Para fazer um grande vinho não basta dispor apenas de grandes uvas ou de equipamentos caros e sofisticados. Anselmo Mendes faz grandes vinhos porque tem tudo isso à mão, mas também porque tem a atitude indispensável para que um vinho grande se transforme num grande vinho. Anselmo é um estudioso e um inconformista. O experimentalismo e a irreverência explicam boa parte da sua carreira. Numa sessão realizada no Porto com jornalistas, Anselmo abriu o livro do seu método científico e mostrou os resultados dos seus ensaios. Objectivo: “Reflectir sem preconceitos”.
A sessão começa com a prova do Muros de Melgaço, nascido em 1998 numa encosta de solos graníticos e textura franco-arenosa e passou sempre por madeira. Para o enólogo, este é o seu “vinho mais afinado” e nessa definição o solo tem uma “influência determinante”. Mas é a passagem pela madeira que garante a complexidade que o distingue. A experiência com a fermentação em madeira começou em 1987 e depois “foram dez anos de ensaios com diferentes origens de madeira, diferentes tostas, diferentes tamanhos, etc”. A edição de 2016 é notável. Provar colheitas como as de 2012 e 2011 é concluir que estes vinhos ganham fulgor e alma com a passagem do tempo.
Anselmo anda a estudar as características de 25 parcelas ao longo do rio Minho desde 2015. Na sessão no Porto deu a provar seis experiências. Entre o vinho nascido em terraços fluviais com pedra rolada a 40 metros de altitude e solos graníticos e arenosos de granulometria grossa a 400, as diferenças exigem atenção para se apreenderem. Mas existem.
A curtimenta (contacto das películas com o mosto durante a fermentação) é outra das suas “obsessões”. Para ele, a casta Alvarinho “mostra ser uma das melhores castas do mundo para a curtimenta”. Anselmo Mendes aposta neste potencial, mas a sua primeira experiência, com a marca “Muros Antigos Escolha”, foi um desastre. “Não se vendeu nada”, lembra. Os ensaios foram retomados em 2005 e este ano o enólogo lançou o Tempo de 2015 — um vinho com um aroma muito original, sabor intenso e raro, complexo, estruturado e gastronómico.
Há anos que o enólogo faz um Pardusco com a casta Alvarelhão e o contributo de outras variedades em desuso como a Cainho, a Pedral ou a Borraçal, mas as suas experiências não se ficam pelo Alto Minho. Anselmo produz um Alvarinho na Adega Mãe com metade do lote de vinho da zona Monção/Melgaço e outra metade do Tejo — um branco muito interessante. E vai lançar um branco com a casta Síria da Beira Interior que é delicioso e extraordinariamente fresco.
No Dão faz um tinto sem madeira com um lado rústico e sedutor. E no Douro produz um outro vinho que revela bem a sua face inconformista: um Não Convencional de 2012 onde entram todas as castas excepto a Touriga Franca, a Touriga Nacional e as outras variedades que estão na base da maior parte dos vinhos durienses. Não é de agora: Anselmo Mendes tem prazer na procura e no risco. É isso que o leva ao experimentalismo. E que justifica em boa parte o nível dos vinhos que faz.