Inicialmente, julgava que viver entre a Bélgica e a Bairrada iria ser complicado. "Mas não atrapalha tanto como pensava. A Bélgica é um país central e posso ir facilmente a Londres ou a qualquer outra cidade da Europa promover os vinhos", diz.
Um dia destes, Filipa fez um flasback e assustou-se. "Já faço vinhos há 10 anos, o tempo passa depressa". Tem 35 anos, mas já fala como se levasse uma vida entre as vinhas e adega. Em boa verdade, até leva. "Eu sempre gostei de participar na criação de vinhos. Lembro-me de trabalhar com o meu pai [Luís Pato] desde miúda e de estar na adega em todas as colheitas", recorda.
São três irmãs - "todas tivemos a mesma educação, mas eu fui sempre a mais ligada ao vinho", reconhece. Porém, chegada a hora da universidade, optou por Engenharia Química, seguindo o exemplo do pai. Uma das irmãs preferiu arquitectura e a outra cursou engenharia electrotécnica. Já formada, Filipa Pato quis sair de Portugal. Uma hipótese era fazer um doutoramento em Montpellier, mas, confessa, não lhe "apetecia estudar mais quatro anos". O pai conseguiu-lhe um estágio num dos châteaux do grupo Axa, em Bordéus. "Fui na vindima de 1999, uma colheita superdifícil. Foi muito interessante ver como em Bordéus [onde cada colheita é sempre considerada a melhor de todas] actuavam perante uma má colheita", enfatiza.
Depois, ainda estagiou na Austrália e na Argentina, antes de regressar definitivamente à Bairrada para trabalhar com o pai e começar também a fazer os seus próprios vinhos, seguindo a mesma filosofia do progenitor. Vinhos "autênticos sem maquiagem", que reflictam o lugar onde são criados. Começou com o projecto Ensaios, nome bem adequado a uma debutante. Criou em seguida o Espumante 3b, que teve e tem um enorme sucesso. Depois lançou os vinhos Lokal Sílex e Calcário.
Mas não se ficou por aqui. Irreverente e com sentido para o negócio como o pai, criou com o marido a empresa Vinhos Doidos, através da qual vendem dois brancos: o Bossa, mais fácil e perfumado, e o Nossa, mais arrojado e que tem feito uma carreira fulgurante no Brasil. "Há dias, ligou-me um sommelier do Rio de Janeiro a dizer-me que o Walter Sales [cineasta e produtor brasileiro] gostou tanto do vinho que até me quer conhecer", conta, com orgulho. O Nossa também está à venda em Portugal e custa 25 euros.
Baga é a sua casta preferida, mas os "seus" vinhos, aqueles a que está mais ligada, são o Nossa 2009, feito de Bical, e o Lokal Sílex 2008, lote de Touriga Nacional e Alfrocheiro Preto. O primeiro é oriundo da Bairrada, o segundo do Dão. Desde que começou a fazer vinhos, Filipa circunscreveu o seu território vitícola a essas duas regiões. Numa e noutra foi alugando vinhas e comprando uvas a alguns produtores. Ao fim de 10 anos, está prestes a concentrar-se apenas na Bairrada e a desistir do Dão.
Se tudo correr bem, este ano vai poder também concretizar o seu grande sonho, que é ter as suas próprias vinhas na Bairrada. Uma delas será muito velha. Filipa anda entusiasmada (está nomeada para os prémios do ano da revista Der Feinschmecker, a mais influente da Alemanha, e acredita cada vez mais no potencial dos vinhos bairradinos). Há tempos ouviu um especialista francês defender que, para se fazer uma grande vinho, é necessário ter solos argilocalcários, boa exposição e clima temperado. "Na Bairrada temos tudo isso", diz.