A marca de vinho Xaino diz-lhe alguma coisa? É normal que não diga: a marca é nova, está no mercado apenas desde 2009 e ainda não teve muito tempo para se mostrar. Mas, vendo bem as coisas, não é assim tão normal este desconhecimento.
Não se trata de um vinho qualquer. Ou melhor, não estamos perante um pequeno produtor de vinho, alguém que resolveu entrar no negócio para poder tirar mais algum valor das suas uvas. Xaino é a principal referência da Quinta Vale d"Aldeia, um grande projecto vitivinícola de dois irmãos na Meda, no Douro Superior.
Quem visita a adega, próxima da aldeia de Longroiva, não consegue disfarçar o espanto. Encrustado no terreno de xisto, o edifício desenvolve-se em vários pisos, alguns no subsolo e todos equipados com computadores para permitir gerir o processo de vinificação sem subir e descer escadas. A forma como a adega está construída e a qualidade e dimensão do equipamento (a capacidade de vinificação é de 750 mil litros) são o sonho de qualquer enólogo. E como o mais importante são as uvas, o projecto conta com 80 hectares de vinha própria.
Pelo menos ao nível da adega, há poucos produtores de DOC Douro com melhores condições. O enólogo também é afamado: João Brito e Cunha, associado a alguns bons vinhos do Douro e produtor do Ázeo e do Quinta de São José. No entanto, e apesar da sofisticação da adega e do nome do enólogo, os vinhos da Quinta Vale d"Aldeia continuam longe dos holofotes, mantendo-se por agora mais familiares junto dos consumidores de bag in box (uma parte da produção é engarrafada em embalagens de cinco litros).
Um projecto casuístico
Há algo de paradoxal, ou de errado, nesta história e a explicação pode estar na génese do projecto. Os cerca de cinco milhões de euros que já foram investidos mostram que se trata de um assunto sério. Mas o projecto nasceu de forma casuística. Foi mais ou menos assim: em 2004, um pequeno produtor da Meda que se preparava para plantar um hectare de vinha viu-se confrontado com as incertezas da actividade e confessou a José Amado (que possui com o irmão, João Amado, a empresa de obras públicas Gualdim Anciães Amado & Filhos, Lda) a sua vontade de desfazer-se do terreno. "Você é que podia ficar com ele!", atirou-lhe.
Os dois irmãos compraram o terreno, entusiasmaram-se, foram comprando licenças para plantar vinha e mais terrenos à volta, uns atrás dos outros até chegarem aos actuais 110 hectares (80 de vinha e 30 de olival). Mais entusiasmados do que nunca, avançaram depois para a construção da adega, apostando na melhor tecnologia. E assim, de um pé para a mão, os dois irmãos entraram a fundo no negócio do vinho na pior altura para o fazer, investindo cerca de cinco milhões de euros. "Não estou nada arrependido", diz José Amado.
Um investimento desta dimensão dificilmente consegue ser amortizado e só foi (é) possível porque a Gualdim Anciães Amado & Filhos possui uma grande capacidade financeira. Mas para José e João Amado a Quinta Vale d"Aldeia não é propriamente um devaneio. A aposta é séria e os objectivos são ambiciosos (fazer vinhos de qualidade com algum volume). O que tem falhado, reconhece José, é a comunicação (a empresa não possui sequer um site). Não basta fazer uma quinta, construir uma adega e contratar um enólogo conhecido para fazer um projecto de sucesso. Foi esse o logro dos dois irmãos. O negócio do vinho requer dinheiro, muito dinheiro, mas também estratégia, método, comunicação, agressividade comercial e tempo, claro.
O factor tempo pode, aliás, ajudar a explicar a forma quase "sigilosa" como João Brito e Cunha tem tratado este projecto. Um bom vinho não se faz de um ano para o outro e dar a conhecer vinhos que ainda não atingiram os patamares de exigência do enólogo não é boa política. Nem para o próprio, nem para a empresa. A outra versão, mais maléfica, é de que João Brito e Cunha tem dado prioridade aos seus vinhos, esquecendo os da Quinta Vale d"Aldeia.
Seja qual for a razão, os vinhos Xaino e Foral da Meda, as duas referências da empresa, são uma espécie de segredo mal escondido. Os nomes, convenhamos, não são muito apelativos. O segundo remete-nos para marcas de grande volume associadas a cooperativas; o primeiro é uma incógnita para todos que vivem longe dos assuntos da maçonaria (trata-se de um termo maçónico popular no século XIV que significava "vinho"). No entanto, o que conta num vinho é a sua qualidade e não tanto o nome. E as primeiras experiências do Xaino e do Foral de Meda, enquanto não é lançado aquele que vai ser o topo de gama da casa, o vinho Acervo, são bastante promissoras.
Foral de Meda Branco 2011
Melhor no nariz do que na boca. Aromaticamente é muito expressivo e fresco, com boas notas cítricas. Mas no palato perde força, terminando algo curto 2,60 euros).
Xaino Branco 2011
Tem a mineralidade e a frescura que falta ao Foral de Meda. E tem também outra complexidade e riqueza, beneficiando claramente da incorporação da casta Rabigato no lote. Muito interessante (5,49 euros).
Foral de Meda Tinto 2010
Um vinho frutado e com um toque vegetal. De médio volume, é muito fresco na boca, com um final a puxar ligeiramente para o verde. Precisa de comida, embora não muito forte (2,60 euros).
Xaino Tinto 2010
Vinho muito perfumado e cheio de finesse e frescura. A madeira está muito bem integrada e os taninos são redondos. Mostra um interessante toque apimentado e acidez bem calibrada (4,11 euros).
Xaino Reserva 2009
Um belo vinho, cheio de carácter e personalidade. De aroma um pouco austero, é um tinto que se afasta da matriz mais quente dos vinhos do Douro Superior. Lote (pouco comum) de Touriga Franca e Sousão, surpreende pela sua complexidade (fruta, vermelha, especiarias, chocolate), riqueza e nervo final (8,90 euros).