O Dão não tem a beleza do Douro ou do Alentejo, mas é uma região abençoada para a produção de grandes vinhos brancos e tintos. Numa paisagem muito retalhada e telúrica, sem a densidade humana do Minho, por exemplo, as vinhas aparecem geralmente rodeadas de pinheiros e eucaliptos, que dão aos vinhos tintos um toque balsâmico e resinoso. Os solos, maioritariamente graníticos, também enriquecem os vinhos com uma frescura mineral. E as serras que envolvem a região, da Estrela ao Caramulo, do Bussaco a Montemuro, funcionam como um frigorífico permanente, protegendo ainda o Dão das humidades atlânticas e garantindo verões secos e amenos. Só mesmo a chuva de Outono consegue por vezes estragar este quadro idílico.
Quando a maturação decorre sem problemas, o Dão é capaz de produzir os melhores vinhos portugueses. Vinhos envolventes e delicados, ricos em aromas e taninos, não muito carregados de cor mas com uma excepcional capacidade de guarda, devido à sua excelente acidez natural. Vinhos com uma grande aptidão gastronómica e que ganham com o tempo sabores especiados e químicos muito complexos e frescos. Os melhores conseguem durar décadas. Alguns vinhos do Centro de Estudos Vitivinícolas do Dão, em Nelas, da década de 60 do século passado, por exemplo, ainda estão gloriosos.
Não há um enófilo que não se renda aos vinhos do Dão, em especial aos brancos de Encruzado e aos tintos feitos à base de Touriga Nacional, Alfrocheiro, Tinta Roriz e Jaen. No entanto, a imagem da região ainda está a ser prejudicada pelos erros cometidos entre as décadas de 60 e 90, quando o negócio do vinho foi quase um monopólio das cooperativas. Salazar reservou ao Dão o papel de principal produtor de vinhos tranquilos do país e essa determinação resultou num desastre, num mar de vinhos deslavados e baratos.
No final do século passado, com o declínio das cooperativas e o surgimento de alguns produtores-engarrafadores, o Dão começou a querer levantar-se. Empresas como a Dão Sul, com Cabriz e Santar, e a Sogrape, com a Quinta dos Carvalhais, e produtores como Álvaro de Castro (Quinta da Pellada) e Luis Lourenço, da Quinta dos Roques, entre outros, foram os grandes pioneiros deste novo sopro. Mas, ao contrário do que aconteceu no Douro, onde uma nova geração de enólogos acabados de sair da universidade conseguiu em poucos anos revolucionar completamente a região, colocando-a no centro das atenções da crítica nacional e internacional, no Dão a mudança foi muito mais lenta. Numa entrevista ao PÚBLICO, Arlindo Cunha, o presidente da comissão vitivinícola regional, justificava essa lentidão com a pesada herança legada pelo cooperativismo, cuja crise deixou o Dão “muito depauperado em matéria de massa crítica”. “É desse doloroso processo que estamos agora a recuperar”, acrescentou. Na verdade, nos anos mais recentes, a região tem mostrado um outro dinamismo. Há cada vez mais pequenos produtores a engarrafar o seu próprio vinho.
Alguns, como o jovem António Madeira, estão a recuperar vinhas antigas e a emular os métodos ancestrais de vinificação, na esteira de alguns “irredutíveis”, como Tavares de Pina. Outros, como os proprietários da Casa de Mouraz, dirigiram a aposta, com muito sucesso, para os vinhos biológicos. O número de recém-licenciados em enologia a fixar-se na região também tem vindo a aumentar. Um dos rostos desta nova geração é Mafalda Perdigão, da Quinta do Perdigão, onde já está a fazer vinhos belíssimos. Enólogos reputados, como Nuno Cancella de Abreu, e profissionais de outro ramo, como a advogada Júlia Kemper, regressaram ao Dão para assumir os vinhos da família. Ex-fundadores e administradores da Dão Sul, como Casimiro Gomes e Carlos Lucas, escolheram o Dão para criar as suas próprias empresas. Winemakers com grande peso mediático como Dirk Niepoort também já têm vinhas próprias na região. Outros nomes cintilantes do Douro, como Jorge Moreira, Jorge Serôdio Borges e Francisco (Xito) Olazabal, começaram igualmente a fazer vinho no Dão, com a marca M.O.B.
O alentejano João Portugal Ramos seguiu-lhes as pisadas (faz vinhos na Quinta da Bica). Casas com alguma história, como a Passarela, sofreram uma reviravolta de 360 graus e estão hoje a produzir vinhos notáveis. E há diversos empresários de outros sectores que têm vindo a fazer grandes investimentos no enoturismo, de que o melhor exemplo é o projecto Quinta de Lemos.
O Dão está mesmo a mexer, impulsionado por gente de fora e de dentro, por “séniores” e “júniores” que acreditam que o futuro do vinho português também passa por ali. Mas o caminho nunca será o mercado de massas, nem assentará nos vinhos tecnológicos carregados de fruta que estão a cegar muitos produtores. Os vinhos que podem trazer de novo o Dão para a ribalta terão que ser tributários do “terroir” e da cultura da região, dos fantásticos brancos e tintos feitos por Alberto Vilhena no Centro de Estudos Vitivinícolas do Dão e dos ensinamentos de enólogos veteranos. Sem esquecer uma série de produtores que não se conformaram com o definhar da região e que, através do seu exemplo e criatividade, têm sido uma fonte de inspiração para as novas gerações.
Três séniores
Manuel Vieira
(Ex-Sogrape)
Manuel Vieira chegou ao Dão, vindo do Douro, no final dos anos 80 do século passado. Encontrou uma região em crise, dominada por cooperativas amadoras, com pouco muito pouco trabalho académico disponível e algumas das melhores castas a caminho da extinção. Esteve na origem do projecto da Quinta dos Carvalhais, cuja adega foi inaugurada em 1990, ano de lançamento do primeiro Duque de Viseu. No mesmo ano, Manuel Vieira vinificou também o primeiro branco de Encruzado com fermentação em barrica, à moda da Borgonha. Foi o início de um trabalho notável na recuperação e promoção das melhores castas do Dão, desde a branca Encruzado às tintas Touriga Nacional, Alfrocheiro, Tinta Roriz e Jaen. Em duas décadas, em boa parte graças ao trabalho de Manuel Vieira, a Quinta dos Carvalhais desenvolveu um gama de vinhos notáveis, entre brancos, tintos, espumantes e colheitas tardias, e tornou-se numa referência no Dão. Hoje, Manuel Vieira já não trabalha na Sogrape. Reformou-se e foi substituído por Beatriz Cabral de Almeida, que já criou um novo vinho tinto, o Grão Vasco Prova Maestra. O primeiro Reserva, de 2013, saiu recentemente e é um belo tinto, muito elegante, fresco e gastronómico. Mas o “senhor Encruzado”, como ficou conhecido, continua ligado ao Dão, agora como consultor do projecto Caminhos Cruzados. P.G.
Álvaro de Castro (Quinta da Pellada)
Álvaro de Castro é o rosto e a alma dos vinhos das Quintas da Pellada e de Saes, em Pinhanços, Seia. Fixou-se no Dão em 1980, quando herdou a Pellada e passou a dedicar-se em exclusivo à produção de vinho. Desde então, e apesar de não ser enólogo (é formado em Engenharia Civil), criou alguns dos mais extraordinários vinhos da região, como o branco Pellada Primus e os tintos Quinta da Pellada, Quinta da Pellada Carrossel, Pape e Doda, este em parceria com Dirk Niepoort. Álvaro de Castro interrompeu um hiato de duas gerações na produção de vinho na família e já tem sucessor, a filha Maria Castro, que partilha com o bairradino Athaíde Semedo a enologia da empresa. Juntamente com Luís Lourenço, o proprietário da Quinta dos Roques, Álvaro de Castro está para o Dão como Luís Pato está para a Bairrada, por exemplo. P.G.
Nuno Cancela de Abreu (Quinta da Fonte do Ouro)
Nuno Cancela de Abreu começou a sua carreira no Douro, onde, entre 1981 1987, dirigiu a Associação de Desenvolvimento da Viticultura Duriense (ADVID). Foi docente durante dois anos na UTAD, no curso de enologia, apesar de ter formado no ISA, em Lisboa. Deixou o Douro em 1987 para ir trabalhar na Quinta da Romeira, em Bucelas, onde foi gerente e enólogo até 2001. Pelo meio, em 1991, cedeu ao chamamento da tradição familiar e deu início ao seu próprio projecto no Dão, com as marcas Quinta da Fonte do Ouro e Quinta da Giesta. Entre 2001 e 2010, acumulou este projecto com uma nova experiência profissional, desta vez na Quinta da Alorna, no Ribatejo, que restruturou de cima abaixo. A partir de 2010, concentrou-se nos seus vinhos. É um dos grandes técnicos de viticultura e enologia do país. A sua ida para o Dão é a prova de que a região, de forma gradual, está a começar a atrair a massa crítica que lhe faltava. P. G.
Três Júniores
Paulo Nunes
(Casa da Passarela)
A Passarela é uma das casas históricas do Dão, mas, como muitas outras, também entrou num acentuado declínio no último quartel do século XX. Em 2008 mudou de proprietário (foi comprada pela família Cabral, a quem terá saído o Euromilhões) e, desde então, voltou a estar nas bocas do mundo. A casa foi reconstruída, foram plantadas vinhas novas e recuperadas as mais velhas já existentes, a adega sofreu obras de modernização e a imagem e a qualidade dos vinhos mudaram do dia para a noite. O homem que está por trás desta mudança é Paulo Nunes, de 40 anos, um técnico que, antes de entrar na Passarela, integrou a equipa da Vine &Wines, liderada por João Paulo Gouveia (vinhos Pedra Cancela), um dos mais prolixos consultores enológicos do Dão, a par de António Narciso.
Paulo Nunes tem vindo a criar vinhos surpreendentes, apostando na diferenciação. “As pessoas estão cada vez mais ávidas de vinhos diferentes”, justifica. Uma linha de vinhos procura contar a história da Passarela e contempla marcas como o Enólogo e o Abanico. No topo está o Villa Oliveira, que recupera uma marca antiga da casa. A outra linha privilegia a criatividade e a inovação. São os chamados vinhos “Fugitivos”, vinhos fora da caixa e sem a mesma pressão comercial. O mais recente é o tinto Fugitivo Vinhas Centenárias, feito a partir de uma vinha muito velha maioritariamente plantada com Baga (alguns estudos recentes apontam para a possibilidade da Baga ser originária do Dão e não na Bairrada). P.G.
Tavares de Pina (Terras de Tavares)
Pela idade, Tavares de Pina já é um “sénior”. Mas a sua irreverência e a forma como insiste em fazer vinhos clássicos, com pouco sex appeal mas muito fiéis à tradição e tipicismo do Dão, fazem dele um eterno jovem inconformado, um irredutível gaulês nas terras de Viriato. Depois de ter passado pela Sogrape, Tavares de Pina começou em 1990 a fazer os vinhos da família na Quinta da Boavista, em Penalva do Castelo. Os vinhos que produz expressam verdadeiramente as castas e o lugar e possuem uma extraordinária vocação gastronómica. No que faz, não há espaço para maquilhagens ou modernices saloias. Os melhores vinhos aguardam vários anos em cave antes de sair para o mercado. Já são poucos os produtores do Dão que se dão a este luxo, mas não foi com vinhos novos que a região criou a sua fama. Os vinhos do Dão precisam de tempo para mostrarem todo o seu potencial e os vinhos de Tavares de Pina, em especial os Terras de Tavares, são um bom exemplo. O seu tinto Terras de Tavares Reserva 1997, por exemplo, está agora no auge. P.G.
António Madeira
(António Madeira Vinhas)
António Madeira é um jovem luso-descendente com raízes no Dão. Engenheiro de logística em Paris, começou há uns anos a procurar no sopé da serra da Estrela vinhas velhas com castas locais onde pudesse fazer “Grands Crus”. Ele acredita que é nesta sub-região, de solos graníticos, que os vinhos se mostram “mais finos, frescos, austeros e minerais”. Romântico e de uma simplicidade desconcertante, António Madeira sonha um dia poder deixar o emprego em Paris para passar a viver do vinho no Dão. Por agora, produz poucas centenas de garrafas, a partir de pequenas parcelas de vinha abandonadas que tem vindo a recuperar na aldeia de Santa Marinha (Seia) e em povoações vizinhas. O seu primeiro vinho, o tinto António Madeira Vinhas Velhas 2011 (feito na adega da Quinta da Pellada e vendido pela Niepoort Projectos), tem origem numa pequena vinha que já não era podada há três anos. Tomou conta dela em 2010 e nesse ano apenas colheu 80 quilos de uvas. Nesta vinha predominam as castas Tinta Pinheira, Camarate e Tinta Amarela, um triunvirato de variedades que já pouca gente utiliza no Dão. António é uma espécie de arqueólogo do vinho, um defensor acérrimo da tradição e da intervenção mínima na vinha e na adega. Não é pelo que produz e vende que se tem destacado, embora já seja encarado pela crítica como uma estrela emergente no sector. O seu grande mérito é mostrar que o futuro do Dão está no seu passado, em métodos de vinificação tradicionais, em vinhas velhas que estão a ser abandonadas ou destruídas, em castas locais pouco conhecidas mas com grande potencial para fazer vinhos únicos. P.G.
Três séniores
Manuel Vieira (ex-Sogrape)
Manuel Vieira chegou ao Dão, vindo do Douro, no final dos anos 80 do século passado. Encontrou uma região em crise, dominada por cooperativas amadoras, com pouco muito pouco trabalho académico disponível e algumas das melhores castas a caminho da extinção. Esteve na origem do projecto da Quinta dos Carvalhais, cuja adega foi inaugurada em 1990, ano de lançamento do primeiro Duque de Viseu. No mesmo ano, Manuel Vieira vinificou também o primeiro branco de Encruzado com fermentação em barrica, à moda da Borgonha. Foi o início de um trabalho notável na recuperação e promoção das melhores castas do Dão, desde a branca Encruzado às tintas Touriga Nacional, Alfrocheiro, Tinta Roriz e Jaen. Em duas décadas, em boa parte graças ao trabalho de Manuel Vieira, a Quinta dos Carvalhais desenvolveu um gama de vinhos notáveis, entre brancos, tintos, espumantes e colheitas tardias, e tornou-se numa referência no Dão. Hoje, Manuel Vieira já não trabalha na Sogrape. Reformou-se e foi substituído por Beatriz Cabral de Almeida, que já criou um novo vinho tinto, o Grão Vasco Prova Maestra. O primeiro Reserva, de 2013, saiu recentemente e é um belo tinto, muito elegante, fresco e gastronómico. Mas o “senhor Encruzado”, como ficou conhecido, continua ligado ao Dão, agora como consultor do projecto Caminhos Cruzados. P.G.
Álvaro de Castro (Quinta da Pellada)
Álvaro de Castro é o rosto e a alma dos vinhos das Quintas da Pellada e de Saes, em Pinhanços, Seia. Fixou-se no Dão em 1980, quando herdou a Pellada e passou a dedicar-se em exclusivo à produção de vinho. Desde então, e apesar de não ser enólogo (é formado em Engenharia Civil), criou alguns dos mais extraordinários vinhos da região, como o branco Pellada Primus e os tintos Quinta da Pellada, Quinta da Pellada Carrossel, Pape e Doda, este em parceria com Dirk Niepoort. Álvaro de Castro interrompeu um hiato de duas gerações na produção de vinho na família e já tem sucessor, a filha Maria Castro, que partilha com o bairradino Athaíde Semedo a enologia da empresa. Juntamente com Luís Lourenço, o proprietário da Quinta dos Roques, Álvaro de Castro é hoje um dos mais renomados e consistentes produtores do Dão. Está para o Dão como Luís Pato está para a Bairrada, por exemplo. P.G.
Nuno Cancela de Abreu (Quinta da Fonte do Ouro)
Nuno Cancela de Abreu começou a sua carreira no Douro, onde, entre 1981 1987, dirigiu a Associação de Desenvolvimento da Viticultura Duriense (ADVID). Foi docente durante dois anos na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, no curso de enologia, apesar de ter formado no Instituto Superior de Agronomia, em Lisboa. Deixou o Douro em 1987 para ir trabalhar na Quinta da Romeira, em Bucelas, onde foi gerente e enólogo até 2001. Pelo meio, em 1991, cedeu ao chamamento da tradição familiar na produção de vinho e deu início ao seu próprio projecto no Dão, com as marcas Quinta da Fonte do Ouro e Quinta da Giesta. Entre 2001 e 2010, acumulou este projecto com uma nova experiência profissional, desta vez na Quinta da Alorna, no Ribatejo, que restruturou de cima abaixo. A partir de 2010, concentrou-se nos seus vinhos. É um dos grandes técnicos de viticultura e enologia do país. A sua ida para o Dão é a prova de que a região, de forma gradual, está a começar a atrair a massa crítica que lhe faltava. P. G.
Três Júniores
Tavares de Pina (Terras de Tavares)
Pela idade, Tavares de Pina já é um “sénior”. Mas a sua irreverência e a forma como insiste em fazer vinhos clássicos, com pouco sex appeal mas muito fiéis à tradição e tipicismo do Dão, fazem dele um eterno jovem inconformado, um irredutível gaulês nas terras de Viriato. Depois de ter passado pela Sogrape, Tavares de Pina começou em 1990 a fazer os vinhos da família na Quinta da Boavista, em Penalva do Castelo. Os vinhos que produz expressam verdadeiramente as castas e o lugar e possuem uma extraordinária vocação gastronómica. No que faz, não há espaço para maquilhagens ou modernices saloias. Os melhores vinhos aguardam vários anos em cave antes de sair para o mercado. Já são poucos os produtores do Dão que se dão a este luxo, mas não foi com vinhos novos que a região criou a sua fama. Os vinhos do Dão precisam de tempo para mostrarem todo o seu potencial e os vinhos de Tavares de Pina, em especial os Terras de Tavares, são um bom exemplo. O seu tinto Terras de Tavares Reserva 1997, por exemplo, está agora no auge. P.G.
Paulo Nunes (Casa da Passarela)
A Passarela é uma das casas históricas do Dão, mas, como muitas outras, também entrou num acentuado declínio no último quartel do século XX. Em 2008 mudou de proprietário (foi comprada pela família Cabral, a quem terá saído o Euromilhões) e, desde então, voltou a estar nas bocas do mundo. A casa foi reconstruída, foram plantadas vinhas novas e recuperadas as mais velhas já existentes, a adega sofreu obras de modernização e a imagem e a qualidade dos vinhos mudaram do dia para a noite. O homem que está por trás desta mudança é Paulo Nunes, de 40 anos, um técnico que, antes de entrar na Passarela, integrou a equipa da Vine &Wines, liderada por João Paulo Gouveia (vinhos Pedra Cancela), um dos mais prolixos consultores enológicos do Dão, a par de António Narciso.
Paulo Nunes tem vindo a criar vinhos surpreendentes, apostando na diferenciação. “As pessoas estão cada vez mais ávidas de vinhos diferentes”, justifica. Uma linha de vinhos procura contar a história da Passarela e contempla marcas como o Enólogo e o Abanico. No topo está o Villa Oliveira, que recupera uma marca antiga da casa. A outra linha privilegia a criatividade e a inovação. São os chamados vinhos “Fugitivos”, vinhos fora da caixa e sem a mesma pressão comercial. O mais recente é o tinto Fugitivo Vinhas Centenárias, feito a partir de uma vinha muito velha maioritariamente plantada com Baga (alguns estudos recentes apontam para a possibilidade da Baga ser originária do Dão e não na Bairrada). P.G.
António Madeira (António Madeira Vinhas)
António Madeira é um jovem luso-descendente com raízes no Dão. Engenheiro de logística em Paris, começou há uns anos a procurar no sopé da serra da Estrela vinhas velhas com castas locais onde pudesse fazer “Grands Crus”. Ele acredita que é nesta sub-região, de solos graníticos, que os vinhos se mostram “mais finos, frescos, austeros e minerais”. Romântico e de uma simplicidade desconcertante, António Madeira sonha um dia poder deixar o emprego em Paris para passar a viver do vinho no Dão. Por agora, produz poucas centenas de garrafas, a partir de pequenas parcelas de vinha abandonadas que tem vindo a recuperar na aldeia de Santa Marinha (Seia) e em povoações vizinhas. O seu primeiro vinho, o tinto António Madeira Vinhas Velhas 2011 (feito na adega da Quinta da Pellada e vendido pela Niepoort Projectos), tem origem numa pequena vinha que já não era podada há três anos. Tomou conta dela em 2010 e nesse ano apenas colheu 80 quilos de uvas. Nesta vinha predominam as castas Tinta Pinheira, Camarate e Tinta Amarela, um triunvirato de variedades que já pouca gente utiliza no Dão. António é uma espécie de arqueólogo do vinho, um defensor acérrimo da tradição e da intervenção mínima na vinha e na adega. Não é pelo que produz e vende que se tem destacado, embora já seja encarado pela crítica como uma estrela emergente no sector. O seu grande mérito é mostrar que o futuro do Dão está no seu passado, em métodos de vinificação tradicionais, em vinhas velhas que estão a ser abandonadas ou destruídas, em castas locais pouco conhecidas mas com grande potencial para fazer vinhos únicos. P.G.