A propriedade é antiga e uma das de melhor localização em todo o Douro mas são os acontecimentos recentes que prometem dar-lhe um novo protagonismo. É uma história de encontros felizes, a da Quinta de Foz Torto. Desde logo, aquele que protagonizam os cursos de água do Torto e do Douro, criando um cenário de rara beleza e enquadramento. Bem mais recente e determinante foi também o encontro de Abílio Tavares da Silva com o mundo dos vinhos, que o levou a mudar de vida e a adquirir a propriedade.
E o que começou por ser uma espécie de sonho ou miragem de um citadino, ainda para mais absorvido pelo mundo da informática, acabou por se concretizar num projecto que não se contenta apenas com a produção vitícola. A segunda colheita dos vinhos de Foz Torto, com assinatura enológica da reconhecida Sandra Tavares da Silva — outro feliz encontro —, acaba de ser lançada, mas prosseguem as obras de recuperação da quinta, de forma a que se constitua como algo mais que um cenário aprazível.
Por entre os 14 hectares da propriedade estão a ser criteriosamente recuperados socalcos, hortas, muros e miradouros, de modo a que a quinta e a paisagem possam ser fruídas na sua plenitude. Saboreando o enquadramento e os produtos que a natureza oferece, mas também com percursos pedestres e o conforto da unidade de turismo que vai nascer da recuperação da ruína da original casa da quinta. “Queria construir algo novo, especial, feito e pensado ao pormenor. Um espaço para produção de vinhos de qualidade, mas também um local para ser vivido e fruído com calma”, explica o proprietário.
As obras estarão concluídas em 2015, mas a valia e ambição do projecto foram já reconhecidas com a atribuição do Prémio Douro Empreendedor, que nele viu a visão e potencialidades de um novo espírito para a mais antiga região vinhateira. E nem se pense que foi por falta de concorrência, já que entre os finalistas estavam projectos como o do francês Roger Zannier, que investiu já mais de 10 milhões de euros na Quinta do Pessegueiro, ou o da Quinta da Covela, que o financeiro brasileiro Marcelo Lima e o ex-jornalista britânico Tony Smith recuperaram com um investimento de três milhões de euros.
Com a aquisição e obras de recuperação foram já investidos 2,5 milhões no projecto de Foz Torto, devendo somar-se mais um milhão com a conclusão da componente de turismo. Para além da vinha, foi também adquirida e recuperada uma velha adega na vila de Pinhão, a dois quilómetros da vinha, que servirá também como espaço para eventos. Além de provas e visitas, claro.
A ideia de Abílio Tavares da Silva passa por uma produção limitada, privilegiando sempre a qualidade e identidade dos vinhos de Foz Torto, mantendo-os fora da grande distribuição. “Atingir um máximo de 10 mil garrafas por ano para serem vendidas em restaurantes e garrafeiras seleccionados e ter a quinta como principal ponto de venda”, revela o proprietário, que aposta no peso dos visitantes e na sua vasta rede de contactos em todo o mundo. Uma teia que lhe vem dos tempos em que liderou uma próspera empresa que foi líder mundial na área de gestão e marketing informático e que vendeu ao grupo francês Teleperfomance para se converter em agricultor no Douro.
Quando ainda vivia em Lisboa, em 1999, o gestor e engenheiro informático decidiu formar-se também em enologia em Vila Real, na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro. Sem raízes na região, mudou-se com a família para o Douro no ano seguinte e foram cinco anos de procura incessante até encontrar no belo anfiteatro de Foz Torto o local com as condições que tinha idealizado. No coração da região vinhateira, com localização e exposição (sul e poente) privilegiadas e ainda por cima com uns belíssimos três hectares de vinhas velhas plantados em socalcos na parte mais vistosa da quinta. No mais, houve que replantar a quase totalidade da vinha, o que foi feito com as castas tintas recomendadas para a região.
Qualidade em poucas garrafas
Para a produção de brancos, houve que adquirir uma pequena parcela nas zonas altas de Murça. São apenas 0,6 hectares com cerca de três mil pés de vinha velha na exclusiva localidade de Porrais, antes pertença de um produtor local e cujas uvas costumavam ser utilizadas na produção do famoso Redoma, da casa Niepoort.
Da produção de 2011 foram feitas 1900 garrafas de um vinho que se define pela elegância, complexidade e um delicioso amargo final que lhe confere grande aptidão gastronómica. Na versão 2012, lançada recentemente, com apenas 1100 garrafas ao preço de 21 euros cada, o vinho como que refina todas aquelas qualidades, mas sublinhadas agora por uma fina e assertiva mineralidade que o tornam num dos mais promissores brancos da produção nacional.
Nos tintos, são engarrafadas as versões Colheita (12 euros) e Vinhas Velhas (28 euros), com 3300 e 2300 garrafas, respectivamente. Depois da colheita de 2010 foram agora lançados os 2011, que confirmam as características de frescura, elegância e equilíbrio, mas agora ainda menos marcadas pela discreta presença da madeira.
Além das evidências de fruta vermelha, fresca e madura, e dos aromas de especiarias e da natureza, há no Vinhas Velhas uma percepção de estrutura e equilíbrio particularmente sedutora. Como que condensa todas as virtudes de fruta, potência e volume de um grande Douro, mas com a serena elegância dos grandes vinhos do mundo.