Fugas - Vinhos

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Há um novo vinho que emergiu da água

Por Bárbara Wong

O Conde d'Ervideira Vinho de Água esteve mergulhado nas águas do Alqueva e isso faz toda a diferença. Milhares de garrafas passam por este estágio.

Há um barco que navega devagar, muito próximo do cais e dois mergulhadores que desaparecem dentro de água. Do interior do barco espreitam Duarte Leal da Costa e Nelson Rolo, o director-geral e o enólogo da Ervideira, respectivamente. O mergulhador emerge e com ele um grito de satisfação. Foi encontrada uma das seis caixas que a empresa fez submergir no Alqueva, junto à Marina da Amieira, em Junho e em Outubro passados.

O barco aproxima-se da margem e os dois responsáveis saltam satisfeitos para terra firme. Em simultâneo, há um carro com tracção às quatro rodas que puxa uma corda, na ponta desta está a caixa de plástico cinzento que alberga 350 garrafas de vinho tinto, uma reserva de 2014 que esteve a estagiar no fundo do rio, durante vários meses. É o Conde d’Ervideira Vinho de Água. “Devagar! Calma! Pára, Narciso”, ouvem-se os gritos de quem gere a operação. A caixa já está junto ao cais e é um monta-cargas que a retira e a pousa num sítio seco. De imediato é rodeada pelos curiosos.

Duarte Leal da Costa aproxima-se e abre a caixa. Esteve, selada, em profundidades entre os 22 e os 36 metros. À sua volta está a família – a mãe, quatro dos cinco irmãos e respectivas famílias –; os distribuidores e outros parceiros; o ministro da Agricultura Capoulas Santos e a secretária de Estado do Turismo Ana Mendes Godinho; diversas entidades ligadas ao Alentejo, ao turismo e ao vinho; e os jornalistas. Todos tentam espreitar para dentro da caixa. Há quem faça selfies com as garrafas como pano de fundo. 

Com uma camisa às riscas azuis e o logótipo da adega da Ervideira no bolso da mesma, a vermelho – com as iniciais do apelido Leal da Costa –, o director-geral olha para as garrafas e é com um sorriso que explica todo o processo. Tudo começou com um sonho. São os sonhos e os desafios que o fazem vibrar e viver, confessará mais tarde, já depois do almoço. “Vamos sonhando e vamos criando”, dirá então, ladeado pela mãe e pelo enólogo. Mas ao final da manhã de sábado, Duarte Leal da Costa opta pela informação: já sabemos que nos naufrágios os vinhos e licores que são resgatados são bons; já outros fizeram esta experiência, com melhores ou piores resultados, quer em Portugal, quer em França, por exemplo, por isso, a Ervideira não é a primeira a experimentar estagiar os vinhos debaixo de água.

No entanto, os resultados são positivos e se não o fossem o produtor vitivinícola alentejano não estaria disposto a, ao mesmo tempo que retira as seis caixas, de ter outras já alinhadas para entrarem no rio – “oito a dez mil garrafas”, informa. Ali, por ser o Grande Lago do Alqueva, a temperatura e a luminosidade são as mesmas, de Verão e de Inverno; não há correntes, logo as caixas não se perdem, nem o seu conteúdo se destrói – estas são resgatadas com a ajuda dos bombeiros de Portel, Reguengos e Lourão. Antes de entrarem dentro de água, as garrafas são certificadas pela Comissão Vitivinícola Regional Alentejana.

E depois de um passeio de barco pelo lago, é tempo de almoçar e experimentar o vinho, uma mistura de várias castas: Touriga Nacional, Aragonês, Alicante Bouschet e Cabernet Sauvignon. A cada conviva são dados dois copos, ambos com o mesmo vinho, a reserva Conde d’Ervideira 2014. As diferenças? O primeiro estagiou em barricas de carvalho francês e foi engarrafado. O segundo também, mas depois estagiou dentro de água. Se as garrafas são iguais, os rótulos nem por isso: o primeiro é tradicional com letras douradas num fundo negro; o segundo é branco com linhas que lembram a paisagem onde o vinho estagiou.

Olhando para os copos também se notam diferenças: o primeiro é um vinho com um tom mais castanho, o segundo é bordeaux. E por fim o sabor: o primeiro é um vinho tipicamente alentejano, mais complexo, mais forte; o segundo é um vinho redondo, mais suave e elegante. Os preços também são distintos: o primeiro custa 14 euros; o segundo 19,50 euros. À venda apenas em garrafeiras e restaurantes, e não em supermercados.

Duarte Leal da Costa percorre as mesas do restaurante do Amieira Marina, curioso, perguntando pelas reacções. Fica feliz pela opinião mais ou menos unânime. “O novo [o vinho de água] tem potencial de envelhecimento”, atira. O segredo? “Aqui o grande efeito não é pôr dentro de água, mas a pressão”, explica.

Quando as garrafas chegam à superfície são vistas uma a uma, antes de se lhes por o rótulo, para verificar se está tudo bem, se não há lacres partidos – o lacre vermelho que as protegeu, perdeu a cor brilhante e é agora de um cor-de-laranja baço –, rolhas dentro da garrafa ou alguma quebrada. Uma pequeníssima percentagem, assegura.

O director-geral congratula-se pela inovação que tem associado à marca. A Ervideira foi a primeira, em 2009 a criar um vinho branco com castas tintas, o Invisível. Foi a primeira a certificar espumantes no Alentejo. “O nosso trabalho é ir sonhando”, conclui, por isso agradece à mãe a oportunidade que lhes dá, a ele e a Nelson Rolo para sonharem.

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