Talvez porque o objectivo seja apenas receber quem se quer fazer chegar, não existem quaisquer indicações na estrada. Situado na estrada nacional Badajoz-Huelva, e depois de passada uma pequena localidade denominada Almendral, desvia-se para uma pequena ponte que faz de viaduto, conduzindo por um caminho de terra batida entre sobreiros, pasto e olival, e que nos leva, passados oitocentos metros, a um grande portão onde se lê: Monasterio Rocamador — año de 1512.
O ensolarado dia de Dezembro condiz com o sorriso franco que nos recebe à chegada, fazendo com que nos sintamos em casa. Não tarda a que nos encaminhem à antiga cela do fundo do corredor, aquela que ocupa um canto inteiro do piso superior. O chão irregular e os tectos baixos surpreendem, num andamento compassado ainda por uma vivência monástica que se pressente a cada passo, a cada sopro. Ao percorrer o interior do edifício, adivinha-se as passadas meditabundas dos frades, varrendo com as suas indumentárias negras o chão dos corredores, enquanto murmuravam ladainhas.
Os claustros são o coração de todo o edifício, pintados de cor verde viva e brilhando de luzes natalícias, convidam hoje, como antigamente, à pausa e à reflexão. São formados por um rectângulo de seis metros de largura e por quatro de altura, demarcado por dez colunas, donde se apoiam meios arcos que sustentam um piso superior originalmente aberto. Presentemente encontra-se coberto por uma cúpula de vidro, formando um pátio confortável iluminado pela luz natural, onde funciona um restaurante de charme. No centro, dois poços deixam-nos descobrir a majestosa adega, onde centenas de garrafas empoeiradas esperam uma escolha. Os passos claudicantes do funcionário repetem os dos religiosos, séculos atrás. Imagino-lhes o ar ausente e sóbrio velando pelos ofícios sacros,
A capela, adjacente aos claustros, recria uma assombrosa sala de refeições agora deserta. A clausura e o recolhimento que em tempos aqui morou, manteve-se e foi até ampliada pela música sacra quase impercetível e pela luminosidade das velas bojudas que tremeluzem sobre bandejas assentes no chão.
Uma passagem baixa desemboca num corredor distraído, onde uma mesa rústica suporta um par de jarras com vassouras, e outra, um altar decorado com legumes.
No exterior a água que jorra em fontes de tamanhos diferentes, pingando árias sagradas, a piscina vazia, a terra e o barro que dão uma harmonia perfeita, enquadrando o lugar na paisagem.
Os cheiros e perfumes intensos das flores campestres, o aroma das ervas de cheiro, as cores fortes dos amores-perfeitos e das margaridas, o chilrear dos pássaros, a água que jorra em cada fonte ou canteiro, a solo escuro e o barro, moldando o quadro dentro do qual nos achamos. Após os primeiros instantes sente-se uma espécie de delicada leveza; há um não sei quê no ar, que ao que dizem nem San Pedro de Alcântara quando por aqui viveu, conseguiu desvendar e que nos alteia para lá da terra que pisamos. O Rocamador não se encontra apetrechado com um sofisticado spa nem promete tratamentos milagrosos, contudo, o bem-estar espiritual que se sente aquando do fecho do portão que anuncia o fim da estada, não deixa margem para dúvidas de que é o lugar certo para a permanência temporária de almas indisciplinadas.