Fugas - dicas dos leitores

Pelo caminho francês de Santiago

Por Joaquim Tomaz Soares

Em Navarra, em Novembro de 2009, éramos dez, 12 peregrinos por dia. Além de nós os dois, coreanos, alemães, uma chilena, um holandês e uma japonesa.

 Em Navarra, em Novembro de 2009, éramos dez, 12 peregrinos por dia. Além de nós os dois, coreanos, alemães, uma chilena, um holandês e uma japonesa. A 1 de Janeiro, início do último Ano Jacobeu, desde Santo Domingo de la Calzada, apenas dois casais: nós e uns bascos — ele espanhol e ela francesa. Já em Julho, na Galiza — para chegar a Santiago de Compostela a 25 — quase três mil em cada etapa, com “tropas” italianas, polacas, francesas, inglesas, além de alguns sírios, israelitas, ceutíes (que sabem que estão na sua terra a prazo, de bandeira desfraldada, com as nossas quinas) e bastantes australianos, neo-zelandesas, mexicanos, americanos, colombianos e brasileiros, além de espanhóis de todos os lados, incluídos independentistas catalães e uma asturiana “arrependida” (“¿Habrá maravilla mayor que la del sol perene de Castilla? En Asturias siempre llueve...”); um jovem russo que cozinhava para todos e um marinheiro ...austríaco — quem diria?! — aposentado e a viver em Valência, com o Mediterrâneo a encher-lhe a janela, para não morrer afogado, por falta de mar!... E coreanos, sempre. Muito mais gente ainda, que agora nem recordo. (Mas, com peregrinos a mais, convívio e partilha a menos: até nem lugar para todos dormirem havia).

No términus, já em Novembro de 2010, em Finisterra, até onde ia o Caminho das Estrelas dos Druidas celtas — sempre a caminhar na direcção do sol-posto até não haver mais mundo à frente —, o êxtase por se ter atingido o objectivo que tantas vezes parecera inalcançável. Entre outros, chegámos juntamente com uma suíça que caminhou quase ininterruptamente 99 dias desde a fronteira da Áustria sem se deter em Santiago, a ver o Papa Bento XVI. Lá só descansara o único da sua peregrinação de cem dias certos. Tinha o ar de quem se tinha acabado de separar, pegando na mochila e batendo a porta!...

“There is no way to happines. Happiness is the way!”, li num graffiti a meio do Caminho. Mas a “pintada” mais usual era a da saudação com que nos cumprimentávamos e nos despedíamos, fossem quais fossem as línguas de cada um: “¡Buen Camino!”; e com que ainda hoje terminamos os emails que trocamos com muitos desses companheiros fugazes no Caminho da Vida.

Noutra peregrinação do mesmo ano, pelo Caminho Português, o meu irmão mais novo, que o fez nove vezes — e sempre pelo mesmo itinerário —, marcou encontro à porta da catedral com uma peregrina italiana para 11 anos depois, ao meio-dia de 25 de Julho de 2021 — o próximo Ano Jacobeu Jubilar (quando o 25 de Julho volta a ser ao domingo). Mas nem contacto tinha dela e, na sua última peregrinação dois anos depois, comentou-me que “talvez ela se esquecesse”, ...que ele sabia ser aquela mesmo a última vez que iria a Santigo de Compostela e a Finisterra, não tendo forma de desmarcar o encontro. E acabou o seu caminho na vida no Outono do ano seguinte…

Na nossa última peregrinação — pelo Caminho Português pelo Interior, desde Viseu, com a Secção de Montanha do Académico Futebol Club, do Porto — chegámos a 8 de Julho deste mesmo 2017 a Santiago de Compostela. Do merchandising do Caminho destaca-se a legenda “Sin Pena No Hay Gloria”, mas ambos levávamos vestidas umas t-shirts ainda mais expressivas: “Nunca Caminarás Solo”.
 

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