Fugas - dicas dos leitores

Ester, uma aldeia com nome de mulher

Por Manuela Santos (texto e fotos)

Em Castro Daire, ao encontro de um Portugal genuíno que nos convida a voltar.

Ester é uma aldeia com nome de mulher, empoleirada nas arribas do rio Paiva. Que saudades da primeira vez que por lá veraneei! Que dizer de Ester de Baixo? Mais formosa que a sua irmã  gémea, Ester de Cima, encontra-se separada dela pela estrada que liga Castro Daire a Alvarenga (N 225). Na época, a bela Ester de Baixo ainda era uma pedra preciosa em estado bruto.

Fiquei alojada em casa do tio João numa daquelas casas de xisto que salpicavam a encosta até ao rio Paiva e que combinava em simplicidade com o lugar e as suas gentes. Logo pela manhã era ouvir o canto dos pássaros, ver a sua dança ritmada entre uma e outra árvore, numa sintonia perfeita com a cadência musical das águas correntes do rio. Parecia que o fandango do meu Ribatejo se tinha transportado para aquele lugar encravado entre as serras de Montemuro e Arada.

Descer ao rio era uma perfeita aventura. Terreno demasiado íngreme, sem caminho construído senão o pisado pelos pés de quem ali passava diariamente, anos consecutivos, ladeira abaixo, ladeira acima, labutando para sobreviver. No seu passo lento, demasiado lento para os olhos de quem vive na grande cidade, lá vinha a tia Maria com um feixe de lenha à cabeça - Bom dia! - Booom diiia, respondia ela.

A descida fazia-se sempre a travar e os joelhos iam reclamando, mas era recompensada pela beleza do lugar, pela travessia de milheirais românticos e acolhedores de amores furtivos, pelas vidas sem pressa, pela ausência de ruído, cortado apenas pelo "fandango ribatejano". Por fim chegar ao rio. Aí era a cereja em cima do bolo! Velhos moinhos de água encantados pelo tempo que os quis poupar sem os arruinar completamente, deixando-lhes possibilidade de recuperação por autarquia amiga do património. Banho no rio não  podia escapar, nem a merenda preparada para a ocasião, a que se seguiam belas amoras silvestres colhidas ali mesmo à  beira do rio Paiva. Hora de regressar! Só era preciso coragem para a subida.

Apaixonada pela zona, regressei vários anos para explorar outras aldeias ali próximas, com suas singularidades e curiosidades patrimoniais. A interessante igreja de Ermida,  datada do século XII, de arquitectura românica,  tal como a própria  estatuária  entretanto lamentavelmente pilhada, continua a  merecer uma visita. O moinho recuperado e os vestígios de ponte medieval em Cabaços alegram o rio que ali vai mais calmo e permite molhar os pés  sobrecarregados pelas caminhadas. Ester foi crescendo, apareceram as casas de emigrante retornado, mas também se recuperaram casas antigas em xisto.

A paisagem cortada pelo rio Paiva continua bela e fazer este pequeno percurso na N225 é  ir ao encontro de um Portugal genuíno que nos convida a voltar.

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