Um artigo publicado no passado dia 22 de Janeiro no Wall Street Journal intitulado The Puzzle of Portuguese Wine confronta-nos com essa dura realidade. A crítica de vinhos Lettie Teague começa a sua crónica escrevendo que, provavelmente, são poucos os países da União Europeia que os americanos letrados acreditam ficar junto ao Brasil, mas, para muitos, é isso que acontece com Portugal. A autora cita João Oliveira, o presidente de uma importadora de vinhos do Estado de Nova Iorque: "O meu médico disse-me que queria visitar Portugal, mas que não tinha tempo para ir à América do Sul".
Intrigada com o enigma do vinho português, tanto mais, lembra, que Portugal é a pátria do Porto, o vinho fortificado mais famoso do mundo, Lettie Teague foi procurar encontrar respostas para o facto de as uvas, dos produtores conceituados e das regiões vinícolas portuguesas serem tanto um mistério para a maioria dos americanos como a localização do país no mapa. E avança uma possível razão: a comida. Não existem em Portugal, diz, chefes mundialmente famosos como em Espanha e "o bacalhau salgado, a principal atracção culinária do país, não é exactamente um prato para agradar a uma multidão".
E acrescenta: "Como o número crescente de restaurantes italianos, espanhóis e até gregos nos Estados Unidos tem mostrado, a popularidade da culinária de um país precede geralmente a popularidade dos seus vinhos".
Mas há outras causas. O marketing, ou a falta dele, é uma delas. Como lembra Lettie Teague, países com menos pedigree vínico, como a África do Sul e o Chile, "têm eclipsado Portugal em reconhecimento e vendas".
Em parte, sustenta, "porque se promoveram melhor" e também porque dispõem de um maior número de importadores.
Há ainda um problema de imagem. Lettie Teague recorre a Drew Hendricks, director de vinho da empresa Pappas Brothers Steakhouses em Houston e Dallas e apreciador de vinhos portugueses, que avançou esta analogia.
"Quando você diz 'Espanha' a alguém, o nome evoca todo o tipo de imagens. Quando você diz 'Portugal', não evoca nada".
Pode haver algum exagero.
No mínimo, para muita gente, Portugal deve evocar os nomes de Cristiano Ronaldo e Mourinho.
Mas nunca o país recorreu a eles para promover os seus vinhos. E era fácil. Imagine-se um anúncio deste tipo com Cristiano Ronaldo destinado aos Estados Unidos: "Chamo-me Cristiano Ronaldo e sou de Portugal, da ilha da Madeira.
Sabiam que foi com um vinho Madeira que o primeiro presidente americano, George Washington, brindou à celebração da Declaração de Independência dos Estados Unidos da América, em 4 de Julho de 1776?" Mourinho podia ser facilmente associado ao vinho do Porto e aos vinhos de mesa, que tentou promover particularmente durante os anos que passou no Chelsea, através do hábito de beber um copo de vinho com Alex Ferguson, treinador do Manchester United, no final dos jogos entre as duas equipas.
Uma boa campanha de marketing até consegue vender coisas más, mas, como reconhece Lettie Teague, os vinhos portugueses têm ainda a vantagem de ser bons, alguns "verdadeiramente notáveis" e com preços apetecíveis. Isto, diz, "é particularmente verdadeiro para os vinhos de mesa tintos do acidentado vale do Douro", dando como exemplos os vinhos produzidos pelos chamados Douro Boys, grupo que integra a Niepoort e as quintas do Castro, Vallado, Vale Meão e Vale D. Maria. No mesmo artigo, Lettie Teague conta que foi a Newark, onde vive uma grande comunidade de portugueses, com a intenção de encontrar alguns bons vinhos portugueses. O seu guia foi o luso-americano Frank Paredes, funcionário de uma empresa importadora de vinhos em Nova Iorque e cuja família possuía uma loja de vinhos no distrito de Ironbound, em Newark. A jornalista não encontrou em nenhuma loja o mais famoso vinho português, o Barca Velha, que é conhecido nos Estados Unidos como o "Grange de Portugal", numa alusão ao famoso Penfolds Grange, considerado o melhor vinho da Austrália. Os dois vinhos nasceram na década de 50 do século passado e o australiano é vendido a cerca de 300 dólares. O Barca Velha é mais barato.
Durante o almoço, Lettie confessou a Frank Paredes a sua frustração por não ter encontrado o Barca Velha. Mas a resposta do luso-americano decepcionou-a ainda mais: "[o preço do Barca Velha] É exagerado. Nenhum vinho português vale esse dinheiro", disse-lhe ele. "Este era o sentimento que eu não imaginaria num australiano - e certamente num francês - que se referisse ao vinho mais famoso do seu país", confessa a jornalista.
Sem respostas para a dúvida sobre se seria apenas uma questão de baixa auto-estima ou se estaria na presença do mais realista dos portugueses sobre o valor dos vinhos de Portugal no mundo, Lettie Teague faz depois algumas considerações sobre alguns dos vários vinhos portugueses que comprou em Newark e em Nova Iorque a bom preço. E desses diz que pelo menos 10 vinhos a fariam feliz se os bebesse novamente.
A jornalista termina o artigo a realçar o rigor e a atenção com o detalhe que encontrou em todos os rótulos, sugerindo aos produtores nacionais, com ironia, que passem a incluir também um mapa que "ilustre o lugar de Portugal no mundo".