Fugas - dicas dos leitores

Attila Kisbenedek/AFP

Os meus lugares imperdíveis de Budapeste

Por Vânia Magalhães

Rendo-me a lugares onde me imagino viver e Budapeste é isso mesmo, cidade para se viver, mesmo carregando a pesada Canon e de mapa na mão.

Um pequeno estúdio, rapidamente escolhido uns dias antes na net, num edifício residencial com um misto de encanto e decadência, sossegado, mas perfeitamente enquadrado no agitado bairro judeu, permite logo desfrutar de uma das zonas mais animadas da cidade, e os sorridentes bons dias em húngaro dos vizinhos, logo depois dos pequenos-almoços homemade fazem do n.º 10.07 da Rua Rumbach um lar. 

Pequenos-almoços reforçados, porque apesar da excelente rede de transportes e de o próprio metro ser monumento de reconhecido valor histórico, não fosse a linha 1 a mais antiga da Europa continental, muitos são os quilómetros que se fazem a pé para não perder pitada.

Porém, calcorrear a cidade debaixo de uns secos 36º, potencia múltiplas pausas em lugares aprazíveis... o difícil é mesmo escolher, já que abundam os estabelecimentos com conceitos originais e de incrível bom gosto e divergem as preferências dos companheiros de viagem! Destaco, contudo, uma pérola de sofisticação, que parece caracterizar o estilo de vida da Paris do Leste, o Lotz Terem, café na livraria Alexandra. A fachada art deco abre-se a uma moderna livraria, cujas escadas rolantes desembocam num inesperado salão palaciano ilustrado por incríveis frescos nas paredes e com candelabros e espelhos a multiplicar a magia em dourado. Um privilégio escrever postais neste espaço, que também surpreendeu pela conta, inferior ao esperado, atento o menu do não menos emblemático café New York, também visitado na tarde anterior.

Menos aprazível é o facto de ainda hoje ser possível sentir na cidade a marca dos períodos trágicos vividos por aquele povo ao longo da sua história, do Holocausto às ditaduras comunistas, e para que a memória não se apague há monumentos, memoriais e museus a perpetuá-los e a merecerem a nossa visita e respeito, mas se só um desses lugares puder ser visitado que seja o monumento aos sapatos velhos, que eterniza o fatídico episódio na margem de Peste do Danúbio, onde judeus foram obrigados a descalçar-se antes de serem fuzilados e caírem ao rio, porque os sapatos eram mais valiosos que as suas próprias vidas... Há a História que se lê e há a História que se sente e emociona. Lugar de pausa e silêncio, onde descansadas as pernas, se inquietou a alma…   

Atrocidades aparte, estas escapadas a cidades com vasta dinâmica cultural, só ficam completas com um espectáculo artístico, e por isso foi com alguma tristeza que nos deparámos com a ópera esgotada para todos os serões da estadia... Porém, da adversidade nasce a oportunidade e pudemos assistir ao incrível concerto de abertura do festival de Verão de Budapeste, na ilha Margitsziget bem no centro do Danúbio. Escutar as sinfonias de Liszt inspiradas na obra de Dante em anfiteatro ao ar livre, pode não ter a melhor acústica, mas orquestra acompanhada pelo cantarolar dos pássaros das árvores mais próximas é um privilégio!

A experiência de viver, ainda que temporariamente, num bairro urbano, só fica completa com o périplo pelo seu ambiente nocturno, até porque os bares em ruínas da Rua Kazinczy são ponto obrigatório da capital; existem vários ao ar livre, todos propícios à forte dor no pescoço, sempre em riste para contemplar os incríveis painéis de street art que os decoram; particular destaque para o Szimpla, uma antiga fábrica convertida em bar com performances culturais, onde um copo pode ser acompanhado por uma suculenta cenoura e as mesas e cadeiras são os mais incríveis objectos desde banheiras, a cadeiras de “mise” de cabeleireira ou mesmo um cavalo de ginástica e apesar do pulular de estrangeiros percebe-se que é um espaço querido aos locais.

Budapeste é isto e muito mais. Naturalmente que a zona do Castelo em Buda, o imponente Parlamento e a panorâmica vista da Citadella ou mesmo a icónica ponte das Correntes merecem igualmente uma visita, mas esses locais encontrámos amplamente descritos e ilustrados mesmo nos mais incompletos guias, por isso aqui quis recordar para memória futura aqueles lugares que mais do que vistas permitiram sentir.  

Grata, Budapeste!

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