Outro tema recorrente é a alegada pureza dos “vinhos de lavrador”, vinhos sem aditivos externos, ao contrário dos “vinhos industriais”, dos vinhos de marca que teoricamente estariam cheios de químicos e de outras coisas igualmente pérfidas e potencialmente perigosas. Um conceito estranho e que a ter algum fundamento seria inversamente proporcional ao postulado, já que é muito mais plausível que os denominados “vinhos de lavrador” surjam viciados por algum defeito bacteriológico. Embora tenhamos tendência para o esquecer, convém recordar que o vinho é um produto alimentar, um alimento que vamos ingerir e que como tal é obrigado a seguir regras de higiene severas. O vinho é um produto alimentar puro, produto natural da fermentação de uvas que segue normas alimentares precisas na sua elaboração.
Mais curiosa é a associação popular entre a formação de lágrimas no copo e qualidade, encaradas como uma indicação segura de um vinho de enormes atributos. Uma noção esquiva, já que a formação de lágrimas no copo é um tema absolutamente irrelevante sobre a formação de qualquer juízo de qualidade no vinho. Quanto maior o volume de álcool maior será a tendência para a criação das lágrimas, tal como quanto maior o teor de açúcar maior a propensão para a formação da lágrima. Tal consciência denuncia que, perante a formação de lágrimas, poderíamos na melhor das hipóteses deduzir que o vinho seria alcoólico, doce, ou uma conjugação dos dois factores. No entanto, os detergentes usados na lavagem dos copos podem alterar profundamente esta lógica, inibindo ou induzindo o aparecimento da lágrima, destruindo qualquer hipótese da teoria das lágrimas.
Finalmente, o preconceito vigente que os queijos deverão ser harmonizados com vinho tinto ou, em alternativa feliz, por Vinho do Porto. Uma aparente certeza que, apesar do peso da tradição, nem sempre é garantida e que merece ser ferozmente disputada. Na verdade, esta realidade depende não só de gostos pessoais como do queijo ou queijos em concurso. Com queijos de pasta mole, que, convém recordar são os mais comuns e apreciados em Portugal, queijos como o Queijo da Serra, Queijo de Serpa, Queijo de Azeitão e tantos outros, o vinho branco costuma proporcionar harmonizações mais consistentes e mais felizes. A acidez natural do vinho branco contrasta melhor com a gordura e peso dos queijos de pasta mole… e com muitos outros queijos, mesmo de consistência mais dura. Se a proposta pode parecer estranha face à tradição, basta um ensaio para a prova e possível conversão. Experimente.