Fugas - dicas dos leitores

Uma viagem à Colina de Santana

Por Camilo Sequeira

"Lisboa é uma cidade linda. E viajar nela é um prazer. Porque viajar por Lisboa é sempre possível descobrir algo do muito que ela tem… não absolutamente à vista. Vivendo-se, quase dentro de casa, experiências pessoais de imenso prazer.

Quando falamos de viajar habitualmente imaginamos distância. Considerando que é a distância que nos mostrará realidades formativas e informativas que o perto não tem para nos revelar.

É um preconceito. Que, demasiadas vezes, nos impede de perceber o encanto do muito que temos junto a nós.

Lisboa é uma cidade linda. E viajar nela é um prazer. Porque viajar por Lisboa é sempre possível descobrir algo do muito que ela tem… não absolutamente à vista. Vivendo-se, quase dentro de casa, experiências pessoais de imenso prazer.

Numa das suas sete colinas, chamada de Santana, foram construídos ao longo da história vários edifícios religiosos que, após terminarem esta função, vieram a ser as estruturas assistenciais e de investigação que até há pouco se designavam como Hospitais Civis de Lisboa.

Estes hospitais são hoje museus vivos. Porque souberam preservar a memória do que foram mantendo e protegendo os símbolos que os criaram.

A tradição portuguesa de azulejaria tem neles um enorme conjunto de painéis de invulgar qualidade, de épocas diferentes, habitualmente em bom estado de conservação.

Viajar entre eles, observando-os e interpretando-os, é uma satisfação para um curioso e um mundo aberto de investigação para o académico. É também uma oportunidade única de os ver no local para que foram concebidos, de saber por que é que ali foram colocados e, mais, de ver história tal como era contada aos que não tinham acesso às letras. E como é enriquecedor compararmos o antes desse tempo com o agora do nosso.

E as igrejas, todas diferentes na invocação e na grandeza, também recordam a vida de outro tempo, fazendo-nos reflectir sobre a dimensão do religioso no seu componente místico, introspectivo e meditativo, mas também sobre esse mesmo religioso como forma de procurar saber científico.

Serão muitos os que sabem que a “Aula da Esfera” referenciada em toda a história da ciência ainda existe no Hospital de São José?

E quantos terão visto, dentro ou fora do país, uma sacristia maior que muitas igrejas com arcazes de pau ébano, ferragens revestidas a ouro e um chão de mármore colorido e embutido tipo italianizante? Lá está, bem no alto da colina, a olhar o Martim Moniz, o castelo, a Graça e ao lado do que resta de uma torre da muralha fernandina.

Conhecer o que estes espaços, que muitos viajantes sentirão como sagrados, foram sendo ao longo das agitações sociais que Portugal viveu nos muitos séculos que temos de existência é outra forma de se viajar (intelectualmente reflectindo perante elementos objectivos) para se tentar perceber o sentido do viver em cada época e bem assim os factores que, periodicamente, induzem atentados à memória e resistência aos mesmos.

Viajar também é pensar sobre o que temos para ver, construído, escrito, pintado, e sobre como estas memórias persistem, como somos por elas representados, como, enfim, a vida que tantos sentem como hostil e difícil, de facto, tem imensas evidências de beleza, de vontade de partilha com o outro, de dizer “Sou isto para que tu saibas construir o teu caminho com os mesmos valores: partilha que é solidariedade e beleza que é encantamento”.

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