Só que em Leninegrado fiquei preso a uma montra. Uma máquina fotográfica brilhava. Era uma Kiev. Entrei na loja e o meu avô fez o resto. Tinha a minha primeira máquina fotográfica a sério e fiz-me fotógrafo desde esse dia.
Em Goritsi vi uma igual numa banca de velharias. Voltei à Rússia por causa da velha máquina Kiev comprada numa montra de Leninegrado. Devo a ela e à terra estranha ser fotógrafo e também outras coisas.
Na gaveta das memórias de sais de prata a minha mãe remexe com a certeza de as encontrar. Aparece num envelope amarelo o grupo de portugueses junto a Lenine no Kremlin. Estão ali as minhas primeiras fotografias. A minha primeira “reportagem”. Inocente. Radiante. Um pouco da vida soviética estava ali. Na gaveta das memórias. Agora que volto a fotografar deixo-me ir. Com pouca inocência mas muito radiante.
No aeroporto Pulkovo digo adeus. Volto ao Ocidente, terra minha, com a vontade de voltar à terra vossa. Soviéticos, russos, feudais, socialistas, capitalistas, são gente que deram esperança ao mundo. Moscovo ensinou-me há 35 anos, como agora me continua a ensinar, que existe sempre algo que nos une.
Aqui, perco-me sempre. Obrigado, avô.