Fugas - Vinhos

Dato Daraselia

Burmester e Kopke, as jóias da coroa

Por Rui Falcão

O vinho do Porto sofreu e continua a passar por momentos de dificuldade e angústia, problemas que se têm acentuado ao longo da última década.

Os vinhos mais jovens continuam a ser admiráveis e a última década e meia terá mesmo sido uma das mais prolíficas de sempre, com declarações extraordinárias que se estendem pelos anos 2000, 2003 e 2007, rematados com a estrondosa declaração de 2011.

Mas apesar da excelência dos vinhos a verdade é que as sucessivas crises financeiras que assolaram os principais mercados do vinho do Porto não acrescentaram tranquilidade ao sector. A somar à crise financeira internacional juntaram-se ainda factores culturais e conjunturais, como a tendência internacional para uma vida mais light e “saudável”, tendência que evangeliza à abstinência dos vinhos doces. Como se o mundo não estivesse já pleno de contrariedades, temos ainda de somar ao rol o envelhecimento progressivo da imagem do vinho do Porto e dos seus admiradores, que estão maioritariamente associados a um segmento etário pouco jovem.

Poderíamos pensar que esta triste soma de circunstâncias seriam desgraças suficientes para assustar um dos sectores da economia portuguesa que dá mais prestígio e notoriedade a Portugal mas infelizmente não é assim que reza a história recente. Aos dramas importados da realidade económica, tivemos de acrescentar uma guerra de preços fratricida entre empresas e grupos concorrentes que ajudou a conduzir o vinho do Porto para caminhos menos recomendáveis e pouco condizentes com os seus pergaminhos.

A boa notícia é que os problemas são conhecidos, estão estudados e identificados, estão analisados e são passíveis de serem debelados se forem atacados a tempo. Uma empreitada que obriga a que o esforço seja mais ou menos conjunto e que as empresas empreendam um caminho consequente e estruturado. Entre as muitas opções para o sucesso encontra-se o investimento em segmentos de mercados até aqui pouco explorados, nomeadamente na aposta decidida nos vinhos do Porto brancos e no segmento dos vinhos tawnies, mais elitista.

Uma das tendências relativamente inesperadas assenta na oferta recente do vinho do Porto branco, seja nas categorias de vinhos com indicação de idade ou nos Colheita, abrindo novos mercados em que durante anos pouco acreditaram. As surpresas têm sido muitas e interessantes, assegurando um novo capítulo para o vinho do Porto, desbravando novos mercados num nicho que favorece a imagem de alguns produtores menos mediáticos. Neste consistório merecem especial relevo e panegírico o pioneirismo da Andresen, bem como a excelência dos Dalva Colheita e dos Kopke com indicação de idade.

A última década e meia foi caracterizada também por uma concentração orgânica do sector, pelo forte investimento estrangeiro conduzindo à criação de grandes grupos que agregaram marcas históricas de vinho do Porto. A Sogevinus retrata parte dessa nova realidade do vinho do Porto, reunindo quatro nomes de referência sobejamente conhecidos dos consumidores portugueses, Barros, Cálem, Kopke e Burmester, quatro dos nomes incontornáveis de um dos maiores vinhos generosos feito pelo homem.

Kopke e Burmester destacam-se claramente, entrando decididamente no capítulo da excelência, dividindo tarefas de forma quase exemplar. Enquanto a Kopke brilha de forma especial nos vinhos do Porto brancos, categoria onde poucos conseguem lustrar, a Burmester assombra no capítulo dos tawnies, muito especialmente no sempre difícil e delicado universo dos Colheita.

É nos vinhos do Porto Colheita que a Burmester se excede, atingindo patamares qualitativos verdadeiramente excepcionais que revelam uma sensibilidade para o estilo fora do comum. Um estilo que é especialmente difícil e exigente na qualidade dos vinhos base, uma família que não permite imperfeições, impondo um rigor e sensibilidade que poucas casas conseguem compreender e acertar. Não é fácil ou simples manter um vinho de uma só colheita em condições perfeitas sem perder riqueza ou complexidade, sem deixar que o cansaço se apodere dele, sem evidenciar sintomas de velhice mantendo ao mesmo tempo uma frescura retemperadora que torne o vinho jovial, rico e emocionante.

Porque de facto falamos de frescura quando discutimos sobre a excelência dos Porto Colheita. E frescura é simultaneamente o conceito mais decisivo e mais difícil de alcançar na família dos Colheita. E é de frescura que falamos quando provamos os vinhos Colheita da Burmester, como tive ocasião de fazer recentemente em Gaia, numa prova que facilmente nos eleva ao céu. Uma frescura recorrente e transversal mas que é ainda mais visível na excelência do Burmester Colheita 1952, um dos grandes da categoria. Mas, mesmo nos vinhos mais “jovens”, de 1989, por exemplo, a frescura e riqueza estão presentes no nariz e boca com um descaramento que anima a alma e refresca o final de boca.

Nos vinhos da Kopke o que mais sobressalta e provoca arrepios é o entusiasmo do Kopke White 30 Anos, um vinho do Porto branco brilhante, vivo e poderoso, meloso mas intenso e subtil, vibrante mas simultaneamente delicado e civilizado. Um grande vinho do Porto que termina enérgico, sério, vivaço e alegre.

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