chegamos ao tal troço de formas ondulantes, que não é um ponto de encontro para sermos recolhidos por naves extraterrestres, como imaginações mais delirantes poderiam acreditar, mas apenas um conjunto de cinco bancos giratórios, cada um colocado sobre duas plataformas redondas, uma maior, a outra mais pequena, todas ligadas entre si.

Aí, sentados num pequeno trono ligeiramente elevado em relação ao resto do passadiço, giramos e abarcamos tudo numa volta: o mar, os rochedos que despontam por entre as ondas, as pequenas enseadas usadas apenas por pescadores, o céu (está um dia nublado e ventoso, com bandeira vermelha na praia e o sol a tentar romper sem grande sucesso), a duna, a vegetação, os chorões que descem arriba abaixo e que tanto são verdes como laranja, a lembrar pequenas labaredas, os tufos de vegetação em manchas de cores diferentes, os pequenos montes de florinhas amarelas, as lagartixas que passam rápidas junto aos nossos pés. E também — infelizmente — o lixo que espreita aqui e ali em redor do passadiço e que incomoda igualmente a arquitecta.

Sentados nos bancos giratórios estão três amigos italianos que vieram do Sul e estão a percorrer Portugal em duas semanas. São de uma localidade próxima de Parma e estão encantados com o que têm visto. “Há paisagens de nos tirar a respiração.” Mas, pelo menos na Foz do Arelho, “a água é gelada”, dizem, rindo.

De repente, eles, as três crianças, a senhora com uma menina que tira fotografias enquanto salta ao pé-coxinho, todos seguem caminho e ficamos só nós, o céu, o mar, o vento, e as gaivotas que planam sobre as nossas cabeças, bem lá em cima.

Apreciamos a solidão por alguns momentos, antes de nos levantarmos e continuarmos. Encontramos mais à frente outras plataformas elevadas com bancos giratórios mas em estruturas com diferentes desenhos, umas mais avançadas, outras mais recuadas. Vamos subindo. Agora o vento bate-nos no rosto sem pedir licença, a lembrar-nos que teria sido boa ideia trazer um casaco.

Subimos um pouco mais, enfrentando o vento que assobia, e desembocamos junto ao antigo muro de pedra de um dos miradouros. O caminho de madeira do passadiço acaba num círculo que nos deixa novamente voltados na direcção da Foz do Arelho. Chegámos ao fim. Que — tudo depende da perspectiva — pode ser também ser o princípio.

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