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À família Lopes Ramos

Por Miguel Esteves Cardoso

Espero que me perdoem a frieza de chorar alguém que nunca conheci. Imagino o sofrimento de quem o conhece e ama, não estando ainda preparada para falar e sentir no pretérito.

Eu gostaria de falar pela multidão que o conheceu só pelo que escreveu e fez. Fomos muito prejudicados pela morte do David Lopes Ramos. Precisamos dele. E continuaremos a precisar dele até chegar alguém que o substitua como guia gastronómico e mestre da boa vida. Que será nunca e ninguém.

O nosso luto é um luto oportunista. A morte do David estragou-nos a vida, materialmente. E idealmente. E até emocionalmente, por ser impossível não acreditar na boa alma que tinha. Coisa que nos foi dita durante toda a vida dele e, comoventemente, agora que morreu, foi apenas repetida. O David tinha uma inteligência aberta, uma honestidade generosa perante o velho e o novo, o urbano e o regional, o estrangeiro e o português.

Há pessoas que fazem mesmo falta. Deixam um buraco por toda a parte. Estávamos a contar com elas. Não podíamos prescindir nem um bocadinho delas, no sentido mais egoísta e viciado, mas também afectuoso e porque não dizê-lo clubístico e filial. Morreu um dos nossos.

O facto de não nos pertencer não nos tira o direito e a birra, zangada e traída de chorar e chamar por ele.

À família Lopes Ramos: desculpem este desabafo. Obrigado por terem feito dele um homem feliz, que partilhou essa felicidade connosco, amigos dele. Sem o conhecermos sequer.

in Público (01-05-201)

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