Para Georges, a proposta era "original", principalmente porque, na sua opinião, os vinhos pré-filoxéricos "são difíceis de entender". Não podia ser de outra maneira: um vinho da Noval da vindima de 1855 ou um Ramos Pinto de 1872 têm o dever de esconder algum mistério - quanto mais não seja o de nos convocar para uma era que hoje apenas conseguimos imaginar. E sim, os autores ingleses da primeira metade do século XX, como H. Warner Allen, ajudaram a criar a ideia de que as vinhas que nasceram após a filoxera, que impôs a adopção de porta-enxertos americanos capazes de resistir à praga, produziam vinhos menos encorpados e sem aquele músculo que lhes garantia a quase eternidade. Ainda hoje o mito do Noval Nacional, que provém de vinhas de pé-franco, ajuda a manter viva essa tese.
Além destas interrogações, na prova do DOP havia ainda mais duas perguntas à procura de resposta. A primeira é a de saber se todos os vinhos em prova eram, de facto, provenientes de vinhas pré-filoxericas. Não há dúvidas de que na lista da prova o Noval de 1855 e o Ramos Pinto de 1872 eram de vinhas antigas; é muito provável que o Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro de 1886 e um Dona Antónia Adelaide Ferreira de 1887 (engarrafado após a morte dessa genial figura do Douro, em 1896) também o fossem. Mas é menos provável que o Real Companhia Vinícola da vindima de 1892, o fantástico Old Tawnie da J. Carvalho Macedo de 1893 ou o Grahams de 1895 tivessem a mesma origem.
Depois, uma outra dúvida se impõe em provas de vinhos seculares: a autenticidade das amostras. Ninguém pode determinar com certeza que um vinho tem 95 ou 125 anos. Principalmente quando não se sabe se foram engarrafados dois ou 20 anos depois da vindima - o que condiciona imenso a sua evolução. Alguns dos sintomas de Porto antigos envelhecidos em casco, como alguns reflexos esverdeados numa cor castanha escura ou a famosa impressão de vinagrinho, não se constataram. Mas nada disto obsta ao essencial: em causa estavam sem dúvida vinhos do Porto muito antigos e Georges dos Santos fez questão de rastrear o percurso de cada garrafa. O Ramos Pinto, por exemplo, foi comprado à Universidade de Oxford há seis anos e o J. Carvalho Macedo foi produzido para o célebre restaurante Maxim's de Paris e esteve escondido na primeira e na segunda Guerra Mundial.
Todos os vinhos passaram o teste da prova, com excepção do Ramos Pinto, que apareceu com um aroma estafado, com notas de bolor associadas aos panos molhados e uma prova de boca plana. Num segundo plano de qualidade, ficaram o Ferreira de 1887, que exibia um aroma muito atraente, de chá, couro e uma boca muito elegante, e o Real Companhia Vinícola do Norte de 1872, muito vigoroso na boca, com a fruta seca dos tawnies muito marcada e longa e aromas mentolados bastante atraentes. Depois, por exclusão de partes, houve quatro vinhos de excelência: o Noval, o Companhia das Vinhas, o J. Carvalho Macedo e o Graham's.
No primeiro caso, torna-se difícil de definir o aroma desse Noval. Muito dominado por aromas de farmácia, com alguma predominância de quinino, deixa contudo transparecer sensações de noz e amêndoa no final. É um vinho já com um corpo muito frágil e um aspecto translúcido, mas ainda vivo na boca, onde reproduz no palato boa parte das sensações olfactivas mas agora temperadas por uma deliciosa envolvência de aromas da garrafa. O Companhia da Agricultura de 1887 apresentou um perfil aromático mais clássico e deixou todo o seu poder de surpresa para a boca, onde mostrou uma complexidade e uma longevidade de prova extraordinárias. O J. Carvalho Macedo talvez tenha sido o vinho do Porto mais completo da prova: pela complexidade do seu aroma, com notas vagas de chocolate, algumas sensações químicas e sintomas do envelhecimento muito requintados e intensos, mas também pela elegância, frescura e sofisticação da sua boca. Último mas não o pior, o Graham's de 1895 apresentou um aroma algo escondido, menos óbvio, com nuances de especiaria e farmácia, mas uma prova de boca mais exuberante, com uma acidez fantástica e uma impressionante duração.
Sem que se pudessem esclarecer grandes mistérios (e ainda bem, porque é deles que os grandes vinhos se alimentam), a prova de Georges Dos Santos, reservada a 22 pessoas, a maioria dos quais franceses e suiços que vieram ao Porto de propósito, foi mais uma confirmação de que o vinho do Porto do século XIX ainda está vivo e, geralmente, de boa saúde. Nesse jantar provaram-se grandes vinhos (um Chateau d'Yquem de 1936, entre outros), mas quando em prova estão Portos afeiçoados pelo tempo, é muito difícil haver outro vinho que lhe faça frente.