Fugas - Vinhos

  • Hugo Santos
  • Hugo Santos
  • Hugo Santos

Os Vinhos Verdes mais chegados ao Douro

Por José Augusto Moreira

Socalcos imponentes, respeito pela natureza, castas há muito adaptadas, como a Avesso ou a Arinto, e vinhas centenárias anunciam um grande futuro para os vinhos da Quinta de Santa Teresa, uma pérola que esteve no anonimato e quase abandonada.

É imponente a Quinta de Santa Teresa. Em socalcos, o rio Douro a brilhar lá mais ao fundo, encostas íngremes e coroadas de vegetação em toda a volta, com os vinhedos dourados que por esta altura lhe emprestam um ar ainda mais nobre e distinto. Uma pérola com 60 hectares, 34 de vinha, que se alonga, sinuosa, acompanhando o rio Teixeira prestes a entregar-se nas águas do Douro.

E, no entanto, estamos nos Vinhos Verdes. É certo que por poucos metros, já que é no limite da propriedade que está o Douro, a delimitação com o concelho de Mesão Frio e o distrito de Vila Real. Os portões altos pintados de um azul viçoso e os consistentes muros de granito logo denunciam um contexto especial. Há que entrar!
Circula-se até à casa apalaçada por arruamentos de paralelos e geometria cuidada que vão torneando os socalcos encosta acima. Há escadarias a ligar os patamares, reservatórios de água em pontos estratégicos, casas de apoio à actividade agrícola e canteiros floridos.

Tudo em pedra lavrada e projectada esquadria, tal com o casarão, em posição estratégica e rodeado por jardins com espelhos de água, estatuetas e esculturas em ferro. Há também, a meia encosta, um bosque romântico com espécies de floresta exótica e, na parte superior, uma zona balnear com piscina e caixa de saltos. Em pedra granítica criteriosamente trabalhada.

Uma pérola que esteve quase ao abandono demasiado tempo, como bem ainda o demonstra a degradação da adega, as casas dos caseiros, as zonas de lazer e os aposentos outrora destinados aos animais da quinta.

Alexandre e Dialina encontraram-na no início do ano passado, quando procuravam um pouco mais de vinha e uma adega com condições para estabilizar as produções da Casa do Arrabalde e da Quinta dos Espinhosos, ambas situadas uns quilómetros abaixo e igualmente no concelho de Baião. Estava muito para além daquilo que buscavam mas a paixão foi irresistível.

O casal tem empresa, formação e carreira na área da electrónica e software, mas partilha também a paixão pelos vinhos e a tradição familiar de produção. Da herança ao negócio foi um lento caminho de quase duas décadas, mas daí à expansão e especialização foi um fósforo.

 “As vinhas da Casa do Arrabalde já eram dos avós e foi a partir de 1991 que começámos a reestruturar. Tirámos as ramadas antigas e plantámos Avesso, Arinto e Alvarinho. É uma zona fresca, nos contrafortes do Marão, com altitude média à volta dos 600 metros e um ciclo vegetativo curto, o que nos fez optar pela introdução do Alvarinho”, explica Alexandre Gomes.

Com produção vendida a granel, boas colheitas e qualidade sempre em crescendo só em 2005 veio a decisão de engarrafar e enfrentar o negócio. O casal cria a empresa A&D Wines, lança o primeiro Arrabalde e avança para a aquisição da Quinta dos Espinhosos, com adega e 6,5 hectares de vinha que juntam aos 5,5 da propriedade de família. “Reestruturámos as vinhas de Avesso e plantámos Chardonnay com o qual pensamos compensar alguma falta de estrutura do Avesso”, avança Alexandre.

Em 2009 surge o primeiro Espinhosos, mas o auge da crise financeira afasta qualquer ideia de expansão no mercado interno e a compra de mais vinhas. “O que era preciso era vender e foi então que olhámos para a exportação. Começámos pela feira de Londres e a seguir fomos à Prowein [na Alemanha] onde um importador belga gostou dos nossos dois vinhos. Quando chegámos a casa já tínhamos as encomendas no mail”, conta Dialina.

As exportações rapidamente passaram a absorver mais de 90% da produção e além da Europa do Norte também EUA, Canadá e Brasil são destinos privilegiados. Com a Quinta de Santa Teresa, não só as referências passaram de duas para seis como também se acentuou a identidade e diversidade. Falta que o mercado interno descubra agora também aqueles que são os vinhos verdes mais chegados ao Douro.

Um caso à parte na região

Com agricultura em processo de certificação biológica, a enologia está a cargo do experiente Fernando Moura, que selecciona os lotes de Avesso, Arinto e Chardonnay que representam o melhor de cada colheita. São os vinhos Monólogo, em cujo rótulo é acrescentado o número da parcela de onde provêm. No topo está o Singular, também recolhido do lote mais expressivo das vinhas centenárias de Santa Teresa onde a sabedoria da natureza retira o melhor da conjugação de várias castas.

Da colheita de 2015, a primeira, os vinhos mostram um carácter marcado pela fruta madura, já que a vindima teve que esperar pela entrada em funcionamento da adega. As velhas instalações tinham que ser reformuladas e houve que improvisar: uma tenda gigante com todo o equipamento e tecnologia foi a solução e, atenta a qualidade do recheio, bem se pode dizer que se trata de uma verdadeira tenda VIP.
Colhidos na altura ideal e vinificados por parcelas, os vinhos da última colheita prometem já dar prova de todo o potencial da propriedade. Especial atenção aos lotes de Avesso e Alvarinho, que estão extraordinários.

E se os especialistas estão cada vez mais de acordo quanto à importância das características da vinha e condições de produção, Santa Teresa é mesmo um caso à parte nos Vinhos Verdes - exposição privilegiada a Sul e Poente, altitudes que vão dos 100 aos 400 metros e encepamento maioritariamente de Avesso, com base numa reestruturação da vinha efectuada uma década atrás.

Alguns lotes são de vinhas já centenárias, onde a Avesso e a Arinto se misturam com castas como Malvasia e Rabigato. Há também Alvarinho e, na parte mais alta, em zona de planalto e rodeada de bosque, descobre-se uma vinha de Arinto que só de olhar já deixa ver um vinho único. As joaninhas comprovam a mudança em curso para o modo de produção biológico - em toda a propriedade – e os bardos de vinha velha na zona mais alta e arenosa são garantia de identidade.

Mais afastada está a vinha com Vinhão e Touriga Nacional, cujos mostos serão usados para preparar um rosé, talvez já na próxima colheita. É ai que está o marco que assinala da separação entre as regiões dos Vinhos Verdes e do Douro. O senhor Manuel, que há muitas décadas cuida da quinta, recorda os tempos em que para a vindima era necessário levar a Caderneta Predial, já que as autoridades sempre os esperavam no caminho para exigir prova de que as uvas eram dos Verdes.

Casa do Arrabalde

Pontuação: 85
Castas: Avesso, Arinto e Alvarinho
Graduação: 12,5%
Região: Regional Minho
Preço: 6,50€

Aromas florais e tropicais elegantes. Sabor frutado, corpo médio, com secura e frescura final que domina as sensações de fruta madura. Aptidão gastronómica e capacidade de para evoluirem.

Espinhosos

Pontuação: 84
Castas: Avesso e Chardonnay
Graduação: 13%
Região: Regional Minho
Preço: 6,50€

Aromas de couve e ervas frescas. Boca elegante e redonda, com frescura dominante e final muito frutado.

Monólogo Arinto P24

Pontuação: 88
Castas: Arinto
Graduação: 13,5%
Região: Vinhos Verdes
Preço: 7,50€    

Notas citrinas pouco expressivas. Potente, complexo e amplo com sensações de frutos brancos e um final longo expressivo e sempre fresco. Capacidade gastronómica e de evolução.

Monólogo Avesso P67

Pontuação: 86
Castas: Avesso
Graduação: 13,5%
Região: Vinhos Verdes
Preço: 7,50€

Fruta madura no aroma, paladar rico, suave e complexo. Final macio e sucroso a com notas adocicadas a sobreporem-se à frescura. Falta tensão.

Monólogo Chardonnay P706

Pontuação: 84
Castas: Chardonnay
Graduação: 13,5%
Região: Regional Minho
Preço: 7,50€

Fresco e volumoso na boca. Sabores tropicais e de ervas maceradas, complexo e com final o prolongado onde ganha evidencia a fruta madura.

Singular

Pontuação: 90
Castas: Vinhas velhas
Graduação: 13,5%
Região: Vinhos Verdes
Preço: 8,50€

Selecção do lote do enólogo Fernando Moura. Aroma contido, palato rico e complexo, equilíbrio e envolvência. Tensão e garra com final seco e prolongado. Belo vinho.

--%>