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Os "blancs de noir" da Bairrada à procura de um palco internacional

Por José Augusto Moreira

Após mais de um século a produzir espumantes, a região da Bairrada decidiu apostar na sua casta mais consagrada para lançar um projecto inovador. O projecto Baga Bairrada quer levar ao mundo um espumante especial e diferente.

Berço do espumante em Portugal, a Bairrada quer saltar as barreiras internas e fazer dos vinhos efervescentes da região um valor de exportação e uma bandeira de qualidade que vai ter como base a diferença. Argumentos não faltam: uma larga história na produção de espumantes, sendo de longe a mais antiga e reconhecida do país; capacidade e conhecimento instalados, com renovação geracional e tecnológica nos últimos anos; características e qualidades distintivas dos vinhos; e uma casta, a Baga, especialmente apta e bem aceite por especialistas e consumidores.


Foi com base nestes pressupostos que há menos de um ano os responsáveis bairradinos avançaram com um projecto destinado a criar uma marca potenciadora da qualidade dos seus espumantes e capaz de sustentar o seu avanço para os mercados de exportação. O mote foi então lançado: “Uma região, uma casta, um espumante”. Baga Bairrada seria a designação para agregar estes valores. 

“Está a correr muito bem e são cada vez mais os produtores que pedem informações sobre o projecto” regozija-se o líder da Comissão de Vitivinícola Regional da Bairrada (CVRB), Pedro Soares. Aos cinco produtores que estiveram no arranque do conceito juntaram-se logo outros dois (ver fichas), “e em poucos meses, até ao final do ano, lançaram para o mercado 280 mil garrafas”. Actualmente há mais três casas que pediram a certificação (Casa de Saima, Casa Sarmento e Luís Pato) e são já mais de seis mil as garrafas de espumantes Baga a estagiar nas caves da região.

Também de fora os sinais que chegam são animadores. “Tivemos uma acção de promoção em Londres e tanto o conceito, como a qualidade e os preços foram muito elogiados”, destaca o presidente da comissão. “Temos conseguido aquilo que queremos, que é valorizar os vinhos com base na casta Baga e colocar o foco na região da Bairrada”, acentua Pedro Soares.

Histórico defensor (e divulgador) do potencial da Baga, Luís Pato diz que o projecto “é uma excelente ideia” e tem também tudo para “poder viajar pelo mundo”. Alerta, no entanto, para alguns requisitos de qualidade que considera essenciais. “A expressão da Baga é um rosado ou de um branco de uvas tintas, e os vinhos demasiado brancos ou com pouco estágio não adquirem as características do terroir”, expõe, para explicar que o que distingue os espumantes bairradinos é a acidez natural e o sabor tostado, característica do Champanhe, que lhes é conferido pelos solos argilo-calcários”. Ora, “sem o necessário tempo de estágio e quando se tira demasiado a cor, tiram-se também essas características”, adverte.

O seu primeiro Baga Bairrada, da colheita de 2015, só vai chegar ao consumidor lá para meados de 2018. “É tudo feito ao contrário, com hiperoxigenação e sem necessidade de sulfuroso quando for colocada a rolha”, desafia, prometendo que “vai ter o carácter do barro da Vinha Pan”, a parcela donde saem os seus vinhos mais prestigiados.
Exigências de qualidade

O projecto foi lançado na altura em que a CVRB assinalava os 125 anos do início da produção dos primeiros vinhos espumantizados pelo método clássico de fermentação em garrafa na região, uma obra iniciada pelo engenheiro Tavares da Silva, na então Escola Prática de Viticultura e Enologia que deu lugar à actual Estação Vitivinícola da Bairrada. Ao conhecimento acumulado ao longo de mais de um século junta-se o evidente incremento de qualidade que tem varrido vinhas e adegas, principalmente na última década, e o movimento de renovação e busca de identidade para os vinhos que por ali se fazem, que envolve projectos como o dos Baga Friends, o “Outrora” e o “Vadio”, entre outros.

Nas clássicas caves, a vida é claramente agora outra, não só com a reconversão tecnológica mas também com a qualificação dos técnicos, que tornaram possível o controlo de todo o processo de produção. O trabalho começou nas vinhas próprias, com o conhecimento aprofundado de castas e territórios e continuou nas adegas. Na mudança estiveram casas históricas como as Caves S. João, São Domingos, Montanha, Primavera ou Aliança, que deixaram de alimentar a produção com vinhos comprados a granel, a que se associam produtores de nova geração como as casas Campolargo, Colinas de S. Lourenço e, mais recentemente, a Rama & Selas. Ou ainda o assinalável exemplo de consistência que constitui a Adega Cooperativa de Cantanhede. E, claro, produtores empenhados numa procura de identidade e carácter, como são os casos da família Pato - Luís, o pai, e a filha Filipa -, ou a Quinta das Bágeiras.

É neste contexto de renovação e orientação para a qualidade que a Baga emerge como casta com potencial identitário e como símbolo da ideia de Bairrada. A Baga há muito que se estava a impor pelo carácter extraordinário dos seus vinhos tintos, excelentes para envelhecer em garrafa. Mas sabe-se também que a sua maturação tardia levanta problemas à agricultura e faz com que as suas qualidades só se revelem por completo nos anos em que a vindima se faz antes da chegada das chuvas. E essa não é, claramente, a regra.

Para os produtores, o projecto Baga Bairrada dá uma ajuda a superar esse constrangimento. Uma vez que o grau de maturação das uvas para se fazer espumante é menor do que, por exemplo, para os vinhos tintos, os produtores têm mais possibilidades de fazer a vindima antes das chuvas, correndo assim menos riscos. Depois de vindimarem a uva Baga para espumantes, podem esperar mais alguns dias ou semanas pela maturação ideal e pelo clima apropriado para fazerem os grandes vinhos tintos.
E no que respeita à qualidade, Luís Pato não tem dúvida de que “acabará por ser uma exigência do mercado”. Até porque “se a Baga que se produz é demasiada quando pensamos em vinhos tintos, é já muito pouca quando pensamos na produção de espumantes”. E o presidente da CVRB explica que “no último ano já houve quem não tivesse conseguido encontrar varas de Baga para plantar”, sintoma da confiança e do regresso da Baga como a casta que identifica a região.

Luís Pato considera que “o projecto é uma excelente forma de valorizar a Bairrada”, vendo-o também como mais um efeito da acção dos Baga Friends. “Para mim é até um orgulho, depois de 30 anos contra a corrente a defender a Baga”, sublinha, confessando nunca ter acreditado “que fosse possível em tão pouco tempo inverter o ciclo da Baga”. E esse é, por enquanto, o maior feito para Pedro Soares: “Conseguiu-se já inverter o ciclo de abandono e arranque de Baga”.

O número de produtores de qualidade que recorrem à Baga para a produção de espumantes não tem parado de aumentar. Por vezes, a Baga é associada a castas brancas típicas da região. Mas é crescente a aceitação e reconhecimento dos blanc de noir (brancos de uvas tintas) produzidos em exclusivo a partir da casta emblemática da região. Além da estrutura e complexidade aromática, os Baga caracterizam-se também pela cremosidade, mineralidade e boa apetência gastronómica.

Para alguns dos produtores mais consagrados, a região precisava de um novo fôlego para reforçar o prestígio dos seus espumantes. É que se a Bairrada produz por ano cerca de oito milhões de garrafas, cerca de 65% da produção anual de espumantes portugueses, apenas uma pequena parte (cerca de 1,5 milhões de garrafas) é certificada, com as inerentes dificuldades de controlo de qualidade.

As regras do Baga Bairrada entraram em vigor em meados do ano passado. Pretende-se que os seus espumantes sejam brancos de uvas tintas, mas os rosés e tintos não estão excluídos. Os espumantes ideais devem ter 100% de Baga, mas podem entrar na designação se tiverem pelo menos 85% desta casta no corte final. A sua acidez total deve estar acima dos 5,5 g/l e a referência ao ano de colheita é obrigatória.
A esperança dos produtores e da CVR é que o projecto arraste um aumento de certificação e consequente controlo de qualidade, sem guerras de preços e potenciando a imagem e a identidade dos espumantes. Com uma expectativa de 250 mil garrafas vendidas no ano de arranque, os números apontam já para um milhão em 2018, cerca de 10% da produção nacional.  

À mesa, os Baga Bairrada já se batem com os populares Cava e até com muitos Champanhe. Mas, em termos de vendas e prestígio ainda há muito caminho para andar. A marcha só agora está a dar os primeiros passos.

Os Baga Bairrada que já estão no mercado

Quinta do Poço do Lobo
Baga Bruto Natural 2013
 Álcool: 11,8% vol
Acidez Total: 6,56 g/l
Aroma intenso de frutos vermelhos frescos, ligeira tosta.
Fresco, seco e longo na boca.
Estágio em garrafa, sobre borras de nove meses.
 
Aliança Reserva

Baga Bruto 2013
Álcool: 12,5% vol
Acidez total: 5,8 g/l
Aroma frutado, complexo e intenso. Sensações de frutos maduros, suave, cremoso e persistente na boca.
Estágio de 12 meses em garrafa.
 
Marquês de Marialva
Baga Bruto 2013
Álcool: 12,5% vol
Acidez total: 6,5 g/l
Bolha muito fina, aromas de frutos vermelhos. Sabor frutado, mousse elegante, fresco e persistente.
Estágio mínimo de 12 meses + um após degorgement.
 
São Domingos
Baga Bruto 2008
Álcool: 12% vol
Acidez total: 8,53 g/l
Bolha fina e persistente, aromas frescos de fruta exótica. Sensações de pão torrado, vivo e persistente.
Estágio mínimo de 24 meses + dois após degorgement.
 
Rama & Selas
Blanc de Noir Brut Nature 2013
Álcool: 12% vol
Acidez Total: 7,7 g/l
Bolha muito fina, aroma frutado com notas de frita de polpa branca.
Boa estrutura, mousse, complexidade e harmonia
de boca.
Estágio mínimo de 15 meses.
 
Primavera Baga
Extra Bruto 2013
 Álcool: 12% vol
Acidez total: 6,7 g/l
Aromas delicados de frutos vermelhos silvestres e lácteos.
Sabor frutado, com elegância, corpo e final prolongado.
Estágio de nove meses mais um após degorgement.
 
Caves da Montanha
Grande Cuvée 2009
Baga Super Reserva
 Álcool: 12,5% vol
Bolha fina, aromas finos de fruta madura com ligeiro vegetal à mistura. Boca com boa mousse e sensações de frescura.
Estágio mínimo de três anos

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