Fugas - Vinhos

  • Jean Claude Berrouet
    Jean Claude Berrouet DR
  • Quinta da Boavista
    Quinta da Boavista Ana Paula Carvalho.
  • Jean Claude Berrouet
    Jean Claude Berrouet DR

O enólogo que fez um dos vinhos mais caros do mundo dedica-se agora ao Douro

Por Alexandra Prado Coelho

Duas visitas à Quinta da Boavista, uma prova do resultado da vindima de 2013 e Jean Claude Berrouet disse que sim. O homem por trás de um dos vinhos mais caros do mundo vai agora ajudar a colocar o terroir do Douro numa garrafa.

Jean Claude Berrouet, o enólogo que durante cerca de 40 anos fez um dos mais prestigiados e mais caros vinhos do mundo, o Pétrus (com o preço de 3100 euros num restaurante de Lisboa), da região de Pomerol, Bordéus, vai agora trabalhar um vinho do Douro. Berrouet aceitou o desafio que lhe foi lançado pelos proprietários da Quinta da Boavista, o brasileiro Marcelo Lima e o britânico Tony Smith, e é já o consultor para os vinhos desta propriedade.

“Foi um namoro.” É assim que Marcelo descreve o processo que levou Berrouet até ao Douro. “Jean Claude veio visitar-nos pela primeira vez em Junho, provou os nossos vinhos de 2013, que ainda estavam em lotes separados, e adorou. A partir daí começámos a discutir a nossa colaboração. Agora voltou ao Douro, e finalizámos o acordo.”

Berrouet já está a trabalhar com Rui Cunha, o enólogo português da Covela e da Boavista, no desenvolvimento dos vinhos de 2013 e 2014, que deverão chegar ao mercado, ainda em pequenas quantidades, no final de 2015.

A aproximação ao famoso enólogo francês foi facilitada pela ligação da Lima Smith (que é também dona da Quinta de Covela, na fronteira da região dos Vinhos Verdes, e da Quinta das Tecedeiras) à Champy, histórica casa de vinhos da Borgonha, em cujo capital os dois produtores do Douro entraram este ano.

Através do novo sócio francês, Pierre Beuchet, proprietário da Champy e da rede de distribuição internacional DIVA, Marcelo e Tony conheceram Berrouet e falaram-lhe na Quinta da Boavista, onde fizeram a primeira vindima em 2013. “No ano passado apanhámos mais de 100 mil quilos de uvas, das quais seleccionámos mais de 8000 de vinhas velhas e alguns lotes específicos para começarmos a vinificar e conhecer o potencial de cada lote”, conta Marcelo.

O facto de Berrouet — que se retirou do Chatêau Pétrus em 2007 e habitualmente não aceita novos projectos para além dos que já tem em mãos — ter decidido aceitar o desafio do Douro foi uma excelente surpresa para Marcelo e Tony, que têm uma enorme admiração pelo trabalho do enólogo francês e que se revêem inteiramente na forma de Berrouet fazer vinhos.

“Ele acredita firmemente que o vinho tem que reflectir o terroir, e é conhecido no mundo inteiro precisamente por trabalhar vinhos que reflictam o lugar de onde vêm”, explica Marcelo. “E na Quinta da Boavista a ideia não é tentar fazer um vinho internacional que podia ser produzido no Douro, na Nova Zelândia, no Chile ou nos EUA. Queremos fazer um vinho que reflicta as características do Douro e das vinhas do Douro.”

Casa do Barão de Forrester
A Quinta da Boavista, que Marcelo e Tony compraram à Sogrape em 2012, quando procuravam uma propriedade onde pudessem trabalhar os vinhos tintos, tem uma paisagem magnífica, uma localização privilegiada na margem direita do Douro, perto do Pinhão, e tem, além disso, pergaminhos históricos: o Barão de Forrester, figura influente na história do vinho do Porto e o homem que desenhou o célebre mapa do Douro, ficava muitas vezes instalado nesta casa, que usava como base para o seu trabalho de mapeamento da região.

Trata-se de uma propriedade com 80 hectares, 40 dos quais de vinha. Há uma parte ainda considerável de terraços irregulares, com muros muito altos, onde estava plantada a vinha no passado, antes da chegada da filoxera que a destruiu completamente, na segunda metade do século XIX. Nunca mais foi plantada vinha nesses terraços antigos, chamados “mortórios”, conta Tony Smith, que acompanhou a Fugas numa visita à quinta.

Quando se começou a tentar recuperar a produção de vinho no Douro, com a plantação de novas vinhas, foram feitos também novos terraços — e hoje vê-se claramente a diferença entre os antigos, de muros incertos, e os mais recentes, que desenham elegantes ondas subindo a encosta. Algumas ondas mais largas formam “barrigas” sobrepostas, que permitem uma zona mais alargada de plantação, e constituem o chamado “oratório”, de poderoso efeito cénico.

Totalmente preservados estão também os lagares de pedra, onde pode ser feita a pisa a pé — algo que Tony e Marcelo e os enólogos com quem trabalham ainda não decidiram se irão ou não fazer. Na entrada da propriedade funcionou no passado a alfândega, onde se cobrava o imposto pela passagem das pipas vindas das outras quintas, que eram depois levadas até ao cais, que continua a existir junto ao rio, para serem transportadas nos barcos.

E é a partir do terroir desta quinta, que Tony descreve como “uma jóia da coroa no Douro” que, com a ajuda de Jean Claude Berrouet, os dois produtores querem fazer um vinho que, esperam, possa aspirar a estar entre os melhores do mundo.

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