Fugas - Vinhos

Paulo Ricca

O “problema” do vinho português

Por Pedro Garcias

Quando, em 2014, a revista americana Wine Spectator, a mais lida do mundo, classificou três vinhos portugueses nos primeiros quatro lugares da sua lista dos 100 melhores vinhos do mundo, com o Dow’s Porto Vintage 2011 à cabeça, acreditou-se que, a partir desse momento, nada iria ser como dantes e que o vinho português iria finalmente dar o salto para o campeonato dos grandes.

Porém, vieram novas colheitas, novas listas, novos vencedores e tudo voltou mais ou menos ao mesmo. Os vinhos premiados aumentaram as vendas, o Douro ganhou um pouco mais de notoriedade, mas os grandes números da região e do país pouco ou nada variaram, apesar de os vinhos portugueses nunca terem sido tão bons como são hoje.

Então, como se explica que o vinho português, sendo tão bom e tão barato, não descole e continue sem espaço próprio nas grandes cadeias de distribuição, apesar das infindáveis feiras que se organizam, das vindas regulares de hordas de importadores e jornalistas estrangeiros, dos incontáveis prémios que se ganham? O “problema” dos vinhos portugueses não está tanto no impronunciável nome das suas castas ou na falta de promoção. O “problema” dos vinhos portugueses está, sobretudo, na imagem de Portugal. Temos uma grande história e somos um belo país, seguro e onde se come e bebe muito bem, um bom lugar para se viver; mas, no contexto global, não passamos de um país pequeno e pobre, muitas vezes confundido com uma região de Espanha.

Como diria Trump, só quando voltarmos a ser grandes outra vez é que podemos aspirar a ter também a nossa própria secção de vinhos nas garrafeiras mundiais. Só que voltar a ser grande outra vez não passa de um desejo sebastiânico, de uma variante do utópico Quinto Império profetizado por Agostinho da Silva, que via no espírito ecuménico português as bases fundacionais de um mundo virtuoso. O nosso problema é querer ser sempre mais do que podemos ser. É assim no futebol e é assim nos vinhos.

Em boa verdade, tal como no futebol, o que alcançámos nos vinhos já é surpreendente — daí colocarmos “problema” entre aspas. Apesar de sermos o 10.º país com maior área de vinha do mundo (195 mil hectares) e ocuparmos o 11.º lugar no vinho produzido (6 milhões de hectolitros de vinho), somos o 8.º maior exportador (2,8 milhões de hectolitros e uma receita de 734 milhões de euros). Claro que podemos melhorar (para produzirmos um milhão de hectolitros de vinho, precisamos de 32,5 mil hectares de vinha, ao passo que os italianos conseguem o mesmo com apenas 13,5 mil hectares, e, mesmo assim, têm um preço por litro no vinho exportado superior ao nosso). Mas não podemos querer ombrear com a Itália, a França ou a Espanha. São países maiores, mais ricos e com uma gastronomia reconhecida no mundo. Se calhar, em vez de querermos vender mais, deveríamos pensar em vender mais caro. Aspirar a ser nos vinhos o mesmo que a Suíça é na geopolítica e na banca. Nessa lógica, eventos como a chamada Web Summit, que se realizou no passado mês de Junho em Cascais e que, segundo os organizadores, foi pensada sobretudo para estrangeiros (o que explica os cerca de 800 euros que custava cada entrada), fazem todo o sentido. Desde, claro, que depurada de um certo elitismo e nacional-parolismo, como pedir 3000 euros mais vinho aos produtores que quisessem patrocinar um jantar, não convidar o presidente da Viniportugal, a principal entidade de promoção do vinho português, ou colocar como um dos vinhos do certame, a troco de um significativo apoio financeiro, o Contemporal, uma marca branca e de volume do Continente.

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